quinta-feira, 17 de julho de 2014

296. O Representante da ABRAPP

Neste texto estou refletindo sobre a justificativa da legalidade do instituto da Reversão de Valores, registrada nas anotações taquigráficas publicadas pelo Senado, apresentada pela ABRAPP-Associação Brasileira das Entidades Fechadas da Previdência Complementar, na Audiência Pública do Senado, do dia 2 do corrente mês, através de seu Diretor Executivo, Dr. Luís Ricardo Marcondes Martins.

Adotarei, nestas reflexões, aquela sistemática de análise, já tantas vezes utilizadas neste blog, de apresentar, passo a passo, a argumentação do defensor da legalidade do instituto de Reversão de Valores juntamente com minha refutação.

Regozijo-me com essa oportunidade, já que o Dr. Marcondes Martins é advogado de conceituadíssima banca da cidade de São Paulo, detentor de vasto e notável elenco de títulos acadêmicos e profissionais, especializado em Direito Previdenciário, proeminente membro da OAB de São Paulo, e, portanto, respeitável jurista. Certamente que Dr. Marcondes Martins argumentou nessa Audiência Pública no Senado de modo a não deixar qualquer dúvida sobre a legalidade do instituto da Reversão de Valores. Investiguemos.

ABRAPP
Esse sistema (Sistema da Previdência Complementar) teve sua criação pela Lei Ordinária 6.435, de 1977, e passou por um grande processo de modernização, de aperfeiçoamento. Foi constitucionalizado através da edição da Emenda Constitucional nº 20, de 1998. Está no art. 202 da Constituição, do lado social. E isso, por si só, mostra a importância do debate aqui travado. O art. 202 traça as premissas constitucionais desse regime. Já foi dito aqui: facultativa, contratual, autônoma, baseada – do regime de capitalização – na constituição de reserva, que vai garantir o quê? O benefício contratado. Disciplinado por duas leis complementares, a 108, todo mundo conhece, a 109 também, que rege o regime como um todo.”

Minha apreciação.
De acordo. Estou na expectativa de que o eminente jurista justifique a legalidade do instituto da Reversão de Valores, demonstrando sua conformidade com a Constituição Federal, as duas Leis Complementares citadas e até com a Lei 6435/77.

ABRAPP
“E foi criada uma estrutura regulatória moderna, que hoje é modelo em termos inclusive internacionais. O Brasil é destaque, inclusive hoje ocupa a oitava posição no ranking mundial em termos de reservas, e é visto por países lá fora como modelo de previdência complementar. O modelo de previdência complementar tem como órgão uma autarquia especial, aqui representada pelo ilustre Dr. José Roberto, a Previc, que vem atuando brilhantemente na condução da fiscalização e supervisão do sistema. Foi criado também um órgão regulador, a lei diz. Esse órgão regulador, que vai regular o sistema, o nome por si só diz, é o Conselho Nacional de Previdência Complementar. Foi criada também uma Secretaria de Políticas de Previdência Complementar ligada ao Ministério da Previdência Social, que mostra a importância de se fomentar esse sistema. Foi criada também uma câmara recursal para as questões disciplinares. Arcabouço legal traçado, moderno e tudo na evolução desse sistema.”

Minha apreciação
De acordo. É clara a intenção da ABRAPP, a saber, estrutura regulatória tão perfeita só produzirá obras perfeitas, resoluções perfeitas, legais. Veremos.

Permito-me apenas ressaltar que o CNPC é composto por SEIS membros do Governo, um representante das EFPC, um representante de Patrocinadores e Instituidores de Planos de Benefícios das EFPC e apenas um representante dos Participantes e Assistidos dos Planos de Benefícios das EFPC. Parece-me, pois, um conselho organizado com poder desproporcional do lado governamental (6 votos) sobre o lado privado (3 votos). E mais ainda com ínfimo poder de decisão dos Participantes e Assistidos (apenas 1 voto), isto é, estes estão inferiorizados para o grupo formado pelas EFPC com os Patrocinadores e Instituidores (2 votos) e, muito mais, se juntarmos este ao grupo governamental (6 votos), que somam 8 votos! Essa desproporção precisamente ensejou a aprovação da Resolução CGPC 26/08 por unanimidade, tendo em vista que o representante dos Participantes e Assistidos, inconformado com o que estava para ser decidido, se retirou da reunião do Conselho naquele final de setembro do ano de 2008.

