domingo, 19 de junho de 2011

158. O Significado

Os mestres da Ciência Física nos ensinam que no Universo somente existem partículas em movimento, partículas-ondas, que se atraem e se repelem. Essa atração e essa repulsão são efeitos resultantes da ação de forças inerentes às partículas-ondas. As partículas-ondas são, pois, energizadas. Há duas formas fundamentais de energia: a eletromagnética (que engloba as energias nucleares fraca e forte) e a gravidade.
A ação da força não provoca o movimento, isto é, o deslocamento de uma coisa de um lugar para outro. Ela apenas acelera o movimento, isto é, muda a velocidade ou a direção do movimento. O movimento é a relação dos deslocamentos de duas coisas. Se as duas coisas se deslocam à mesma velocidade, elas estão paradas com relação uma à outra. Eu estou à velocidade zero, com relação à Terra, isto é, estou parado, enquanto estou, juntamente com a Terra, a altíssima velocidade com relação ao Sol. Aliás, tanto a Terra se movimenta com relação ao Sol, como o Sol se movimenta com relação à Terra. O movimento é relativo, é o deslocamento de uma coisa com relação a outra coisa.
A Ciência é sistêmica, isto é, é uma unidade coerente. As diversas ciências não podem contradizer-se. Assim, compreendemos que a Neurociência hoje afirme que no Universo não exista luz, nem cores, nem som. O Universo é escuro e silencioso, é cego e mudo. É que a luz e a cor, na realidade física, nada mais são que energia eletromagnética, assim como o som nada mais é que a vibração das partículas aéreas.
O meu corpo nada mais é, em última análise, que imensa multidão de partículas-ondas energizadas que se deslocam à mesma velocidade. Assim, isso é o corpo do leitor, a caneta com que escrevo, o copo que uso para beber, as árvores, os animais, os planetas, as estrelas e as galáxias, todas as coisas.
O espaço não existe no Universo senão como universo, isto é, como o conjunto de partículas-ondas energizadas. O espaço não é um continente das coisas. O espaço é o conjunto de coisas cuja relação de proximidade, distância e orientação o meu aparelho de comunicação, a Mente, constrói, organizando o universo das coisas, uma em relação às outras. Nas longínquas paragens interplanetárias e intergalácticas, nada existe. Nem o espaço existe. É o vácuo. É o Nada. Sei que a Física Quântica afirma que não existe o vácuo absoluto: existem locais com raridade de partículas-ondas.
O espaço é a relação entre os lugares das coisas, lugares e relações que podem mudar e mudam constantemente, já que as coisas podem estar, ou não, se movimentando reciprocamente em velocidades diferentes. As coisas podem estar se aproximando ou se afastando, ora se aproximando ou ora se afastando, ou podem permanecer à mesma distância. O Universo é o imenso torvelinho do movimentar-se de partículas-ondas energizadas, produzido ao acaso de forças da atração e repulsão. É o transformar-se. É mero processo, o tornar-se, o fieri. Nada é. Tudo muda. Tudo é processo. O espaço é relativo.
O espaço é uma construção da Mente, esse instrumento de comunicação do indivíduo humano com o Universo e, sobretudo, com as outras pessoas. Esse aparelho de comunicação humano consta do sistema nervoso, anatômica (hardware) e fisiologicamente (software) considerado, acrescido de todas as diversas funções de ordens cognitivas e emocionais. Não há como conhecer as coisas, na pureza absoluta de sua realidade. As coisas não se colam em nossa Mente. Tudo que conhecemos passa por esse instrumento de conhecimento. Conhecemos tão somente as coisas que a Mente tem condições de captar, as coisas que se adaptam ao nosso aparelho de comunicação e na forma como ele é capaz de captar. Conhecemos apenas a imagem que nossa Mente forma da realidade física existente.
A Verdade, adequação da imagem mental com a realidade física pura, essa Verdade absoluta, não existe, porque nos é impossível ter, de um lado, a imagem mental, e, do outro, a realidade física pura, para, em seguida, compará-las. De um lado e de outro, só conseguiremos a imagem da realidade física formada pela Mente. Até a verdade científica é a confirmação experimental dessa subjetividade da Verdade, já que ela nada mais que a imagem que a Mente dela faz, a mais conveniente para orientar nossa conduta futura. A Cosmologia ensina que 95% do Universo é constituído de energia negra e matéria negra, que não sabemos o que é. Só 5% do Universo é captado e estudado atualmente por esse instrumento de comunicação humano, a Mente, cujo poder de captação é ampliado com diversos outros instrumentos construídos pelo Homem, como o telescópio e o microscópio.
Assim também é o tempo. Ele não existe. Na realidade ele é apenas a relação entre um antes e um depois, um estado anterior e um estado posterior, um lugar ocupado anteriormente e outro ocupado posteriormente. Ele é a relação de continuidade desse deslocamento de um lugar anteriormente ocupado para um lugar posteriormente ocupado. Por sinal, aquela ocupação anterior do lugar só existe na minha memória. Essa relação, portanto, é nitidamente uma construção da Mente. Uma construção que pode até ser medida, através do relógio. Uma convenção em que a distância entre dois pontos é dividida em partes convencionalmente iguais (segundos, ou minutos, ou horas), cada parte constituindo uma unidade de tempo. Ali no relógio não existe tempo. Ali existe projeção mental de espaço (criação da Mente como já vimos) e deslocamento do ponteiro em unidades de espaço, isto é, movimento do ponteiro, convencionalmente (mentalmente) medido. Outra vez, o relógio não é o tempo. O relógio é coisa em movimento, com medição de distância percorrida através de intervalos iguais. O tempo é relativo.
