sexta-feira, 29 de maio de 2015

338. Análise de um Projeto

Acabo de receber mensagem contendo sugestão para que a FAABB promova Ação de Declaração de Inconstitucionalidade (ADI) contra a CASSI, caso esta insista em alterar o Regulamento do Plano de Saúde, introduzindo cláusula desvantajosa para os já ingressados assistidos da CASSI.

Alega-se:

- A violação do inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição Federal (CF): “A Lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”;

- A incorreta aplicação do Artº 3º da Emenda Constitucional nº 20/1998 – “É assegurada a concessão  de aposentadoria e pensão, a qualquer tempo, aos servidores públicos e aos segurados do regime geral de previdência social, bem como a seus dependentes, que, até a data da publicação desta Emenda, tenham cumprido os requisitos para a obtenção destes benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente.”

- E a consequente inconstitucionalidade Parágrafo único Artº 17 da LC 109/2001 – “Ao participante que tenha cumprido os requisitos para obtenção dos benefícios previstos no plano, é assegurada a aplicação dos dispositivos regulamentares vigentes na data em que se tornou elegível a um benefício de aposentadoria.”

 

Acho que essa proposta de ADI não tem a menor chance de sucesso junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). Eis a justificativa de minha opinião.

 

Primeira análise

Esta primeira análise foca tão-somente os argumentos apresentados. Para isso, note-se que a previdência social brasileira consta de três regimes (dois de ordem pública e um da ordem privada):

o RGPS (regime geral da previdência social), de ordem pública, do qual todo trabalhador brasileiro (CLT) é obrigado participar e todo cidadão brasileiro tem o direito de participar (artigo 201 da CF);

os RPPS (os regimes próprios da previdência social), de ordem pública, do qual os servidores públicos são obrigados a participar (artigo 40 da CF);

o RPPC (o regime privado da previdência complementar), de ordem privada, do qual pode participar o cidadão brasileiro que quiser (facultativo). Este regime destina-se a melhorar o benefício previdenciário concedido pelo RGPS a cidadão que o deseje.

 

Atento a essa premissa, leia-se o artigo 3º da Emenda Constitucional nº 20/1998 acima citada e transcrita. Ela diz que os critérios da legislação então vigente para aposentadoria e pensão valem para servidores públicos (RPPS) e SEGURADOS DO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS) que hajam preenchido os requisitos para percebê-los até a data da publicação da Emenda. Essa norma restritiva, portanto, vale para ambos os regimes, o RPPS (servidores públicos) e RGPS (CLT). Vale para todos os aposentados e pensionistas, para todos os cidadãos que se aposentam ou recebem pensão, já que aposentadoria e pensão só são concedidas por esses dois regimes. O RPPC apenas as complementa, isto é, as melhora.

 

Alega-se, todavia, que, seja como for a Emenda Constitucional 20 não incluiu o RPPC. Já demos a primeira resposta: sim, não incluiu, porque incluí-la não faz sentido, já que aposentadoria e pensão somente são concedidas pelo RGPS e RPPS. Mas, existe outro argumento: o acessório acompanha o principal. Ora, o RPPC é regime previdenciário acessório ao RGPS. O RPPC apenas concede melhoria ao benefício de aposentadoria e pensão. E goza, ademais, de muita autonomia. Logo, o RPPC apenas  acompanha frouxamente o RGPS. Logo, nada obstante, a disciplina da Emenda Constitucional 20 alcança também o RPPC.

 

Note-se, ademais, que a Emenda Constitucional 20 fez, ainda, outra restrição que infirma essa interpretação de excepcionalidade para o RPPC, adotada no projeto da AAPBB. Trata-se do “§2º... As contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não integram o contrato de trabalho dos participantes,..”

 

Poder-se-á,  entretanto, invocar que esse parágrafo nada parece determinar que se relacione com a irredutibilidade do benefício previdenciário. É verdade. Mas, aí entra o exame do outro argumento invocado no projeto da AAPBB, a saber, a norma constitucional do direito adquirido e do ato jurídico perfeito.