ABRAPP
“A estrutura do regime de capitalização, o que ela busca? Ela busca um equilíbrio dos planos de previdência. Ela busca um equilíbrio para quê? Para pagar aquele benefício contratado. É um contrato de longo prazo, que precisa ser analisado anualmente através de avaliações de hipóteses atuariais, para se avaliar se ele está ou não equilibrado. Então, o equilíbrio é a regra geral. Isto que todo mundo busca: pagar o benefício que está previsto no contrato previdenciário. Quem são as partes? Participantes, patrocinadoras. Sentaram, elaboraram um contrato previdenciário gerido pelas entidades de previdência complementar naquelas condições regulamentares previstas. (...) funções regulamentares previstas.”

Minha apreciação
Não concordo com o final desse trecho.

O contrato previdenciário patrocinado não tem como contratante vendedor o Patrocinador. A EFPC é que é o contratante vendedor, porque somente uma EPC pode ser vendedor legal do serviço previdenciário (artigo 2º da LC 109/01). Logo, as partes contratantes do Contrato Previdenciário Patrocinado são EFPC e Participantes. O Patrocinador assina um Contrato de Adesão (Contrato de Patrocínio, contrato de garantia) ao Contrato Previdenciário (Regimento Básico, Plano de Benefícios) com a EFPC (artigo 13 da LC 109/01). E o Participante assina com a mesma EFPC o Contrato Previdenciário (Contrato de Participação, outro Contrato de Adesão, consoante o artigo 8º da LC 109/01). Ambos, portanto, se relacionam jurídica e diretamente com a EFPC e, indiretamente através da EFPC, simplesmente porque sujeito de direito às Contribuições de ambos, em razão de duas relações jurídicas diferentes, oriundas de dois contratos de adesão diferentes. Fique bem claro: Patrocinador e Participantes não se relacionam diretamente, relacionam-se diretamente com a EFPC. Relacionam-se, por isso, indiretamente, e esse relacionamento indireto é em razão de um objeto jurídico e econômico COMUM apenas, que é a CONTRIBUIÇÃO.

Mais. O Contrato Previdenciário Patrocinado NÃO é resultado de uma negociação de cláusulas entre Patrocinador (Empregador) e Participantes (Empregados). O Empregador, ainda no seu papel social e jurídico de Empregador, é que negocia as cláusulas do Contrato Previdenciário (Plano de Benefícios, Regimento Básico) com a EFPC. Mais, essa EFPC pode até existir como simples documento aprovado pela PREVIC e registrado em Cartório, isto é, pode ter sido totalmente formalizado pelo Empregador e aprovado pela PREVIC. Depois de aprovado pela PREVIC, é verdade, nem o próprio Empregador pode mais modificar o Contrato Previdenciário.

Assim, esse CONTRATO PREVIDENCIÁRIO, ofertado pela EFPC, ou é aceito ou não é aceito na sua totalidade, tanto pelo Empregador como pelo Empregado, e eles se tornam, por adesão, Patrocinador e Participante, respectivamente, ou nada feito.

Mais. Esse contrato é formalizado sob a égide do REGIME da Previdência Complementar, isto é, ele deve CONTER TODAS AS NORMAS DE FAZER E DE NÃO FAZER CONTIDAS NA CONSTITUTIÇÃO FEDERAL E NA LC 109/01, e também na LC 108/01, se a EFPC for ligada a entidade estatal.

Como se vê, não posso concordar com essa premissa em que a ABRAPP parece querer insinuar que o Contrato Previdenciário Patrocinado é um contrato PURO, cujas cláusulas são ajustadas por consenso amplo entre Patrocinador e Participante. Ele está muito longe disso, todos os autores de Curso de Direito Previdenciário o dizem, isso é UNÂNIME.

A ABRAPP manifestou-se na Audiência através de eminente Jurista que também é eminente Advogado. Os papeis de ambos os profissionais, embora próximos, são bem diferentes. O Jurista prima pela fidelidade à norma jurídica sistemática. O Advogado lida com a norma jurídica de modo que o interesse de seu cliente fique por ela protegida da forma que lhe seja mais favorável. Isto é, o interesse do cliente tem influência na interpretação do Advogado, enquanto ao Jurista só interessa o exato conhecimento do preceito legal. Fica-me a impressão que a ABRAPP se manifestou na Audiência Pública do Senado através do brilhante Advogado... E isso começou a manifestar-se nessa alegada premissa que não se pode aceitar à luz da Hermenêutica Jurídica, como acho que acabei de demonstrar.