Luz, cor, som, espaço e tempo são produtos da Mente. Nada que é externo ingressa na Mente, senão a energia: energia eletromagnética através dos olhos, energia química através do paladar e do olfato, energia cinética através do ouvido, energia mecânica e bioquímica através do sentido somestésico. Esses diversos tipos de energia são transformados pela Mente em um só tipo de energia, a energia neural (eletromagnética e bioquímica), digamos assim. Essa energia é gerada com a transformação da energia externa recebida pela Mente em energia analógica, que é convertida em energia digital. Essa energia digital é manipulada por um conjunto de neurônios e sinapses que produzem os fenômenos mentais. Para que se tenha ideia da infinita variedade de fenômenos produzidos pela Mente basta saber que o cérebro tem cem bilhões de neurônios e a média de conexões de um neurônio monta a dez mil. Afirma-se que nos intestinos existem outros cem bilhões de neurônios.
A energia externa sensibiliza os receptores sensoriais, a porta de entrada para a Mente, e percorre um dos infinitos caminhos que lhe é possível percorrer na Mente. Cada neurônio dá o seu significado à corrente eletromagnética neural e cada circuito de neurônios percorridos forma, digamos assim, um discurso ou um texto de significados. Há o circuito da luz, da cor, do movimento, da palavra, das percepções, do entendimento da palavra, da música, das formas, do rosto, da música, das emoções, do amor, do ódio, do medo, da coragem, das fantasias, da religiosidade, da memória, das ideias, dos juízos, do raciocínio, da ética, do egoísmo, da solidariedade, de tudo o que se possa imaginar, até o circuito do autossegredo. Há finalmente o circuito da liberdade, aquele da autonomia individual, aquele que confere ao indivíduo humano a sua dignidade de pessoa humana.
Os indivíduos humanos não nascem com um aparelho mental absolutamente idêntico. As Mentes são apenas parecidas, umas muito parecidas, outras até pouco parecidas. Há até indivíduos humanos que nascem anencéfalos. Não se nasce também com ele já apto para funcionar em toda a sua plenitude. Como todas as coisas, ele também é um processo. Ele tem início, desenvolve-se, chega a sua plenitude e entra em decadência. Seja como for, esse aparelho de complexidade orgânica possui a característica da plasticidade. Isso significa que ele também segue as etapas de seu processo sob a influência do meio ambiente.
Uma Mente normal é capaz de aprender qualquer coisa, com maior ou menor perfeição, com maior ou menor facilidade. Ela fará melhor uma coisa quanto mais nela se exercitar. Mas ela terá mais facilidade no exercício daquilo para o qual ela for mais adaptada. O ser humano constroi a sua essência e contribui para a construção de todo o acervo cultural da Humanidade, entre outras coisas, a própria Sociedade. Da mesma forma, a Sociedade é o grande artífice do indivíduo humano, utilizando a forma da Cultura acumulada para moldá-lo.
Esse aparelho maravilhoso de comunicação, a Mente, é que constrói o Universo da nossa vida, esse com que convivemos. Um conglomerado de partículas toca no meu, e eu sinto o prazer do contato com uma pele macia, ou a dor de uma bala no peito. Lá fora só existe o contato de conglomerado de partículas-ondas em movimento. O prazer e a dor são produtos da Mente, só existe em minha Mente. São meras sensações. O que o leitor está lendo é, no Universo físico, mera tinta sobre um papel, isto é, mero conglomerado de partículas-ondas em movimento com igual velocidade. Na minha Mente, é um universo de ideias que governam a minha vida! Um conglomerado de partículas movimenta-se atrás de outro. Minha Mente capta um leão correndo atrás de um homem. Percebo a cena, entendo o perigo e o sofrimento humano. Minha Mente constrói toda uma cena de luz, de cor, de animal, de pessoa, de perigo, de infortúnio, de morte, de sofrimento humano. Outro seria o significado no cenário de um estádio de atletismo, outras ideias, outros sentimentos, outras emoções, outro comportamento.
O Mundo criado pela Mente é que é o Mundo que conta, diria Hegel, sob a influência de Kant e no rastro de George Berkeley. Seria o Mundo da Razão Prática, aquele que conta para Kant. Nós estamos criando, a cada instante, um novo Mundo, uma nova Sociedade, um novo Brasil. Alguém já disse: se a Humanidade desaparecesse não faria falta alguma ao Universo. Pode-se retorquir: se a Humanidade não existisse, não existiria Universo, e, se a Humanidade desaparecesse, também desapareceria o Universo. O que conta é o Mundo que nós queremos construir. E parece que o Mundo inteiro anseia por construir algo novo, algo bem melhor do que o Mundo em que hoje vivemos.

2 comentários:

  1. Texto muito bem elaborado, de elevado teor metafísico, transcendental e principalmente filosófico. Como é bom ler alguém com grande capacidade de raciocínio. Parabéns, Edear!

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    1. Mestre meu e Professor Ari
      Que bom dialogar com o amigo sobre esse tema, o mais belo tema que é o significado da existência humana! Esse é o tema que me fascina e que comanda a minha vida! Agradeço sua presença e sua manifestação. E tudo isso vale como diálogo, como convivência, como vida!
      Edgardo

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