terça-feira, 24 de julho de 2018

416. O Mirabolante Contorcionismo Lógico da Justiça



Em 05/09/12, portanto ao quase completar-se 4 (quatro) anos de existência da Resolução CGPC 26, a 2ª Turma do TRT de Brasília emitiu curioso Acórdão sobre a Reversão de Valores ao Patrocinador.

Pretendo analisar esse Acórdão para demonstrar os inimagináveis meandros lógicos que se criam e se percorrem de forma presumidamente sábia para se decidir sobre matéria cujo exato conhecimento nada mais exige que mera leitura atenta do texto, de tão singela e inteligível que é a sua redação.    Utilizarei o mesmo método socrático de consulta ao dáimon que habita a mente de cada um de nós, a evidência, que grita a verdade para quem raciocina corretamente, de tal forma que o leitor percebe que a lei manda tal coisa e não pode não a mandar ou proíbe tal coisa e não pode não a proibir.


O Tribunal
Examinadas matérias preliminares, que não interessam ao assunto de nossa exposição, o Tribunal entra na análise da ilegalidade da Reversão de Valores, focando no argumento de que a Reversão de Valores seria consequência da observância do §3º do artigo 202 da Constituição Federal que instituiu o regime da Providência Complementar:
Como a Constituição (artigo 202, § 3º) exige das entidades estatais paridade do aporte contributivo, eventual retorno por superávit deve igualmente encontrar, entre seus contribuintes, a mesma paridade descrita pela Constituição, sob pena de instituir-se anomalia não admitida pela norma constitucional e indireta afronta ao que nela preceituado, ao instante em que se poderia admitir, por exemplo, a quebra da paridade exigida constitucionalmente pela constante restituição de valores sem tal observância, gerando, no final dessa soma, uma distorção contributiva em prol dos entes estatais, que acabariam indevidamente mais onerados, o que foi expressamente vedado pela Constituição Federal, de modo que a eventual divisão do excesso seja igualitária, mesmo que o modo de reversão de valores para um ou para outro sejam feitos de modo diferenciado, segundo o que restar indicado pela lei complementar prevista pela própria Constituição Federal, já que nesta se estabeleceu apenas a premissa indelével a ser descrita pela norma infraconstitucional.”

Minhas Considerações
O Tribunal explica que esse §3ºdo artigo 202 da Constituição Federal exige que, em plano de benefício, ligado ao Estado, o aporte do Patrocinador estatal não pode nunca superar o do Participante! É isso ou não é isso que aí está escrito? Isso grita ou não grita na sua cabeça, quando lê esse trecho da ementa judicial?
Pois bem, o que isso tem a ver com o pleito do sindicato dos bancários do Estado do Espírito Santo e outros, os autores da ação judicial? Nada, absolutamente nada.

Os autores da ação arguíram que a o artigo 19 da LC 109/01só permite que se gaste reserva previdenciária em pagamento de benefício previdenciário (aposentadoria e pensão); ora reversão de valor não é benefício previdenciário; logo, reversão de valor é proibida pela lei.

O pleito dos autores trata de gastos da reserva previdenciária, enquanto o Tribunal, à primeira vista, tenta encontrar a justificativa para a Reversão de Valores, na constituição da reserva, isto é, na paridade do aporte do Patrocinador com o do Participante, o §3° do artigo 202 da CF. Isto grita ou não grita na sua cabeça, caro leitor?

Este é o local exato onde encontrar a norma sobre os gastos da reserva previdenciária? Não, absolutamente não. Por que? Porque aporte é um sinônimo esquisito e despistador que os autores da Emenda Constitucional nº 20 encontraram para contribuição (o termo jurídico e previdenciário usual), exatamente o oposto financeiro de gasto. Isso grita ou não grita na sua cabeça? Assim, em vez de procurar a solução de matéria de gastos de reserva onde a Lei trata de gastos de reserva, o Tribunal procura a solução justamente no local onde a Lei trata do oposto, a contribuição, a constituição da reserva? Pode haver atitude mais claramente ilógica? Pode haver contorcionismo lógico mais mirabolante? Isso grita ou não grita na sua cabeça?

Onde o Tribunal deve encontrar a solução para a questão arguída pelo sindicato, gastos de reservas previdenciárias? No local onde a Lei trata dos gastos das reservas, jamais onde ela trata da constituição das reservas! Isso grita ou não grita na sua cabeça, caro leitor?!

(continua)