ABRAPP
“Dentro dessa regra do equilíbrio, temos exceções – como em tudo, é uma regra: exceções déficit, exceções superávit. Se houver insuficiência de reservas, temos o déficit; se houver suporte, excesso, temos o superávit. Senhores, quando tratamos de exceções, há necessidade de haver uma previsão legal. E lá está. Está prevista no art. 20 da Lei Complementar nº 109 como será tratada a hipótese da exceção do superávit; está tratada no art. 21 a hipótese da exceção do déficit.”

Minha apreciação
Aqui a ABRAPP dá início à sua argumentação justificando a legalidade do instituto da Reversão de Valores. E mais uma vez é a ABRAPP advogado que se expressa, ao invés da ABRAPP Jurista. Exceções déficit? Exceções superávit?

Como bom jurista e para uma boa Hermenêutica Jurídica, a ABRAPP deveria ter delimitado com precisão o objeto da discussão: Plano de Benefícios Previdenciários Definidos Patrocinado. E também explicado déficit de RESERVAS previdenciárias e excesso de RESERVAS previdenciárias, isto é, reservas de valor inferior ao valor dos benefícios contratados ou reservas de valor superior ao valor dos benefícios contratados. Acho, portanto, mais uma falha na argumentação, talvez porque interesse à ABRAPP Advogado e, portanto, não está argumentando a ABRAPP Jurista interessada na fiel interpretação da Lei, nem adotando a perfeita metodologia hermenêutica, isto é, a confrontação do fato econômico previdenciário com os exatos termos da lei (a primeira das normas de uma correta Hermenêutica Jurídica).

Mais. A ABRAPP Advogado pode fazer-se de desentendida e afirmar que a questão se cifra na interpretação do artigo 20. A ABRAPP Jurista, todavia, sabe muito bem que a questão é bem outra. A questão é esta:

A LC 109/01 É CLARA OU É CONFUSA NO TOCANTE AO USO (AO DESTINO) DAS RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS, É OU NÃO É OMISSA NESSA QUESTÃO?

Então, caro leitor, a ABRAPP Advogado não quer ler muitos artigos da LC 109/01, entre os quais o artigo 19, aquele precisamente que PRESCREVE EM QUE SE GASTAM E NO QUE NÃO SE GASTAM AS RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS! Esse artigo 19 para os defensores do instituto da Reversão de Valores NÃO EXISTE NA LC l09/01 (péssima hermenêutica jurídica, portanto; hermenêutica de advogado, não hermenêutica de Jurista).

Leiamos mais uma vez o artigo 19 da LC 109/01, aquele que diz em que se gastam e no que se não gastam as RESERVAS DOS PLANOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. Ela é tão clara, tão evidente, tão precisa que até parece que o legislador anteviu toda essa falácia criada pelos inventores do instituto da Reversão de Valores:

“Todas as CONTRIBUIÇÕES separadas como RESERVAS (matemáticas, de contingência, ou Especial) são SEPARADAS PARA SEREM GASTAS SOMENTE NO PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS.”

Os termos do artigo 19 não admitem outra leitura. O artigo 19 é claro, é completo, é sem lacuna, é taxativo, é incontroverso, é contundente. Isto é, não existe lugar para interpretação alguma. É HERMENEUTICAMENTE INADMISSÍVEL APELAR-SE PARA PRINCÍPIOS: “Os princípios também não são fontes formais... Em face da lei dispositiva e expressa nada significam;...”, ensina Wladimir Novaes Martinez.
 