 

É verdade que o RPPC é um contrato, e contrato de adesão. O princípio que o rege é, pois, o PACTA SUNT SERVANDA (os contratos devem ser cumpridos). Mas, o mais importante pacto existente é a LEI e a mais importante e fundamental lei é a CONSTITUIÇÃO. Assim, o perfeito enunciado desse princípio merece ser o seguinte: os contratos LEGAIS devem ser cumpridos, sobretudo contratos formulados sob a égide de regimes jurídicos, como é o caso do contrato previdenciário complementar, concluído sob o RPPC. Então, esse contrato previdenciário complementar deve submeter-se, como bem diz o projeto que lhe apresenta a AAPBB, ao inciso XXXVI do artigo 5º da CF: “A Lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

 

Ora, o que os juristas entendem por DIREITO ADQUIRIDO? É aquele em que TODAS as condições de existência JÁ SE REALIZARAM. Por exemplo, a aposentadoria integral necessita de 55 anos de idade. Então, se tenho 50 anos de idade, não tenho direito adquirido à aposentadoria integral. Na conformidade desse inciso da CF, pois, segundo os juristas,  a Lei PODE MODIFICAR DIREITOS. DESDE QUE AINDA NÃO ADQUILRIDOS. As cláusulas contratuais, portanto, geradoras de DIREITOS, podem ser modificadas. Logo, segundo a interpretação dos juristas, a LEI SÓ NÃO PODE MODIFICAR OS DIREITOS JÁ ADQUIRIDOS. Uma Lei não pode destituir uma pessoa de direito, que ela já havia adquirido na vigência de lei anterior.

 

É isso que estamos assistindo agora na edição da LEI DA BENGALA. O Estado aumentou a idade de aposentadoria dos juízes do Supremo Tribunal Federal, de 70 para 75 anos. O que estão pedindo os juízes do Supremo Tribunal Federal ao Legislativo, segundo informa a imprensa? Que se introduza uma cláusula, determinando que a lei só vale para os juízes que tomarem posse no STF após a sua edição. Eles não querem ter prejudicada a EXPECTATIVA DE DIREITO AOS SETENTA ANOS!

 

É isso também que vemos explicado no magnífico parecer, produzido pelo Dr. Sérgio d’Andrea sobre a Resolução CGPC 26/08: direito adquirido difere de expectativa de direito; aquele é o direito com todas as condicionantes já realizadas, enquanto esta é o direito com alguma condicionante ainda não preenchida. A Prof. Maria Helena Diniz explica, de forma extremamente concisa e clara. o que os juristas entendem por direito adquirido: é... “direito concreto, ou seja, subjetivo, e não direito potencial e abstrato.” Nelson Palaia em seu livro de texto define-o: “...ato  praticado com observância de lei vigente à época em que foi praticado e que, por isso, se constitui válido e definitivo, produzindo todos os efeitos de direito.”

 

Poder-se-á insistir. Tudo bem. Mas, existe o ATO JURÍDICO PERFEITO! Assinei o contrato previdenciário complementar. Isso é um ato jurídico perfeito. Logo, a LEI NÃO PODE MODIFICAR AS CLÁUSULAS DESSE CONTRATO.

 

Segundo entendo é esse o entendimento da Justiça do Trabalho, já que, na expressão do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, “segundo o artigo 468 da CLT, nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia. ou seja, tratando-se de norma regulamentar vigente na época da contratação, tal condição aderiu ao contrato de trabalho do de cujus, só podendo ser alterada em caso de mútuo consentimento e se não causar prejuízo ao empregado...” A Súmula nº 51, I, do C. TST também assim está redigida.

 

Ocorre, porém, que o conceito de ato jurídico não se reporta EXATAMENTE a norma legal. O significado é qualquer ato voluntário praticado, que (saiba-se ou não) está disciplinado por lei. Praticado tal ato, ele só poderá ser julgado pela lei vigente na data em que foi praticado, isto é, segundo a lei vigente na data em que foi praticado. Por que? Porque só a lei que conhecemos pode guiar nossos atos, só nos submetemos à lei, só ela cria deveres e obrigações (CF, inciso II – “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”).

 

Acontece, porém, que, no conceito de ato jurídico perfeito, a interpretação do Supremo Tribunal Federal, introduz aquela mesma noção de direito adquirido que já explanamos acima, a saber, o direito concreto, com todos os seus condicionamentos realizados. Na minha opinião, é por esse motivo que foi introduzido aquele §2º no artigo 202 da CF (vê acima), retirando o contrato previdenciário complementar da órbita do contrato de trabalho e da Justiça do Trabalho. A meu ver, é por isso que foi possível inserir, na LC 109/01, não apenas o artigo 17 a que o projeto da AAPBB atribui INCONSTITUCIONALIDADE, mas também o §1º do artigo 68: “Os benefícios serão considerados direito adquirido do participante quando implementadas todas as condições estabelecidas para elegibilidade consignadas no regulamento do respectivo plano.”