O artigo 20 é CONSEQUÊNCIA desse artigo 19 e trata de outro assunto, a saber, O QUE SE DEVE ENTENDER POR PLANO DE BENEFÍCIO DESEQUILIBRADO E, portanto, QUANDO E COMO SE DEVE EQUILIBRÁ-LO.
Assim, ele considera TRÊS TIPOS DE RESERVAS: reservas matemáticas (contribuições separadas como reservas até o valor igual ao valor dos benefícios previdenciários contratados), reserva de contingência (excesso de contribuições separadas como reservas sobre o montante das reservas matemáticas até o valor de 25% destas reservas matemáticas). É claro que o Plano de Benefícios nessa situação está financeira e atuarialmente desequilibrado. Mas, o artigo 20 não quer que se tome qualquer medida equilibradora - porque sabe que o valor monetário é instável -, enquanto essas não ultrapassarem o valor correspondente a 125% (reservas matemáticas + reserva de contingência) do valor dos benefícios contratados. O que ultrapassar esse montante, o artigo 20 considera Reserva Especial, isto é, reserva que deve ser gasta, obedecidas determinadas normas, a fim de que seja restabelecido o equilíbrio do Plano de Benefícios Definidos Patrocinado. Gasta em quê? Somente no pagamento de benefícios previdenciários, em razão do artigo 19, é evidentíssimo.

ABRAPP
“Quando você trata do art. 20, estamos discutindo aqui uma questão técnica de interpretação jurídica, essencialmente é isto: se o Conselho Nacional de Previdência Complementar, o CGPC, tem competência para regular o sistema. Tem. A lei estabeleceu. A lei estabeleceu uma composição no Conselho Nacional de Previdência Complementar amplamente democrática, com representantes do Governo, com representantes da sociedade, com técnicos que debatem, que discutem, que, com suporte em pareceres técnicos, vão à exaustão em diálogos, para que as resoluções sejam editadas. Isso ocorreu com relação ao art. 20.

Quando a ilustre Drª Isa diz que extrapolou a disposição da resolução, eu volto a dizer que essa é uma questão técnica. Quer nos parecer que, quando você fala na revisão estabelecida no art. 20 ao estabelecer o superávit, quando fala na revisão da diminuição das contribuições, ela não foi taxativa; ela foi exemplificativa. Ela deixou ao órgão regulador do sistema, legalmente intitulado para tanto, o estabelecimento do disciplinamento dessas exceções do contrato previdenciário.”

Minha apreciação
Novamente sentimos que é a ABRAPP Advogado que se expressa. Ninguém põe em dúvida a autoridade do CNPC para regular o Regime da Previdência Complementar e de regular o conteúdo do artigo 20 da LC 109/01. Nós afirmamos, e disso a ABRAPP Jurista NAÕ DIVERGE, é que ela NÃO TEM PODER PARA LEGISLAR, PARA INOVAR INTRODUZINDO NA REGULAMENTAÇÃO DA LEI O QUE A LEI NO ARTIGO 19 PROÍBE FAZER, a saber, PAGAR BENEFÍCIOS NÃO PREVIDENCIÁRIOS A PESSOAS ÀS QUAIS A LEI PROÍBE PAGAR (o PATROCINADOR). Essa proibição, já mostramos aí acima, está claramente contida no artigo 19 e salta à mente pela simples leitura de seu texto.

A ABRAPP Advogado, porém, está aí alegando que o artigo 20, quando cita a redução das Contribuições e o aumento do valor dos Benefícios Previdenciários, como forma de equilibrar Plano de Benefícios Previdenciários desequilibrado por excesso de reservas, está apenas fornecendo uma lista exemplificativa, não taxativa, de formas de reequilibrar plano desequilibrado por excesso de reservas. Logo, o CNPC pode acrescentar outras formas.

Esse, portanto, é o VERDADEIRO ARGUMENTO que a ABRAPP Advogado apresenta para sustentar a legalidade do instituto da reversão de valores:

“O artigo 20 da LC 109/01 é um elenco exemplificativo, não taxativo, de como se deve equilibrar Plano de Benefícios Previdenciários Definidos, desequilibrado por excesso de reservas.”

A ABRAPP Jurista, porém, sabe que, em hermenêutica válida, ao invés de invocar princípio tão raquítico, a ABRAPP Advogado deveria ter era tentado entender o texto da LC 109/01, principalmente os textos do artigo 19 (que omitiu) e do próprio artigo 20 (que não entendeu, como demonstraremos). A ABRAPP Jurista sabe que esse elenco é taxativo, porque ela conhece muito bem o fenômeno econômico que se acha subjacente a esse negócio jurídico que é o excesso de reservas.

A Reserva do Plano de Benefícios, com efeito, é uma conta de ativo, a maior conta de ativo de um Plano de Benefícios. Como todo valor econômico, ela se alimenta (aumenta de valor) com a valorização no mercado de dinheiro, com a renda proveniente da aplicação no mercado de dinheiro e, em parte muito menor, com as contribuições do Patrocinador e do Participante. E ela SE GASTA (o valor diminui) APENAS DE DUAS MANEIRAS, a saber, com a desvalorização no mercado de dinheiro e com o PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. Por quê? Porque a desvalorização pelo mercado é imposta democraticamente por toda a comunidade de negócios, independente da vontade (das decisões) da EFPC e de qualquer indivíduo. Já O GASTO DAS RESERVAS MATEMÁTICAS NO PAGAMENTO DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIO CONTRATADOS É A ROTINA COTIDIANA                                                          DA EFPC e, por mandamento do artigo 19, SOMENTE EM BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS ELA PODE SER GASTA.

 

Num mercado de dinheiro em situação equilibrada, o resultado daqueles três ingressos de recursos EMPATAM com o resultado dos dois canais de gastos, de modo que AS RESERVAS SE MANTÊM NO NÍVEL DESEJADO DE EQUILÍBRIO, a saber, das RESERVAS MATÉMÁTIACAS. Já na situação de mercado em alta, o ingresso de recursos pode superar de tal forma a rotineira vazão de reservas matemáticas que pode até ultrapassar o limite da Reserva de Contingência! Qual é a primeira e única medida possível de ESTABILIZAÇÃO DAS CONTAS RESERVAS NO NÍVEL DA RESERVA DE CONTINGÊNCIA? Só existe UMA, a saber, REDUZIR OU ATÉ SUSPENDER O PAGAMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. Por quê? Porque a EFPC não tem domínio sobre a valorização proveniente do mercado de dinheiro e, é claro, não interessa, porque é bom e é isso administração financeira, reduzir a renda proveniente do mercado. Mas, se até suspensas as Contribuições, ainda assim o valor das reservas continua a ultrapassar o nível da RESERVA DE CONTINGÊNCIA?! O que fazer? O artigo 20 o diz: aumente os gastos com pagamentos de benefícios previdenciários, isto é, o valor dos benefícios previdenciários. Por que somente gastos COM BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS? Porque isso, como vimos, é EXATAMENTE O QUE MANDA O ARTIGO 19. Não se podem gastar REVERTENDO AS CONTRIBUIÇÕES? NÃO, porque, como vimos, ISSO ESTÁ PROIBIDO PELO ARTIGO 19. Logo, A ABRAPP Jurista sabe (mas à ABRAPP Advogado interessa desconhecer) que o elenco reduzir contribuições e aumentar o valor dos benefícios previdenciários contratados é um ELENCO TAXATIVO, NÃO É UM ELENCO EXEMPLIFICATIVO.

Resumindo, e explicado noutros termos: a ABRAPP Jurista sabe que a única forma LEGAL de se estabilizar Plano de Benefícios Previdenciários, desequilibrado por excesso de Reservas, é PAGAR BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS, porque REDUZIR ou SUSPENDER O PAGAMENTO DE CONTRIBUIÇÕES APENAS EVITA QUE ESSE PAGAMENTO REDUZA OU ATÉ MESMO NEUTRALIZE O EFEITO ESTABILIZADOR DO PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. (Esse conhecimento não interessa, é claro, à ABRAPP |Advogado).

ABRAPP
“O superávit e o equacionamento do déficit foram discutidos amplamente no Conselho Nacional de Previdência Complementar. Foram vários e vários meses de trabalho, em que se estruturou uma normatização, quer me parecer, de maneira prudente, de maneira conservadora, ditando etapas até se equalizar o déficit ou se distribuir o superávit entre quem? Entre aquelas partes que contribuem para aquele benefício. Quem são? Patrocinadoras e participantes. Se patrocinadoras e participantes têm de suportar o déficit – isso a lei estabelece –, quer me parecer, de maneira isonômica, equilibrada, equânime, que tem de haver também uma possibilidade de reversão desse superávit também aos seus contratantes, patrocinadoras e participantes.”

Minha apreciação
Alegado o pretexto do elenco exemplificativo, a ABRAPP Advogado invoca, em seguida, o Princípio de Isonomia, para justificar o instituto da Reversão de Valores, a saber:

“Se os dois, Patrocinador e Participante, contribuíram para formar as Reservas Previdenciárias, então, os dois, Patrocinador e Participante, têm direito ao valor das Contribuições que forneceram à EFPC para formar o excesso de Reservas. É uma questão de justiça.”