 

Assim, como estou expondo, não é a doutrina jurídica esposada no projeto da AAPBB que eu entendo ler nos textos dos mestres do Direito.

 

Segunda análise

Na minha opinião, ainda existe outro argumento, de outra ordem, a desautorizar a adoção desse projeto da AAPBB. Trata-se de argumentação de maior amplitude, a saber, a matéria jurídica da Assistência à Saúde é matéria jurídica diversa da Previdência Social, da Previdência Privada Complementar. Por isso, elas são também disciplinadas por leis diferentes. Não teria cabimento, portanto, apelar para a Emenda Constitucional nº 20, nem para a inconstitucionalidade do artigo 17 da LC 109/01 para evitar a realização da trágica violência que o nosso antigo patrão nos ameaça fazer. Ambos esses mandamentos referem-se à Previdência Social, não disciplinando a Assistência à Saúde.

 

A Assistência à Saúde junta-se à Previdência Social, no Capítulo II (Da Seguridade Social) do Título VIII (Da Ordem Social) porque ela integra a Seguridade Social, do mesmo modo que Assistência Social. Somente por isso. A CF, todavia, as distingue com tanta ênfase que a própria LC 109/01, a Lei Básica da Previdência Complementar, veta que EFPC se onere com os serviços da Assistência à Saúde (artigo 76).

 

É bem verdade que, apesar de isolada em seu capítulo próprio, a Assistência à Saúde, não obstante, compartilha um grupo de diretrizes comuns com a Previdência Social. Acho importantíssimo, para o escopo deste trabalho, chamar a atenção para o artigo 193 da CF, acredito o mais curto artigo da Carta, certamente o mais curto capítulo. Penso que isso foi propositadamente produzido pelos Constituintes. Depois de ter organizado o Estado Brasileiro, depois de ter esboçado no Título VII a estratégia para a produção da riqueza nacional, os Constituintes quiseram sintetizar e salientar, nesse artigo 193 e nesse Capítulo I, todo o fabuloso valor do objetivo que se propõe o Estado Brasileiro: promover o Bem Estar Social (a felicidade individual e coletiva do Povo Brasileiro) que se consegue com Justiça Social (distribuição justa da riqueza nacional) produzida graças ao Primado do Trabalho (o recurso básico da produção). Esse artigo 193 é maravilhosamente fecundo e orientador! Ele é o mais precioso mandamento da CF. É a síntese da razão de ser da existência do Estado Brasileiro. É a bússola de como deve ser e deve funcionar o Estado Brasileiro: o Primado do Trabalho!

 

E já aqui chamo a atenção para dois incisos do artigo 194 da CF:

“IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

V - eqüidade na forma de participação no custeio;”

 

Ameaçar limitar o auxílio à saúde ao atual tempo atuarial de vida dos assistidos da CASSI é ou não redução do valor da Assistência à Saúde e da dignidade da pessoa humana?

Exigir a igualdade do valor das contribuições entre assistidos e Patrocinador da CASSI – empresa, e empresa das mais lucrativas no Brasil e no Mundo - é equidade ou inequidade?

Essas duas ameaças são ou não são agressão ao artigo 193 da CF – a razão de ser do Estado Brasileiro – mormente no que tange ao princípio do Primado do Trabalho, naquilo que implica o DEVER DA SOCIEDADE DE CONFERIR SEGURANÇA (SEGURIDADE!) aos INCAPACITADOS PARA O TRABALHO (aposentados e pensionistas), por doença, acidente ou longevidade?