A ABRAPP Jurista sabe que esse argumento não justifica o instituto de Reversão de Valores, porque:

- o artigo 19 da LC 109/01 textualmente o proíbe;

-o artigo 20 elencou as únicas duas formas legais de se promover o reequilíbrio de um Plano de Benefícios desequilibrado por excesso de reservas, a saber, flexibilizando para menos o valor das Contribuições ou aumentando o valor dos benefícios previdenciários;

-contra os termos claros da lei, princípios NADA VALEM;

-Patrocínio é uma contribuição gratuita e definitiva;

-Patrocínio não é investimento financeiro nem capitalístico;

-Patrocinador nada mais é, contratualmente, que garantidor (mediante pagamento de contribuição) da EFPC (o único vendedor autorizado dos serviços previdenciários);

-Patrocinador contratualmente nenhum direito tem com relação à EFPC, somente tem a obrigação de que não permita que se desfalquem as reservas previdenciárias do Plano de Benefícios Previdenciários;

-o Patrocinador nem mesmo contribui com recursos próprios para a EFPC, ele transfere esse ônus para o mercado, embutindo-o nos preços;

-a Reversão de Valores para o Patrocinador, portanto, é enriquecimento ilícito do Patrocinador e é textualmente proibido pela LC 109/01 que exige que a EFPC seja uma entidade SEM FINS LUCRATIVOS.

Tudo isso a ABRAPP Jurista sabe.

ABRAPP
“Agora a questão é como se deu essa resolução, e aí eu voto e registro: quer me parecer que todas as hipóteses foram estudadas, quer me parecer que todos os pareceres foram construídos, que todo diálogo foi feito no âmbito do Conselho Nacional de Previdência Complementar à época, o CGPC, que é o órgão regulador do sistema. E, após esse exaustivo debate, foram disciplinados aspectos de apuração, de destinação de superávit, passando pelos conceitos de reserva de contingência, reserva especial, revisão, equacionamento, conceitos técnicos para se regrar aquela exceção. Ninguém quer trabalhar na exceção. Nós queremos trabalhar num plano equilibrado, mas exceções acontecem e elas foram regradas, quer me parecer – de novo – de maneira muito prudente e técnica. Tanto foi assim que o próprio Judiciário, quando examinou a questão nessas ações que foram aqui apontadas, vem conduzindo entendimento pela legalidade da edição Resolução nº 26. A própria OAB foi chamada a opinar nessa questão da Resolução nº 26, em 2008, e também exauriu um parecer no sentido da legalidade da resolução. Então, o que nós estamos discutindo aqui, de novo, quer me parecer que é uma questão técnica, que foram respeitadas as disposições da Lei nº 109, que foi dentro do limite de competência do órgão regulador do sistema e que, veja, tem de passar inclusive pelo crivo do conselho deliberativo das entidades, ao qual a lei garante, por justiça e com transparência, pelo legislador constituinte que assim ditou – e tem de ser assim, que o participante, que é a parte contratante, tenha o assento no órgão maior da entidade –, que passe pelo crivo desse órgão maior a questão do equacionamento e da reversão dos valores. E não só isso. Outras restrições mais: só se aplica a planos fechados; o plano deve estar quitado; antes da reversão tem de ser feita uma auditoria; essa reversão deve ocorrer de forma parcelada para que se acompanhe a evolução dela; tem se que formar... (...) para que se acompanhe a evolução dela. Tem que se formar reserva de contingência, para, depois, no trâmite da reserva especial, prévia autorização da Previc. Então, me parece que não houve um açodamento na deliberação do Conselho Nacional de Previdência Complementar. Pelo contrário, houve amplo debate, houve suporte técnico, o Judiciário reconheceu isso, a OAB reconheceu isso, e doutrinadores que opinam sobre o tema o reconheceram.
(Soa a campainha.)
Então, data maxima venia, quer me parecer que não houve essa extrapolação, de novo, de técnica jurídica, de interpretação lógica e gramatical da estrutura da hermenêutica do Direito, na edição da Resolução nº 26. Eram essas as rápidas ponderações que eu queria fazer. Queria, mais uma vez, destacar aqui a importância do debate democrático, com técnicos e com os Senadores, nossos ilustres representantes nesta Casa de leis. Isso é importante para o crescimento do País, isso é importante para a Previdência Complementar. Como eu disse, acho que a Previdência Complementar é a grande meta de solução para permitir uma dignidade humana no período da inatividade para todos nós, inclusive eu, como participante de um fundo de pensão. Muito obrigado. Coloco-me à disposição.”