 

Para entender-se bem a gravidade do que se está discutindo, é conveniente que se esclareça que aqui, sim, estamos nos baseando no princípio jurídico básico que rege os direitos e deveres contratuais, a saber, PACTA SUNT SERVANDA. A Assistência à Saúde através da CASSI (Caixa de Assistência aos Funcionários do Banco do Brasil) me foi apresentada como condição obrigatória de ingresso no Banco, a pouco mais do meio-dia daquele longínquo 5 de outubro de 1955, na Agência Centro de Recife, Setor do Funcionalismo, pelo já falecido colega Pinto, quando lhe indaguei se era obrigado a assinar o documento de ingresso na CASSI que ele me exibia: “Se não assinar, não ingressa no Banco.”, advertiu-me. É claro que já não mais existe o vínculo empregatício entre mim e o Banco. Mas, aquela cláusula contratual de assistência à saúde, nem o Banco ousará afirmar que não é vinculo contratual até a morte minha e do meu mais longevo dependente!

 

Aqui, sim, portanto, a meu ver, vale, em toda sua pujança, o princípio da Justiça do Trabalho: NEM O MÚTUO CONSENSO TEM PODER SUFICIENTE PARA DEGRADAR UM DIREITO REMUNERATIVO DO TRABALHO, A LEI POSTERIOR SÓ TEM PODER DE MELHORÁ-LO.

 

Esse direito é reforçado, com expressões fortes e bem explícitas, em vários outros mandamentos jurídicos:

Art. 196 da CF: “ A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao ACESSO UNIVERSAL E IGUALITÁRIO às ações e serviços para sua promoção, proteção e RECUPERAÇÃO.”

Entendo que a CASSI está obrigada a melhorar cada vez mais os seus serviços, e proibida de restringi-los, sobretudo no tocante aos procedimentos curativos.

 

Art. 197.da CF: “São de RELEVÂNCIA PÚBLICA AS AÇÕES E SERVIÇOS DE SAÚDE, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, DEVENDO SUA EXECUÇÃO SER FEITA diretamente OU ATRAVÉS DE TERCEIROS e, também, por pessoa física OU JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO.”

É indiscutível, portanto, a obrigação do Banco no que diz respeito a aposentados e pensionistas.

 

Art. 198 da CF: “As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

II - ATENDIMENTO INTEGRAL.”

Atente-se para esse mandamento – atendimento integral – e note-se que sempre foi deficiente a assistência à saúde pela CASSI no que diz respeito à saúde dentária.

 

Esse mandamento enfático da Lei continua no documento em que o Estado Brasileiro organizou a Assistência à Saúde, a Lei 8080/90:

Art. 2º: “A saúde é um direito FUNDAMENTAL DO SER HUMANO, DEVENDO O ESTADO PROVER AS CONDIÇÕES INDISPENSÁVEIS AO SEU PLENO EXERCÍCIO.

§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que ASSEGUREM ACESSO UNIVERSAL E IGUALITÁRIO às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e RECUPERAÇÃO.”

Esse adjetivo IGUALITÁRIO suscita-me, de imediato, comparação com a assistência médica que vejo proporcionada a políticos no Brasil, que, segundo dizem, a têm ilimitada quanto a custos de despesas. Já assisti  a senador, em discurso no Senado, vangloriar-se até de trazer de sua terra natal relacionamentos para tratamento em Brasília.

“§ 2º O dever do Estado NÃO EXCLUI o das pessoas, da família, das EMPRESAS e da sociedade.”

Insisto. Então, o Patrocinador da CASSI não  pode eximir-se desse dever; ao contrário, maior é sua obrigação como uma das mais lucrativas empresas no Brasil e no Mundo, e, tanto mais, que empresa de economia mista, com capital majoritário governamental.

 

“Art. 3o  Os níveis de saúde expressam a organização social e ECONÔMICA DO PAÍS, ...”

O nível de assistência médica da CASSI é, pois, MEDIDA DA COMPETÊNCIA EMPRESARIAL DO PATROCINADOR!... Penso que deve ser considerada pelo Patrocinador como marketing muito superior a qualquer outro que vem utilizando, como por exemplo, o esportivo.

 

“Art. 5º São objetivos do Sistema Único de Saúde SUS:

III - a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e RECUPERAÇÃO DA SAÚDE, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas.

Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS):

c) de SAÚDE DO TRABALHADOR; e

d) de ASSISTÊNCIA TERAPÊUTICA INTEGRAL, inclusive farmacêutica;”

Estes dois últimos artigos enfatizam a importância da medicina curativa tecnológica. É para ela que precisamos da CASSI, porque é ela que é ALTAMENTE ONEROSA e EFICAZ PARA A CURA.