Minha apreciação
Como se vê, nesse final, a ABRAPP apela para o argumento de autoridade. O assunto foi democrática e diuturnamente debatido, inclusive por todos os interessados (Patrocinador e Participante), por autoridades, por juristas governamentais e até pela OAB que elaborou parecer favorável. É respeitável argumento, sem dúvida. Nada vale, porém, quando a evidência demonstra que as autoridades falharam.
Não tenho conhecimento desses diuturnos debates. Não me interessava por esse assunto antes do ano de 2009. Acreditava, como ainda tento acreditar, que o Estado, como manda a LC 109/01, protege os meus direitos de Participante Assistido. Seja como for, se o argumento em que todas aquelas autoridades basearam a legalidade do instituto da Reversão de Valores é esse que a ABRAPP exibiu na Audiência Pública do Senado, lamento dizer que os inúmeros textos que venho escrevendo neste blog são muito mais robustos para qualifica-lo como instituto ilegal.

Cabe aos leitores julgar quem expõe argumento mais convincente, a ABRAPP naquela exposição ou este blog nestas dezenas de textos.

Apreciaria ter a oportunidade de ler o parecer que a ABRAPP disse foi proferido pela OAB para justificar o instituto de Reversão de Valores. Infelizmente, lá pelo início do ano 2012, um colega de Curitiba me disse ter enviado por duas vezes à OAB estudo demonstrando a ilegalidade da Reversão de Valores, motivado exatamente por isso que ela teria apresentado parecer favorável em reuniões de debate promovidas pela SPC para a institucionalização da Reversão de Valores, e solicitado o favor de conhecer o seu conteúdo. Infelizmente, não obteve resposta alguma, pois certamente, creio, teríamos luzes definitivas de esclarecimento desse assunto.

No meio desse argumento de autoridade, a ABRAPP tenta reforçar sua argumentação, apelando para o fato de que a Reversão de Valores só pode ser realizada sob determinadas condições, entre elas se o Plano de Benefícios é fechado e quitado. ´

É claro que esse fato não permite que se lhe abra exceção, já que a proibição do artigo 19 da LC 109/01 é claramente geral e irrestrita: reservas previdenciárias não podem ser gastas noutra coisa, a não ser no pagamento de benefícios previdenciários.

 

2 comentários:

  1. Dileto amigo Edgardo,

    Magnífica contra-argumentação. Mais uma de suas "obras-primas".

    Um absurdo o que disse o ABRAPP-Advogado sobre "exemplificações" contidas na LC-109. Sou leigo em técnicas de construção de Leis, mas racionalmente penso que não cabem exemplificações na formulação de uma Lei, salvo melhor juízo.

    Edgardo, peço-lhe que verifique, em seu texto abaixo inserido entre aspas, o uso da expressão superávit colocada entre parêntesis por mim. Acho que o certo é a expressão déficit, salvo melhor juízo seu.

    "ABRAPP
    “O superávit e o equacionamento do déficit foram discutidos amplamente no Conselho Nacional de Previdência Complementar. Foram vários e vários meses de trabalho, em que se estruturou uma normatização, quer me parecer, de maneira prudente, de maneira conservadora, ditando etapas até se equalizar o déficit ou se distribuir o superávit entre quem? Entre aquelas partes que contribuem para aquele benefício. Quem são? Patrocinadoras e participantes. Se patrocinadoras e participantes têm de suportar o ((superávit)) – isso a lei estabelece –, quer me parecer, de maneira isonômica, equilibrada, equânime, que tem de haver também uma possibilidade de reversão desse superávit também aos seus contratantes, patrocinadoras e participantes.”

    Mais uma vez descrevo numa palavra o que gostaria de gritar numa platéia lotada de nossos pares ao final desta exposição: Bravo !!!

    Um fraterno abraço.

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  2. Meu amigo Juarez
    Obrigado pela crítica elogiosa a este texto. Já fiz a correção que sugeriu. Era como se achava no texto taquigráfico. Mas, o correto é o que você propôs, evidentemente.
    Edgardo

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