 

Claro que temos de analisar também as prescrições constantes da Lei 9656/98 que organizou precisamente os serviços prestados pelos planos de saúde. O inciso I do artigo lº determina algo que merece reflexão: “I - Plano Privado de Assistência à Saúde: prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais A PREÇO pré ou pós ESTABELECIDO, POR PRAZO INDETERMINADO, com a finalidade de garantir, SEM LIMITE FINANCEIRO, a ASSISTÊNCIA À SAÚDE, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e odontológica, A SER PAGA INTEGRAL OU PARCIALMENTE ÀS EXPENSAS DA OPERADORA CONTRATADA, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor;”

 

Esse inciso leva-nos a meditar naquelas diversas circunstâncias que se congregam para formar esse negócio que é um Plano de Saúde. Efetivamente, existe uma multidão de pessoas, de PODER AQUISITIVO LIMITADO, necessitada de utilizar os recursos de restauração de saúde, que a medicina mais avançada proporciona àqueles de alto poder aquisitivo. Outro grupo de pessoas entende que tem competência para proporcioná-la, explorando as oportunidades abertas pelos princípios da solidariedade e probabilidade. Temos formado o conjunto de contribuições limitadas, medicina curativa de ponta e recursos financeiros ilimitados. O segredo do sucesso nesse empreendimento, pois, reside na habilidade do ofertante dos serviços médicos curativos de ponta pelo menor preço, pelo menor preço ajustável ao bolso do demandante. Daí, então, a Lei reportar-se, de forma surpreendente, a SEM LIMITE FINANCEIRO, isto é, a Lei reconhece que o sucesso do Plano de Saúde reside nessa extraordinária habilidade de negociação de preços para os benefícios da medicina curativa de ponta, que as contribuições acumuladas sejam suficientes para pagar medicina curativa de ponta. A Lei reconhece que essa habilidade existe e que, por isso, um Plano de Saúde é viável. E que os Planos de Saúde bem sucedidos a possuem, e, portanto, possuem RECURSOS FINANCEIROS ILIMITADOS, isto é, SUFICIENTES PARA PAGAR OS BENEFÍCIOS DA MEDICINA CURATIVA DE PONTA QUE SOMENTE OS ABASTADOS PODERIAM USUFRUIR.

 

A Lei está dizendo que não existe desculpa para alegar INEXISTÊNCIA DE RECURSOS FINANCEIROS. Inexistência de recursos financeiros é INCOMPETÊNCIA. Negativa de prosseguir com Plano de Saúde por Patrocinador Empresa, empresa altamente lucrativa seria, então, classificada do quê? Permitam-me silenciar a minha resposta. Sei que existe uma gritando na mente de cada um que ousou ler estas reflexões até aqui. Isto, porém, preciso deixar claro: o Patrocinador da CASSI NÃO PODE LEGALMENTE JUSTIFICAR A NEGATIVA DE SUA OBRIGAÇÃO TRABALHISTA DE PATROCÍNIO APELANDO PARA O ÔNUS DE SEU DEVER.

 

§ 3o do artigo 8º: “As operadoras privadas de assistência à saúde poderão voluntariamente requerer autorização para encerramento de suas atividades, observando os seguintes requisitos, independentemente de outros que venham a ser determinados pela ANS:       

a)            comprovação da transferência da carteira sem prejuízo para o consumidor, ou a inexistência de beneficiários sob sua responsabilidade;      

b)             garantia da continuidade da prestação de serviços dos beneficiários internados ou em tratamento;”

Penso que a pretensão do Patrocinador da CASSI de limitar o montante do compromisso de custeio da CASSI não se concilia com essas duas cláusulas condicionantes de encerramento das atividades de um Plano de Saúde.      

 

Medite-se, finalmente, nos artigos do atual Estatuto da CASSI.

Artigo 1º: “...pessoa jurídica de direito privado... associação, sem fins lucrativos, voltada para a ASSISTÊNCIA SOCIAL na modalidade de autogestão.”

É uma associação mais ambiciosa do que eu imaginava. O objetivo da CASSI é mais amplo do que a assistência à saúde, é a ASSISTÊNCIA SOCIAL.

 

Artigo 2º: “...prazo de duração... indeterminado.”

O Patrocinador quer tornar DETERMINADO para os sócios PÓS-LABORAIS! Na minha opinião, aposentados e pensionistas são sócios pós-laborais, de fato. Mas, as consequências da cláusula laboral de assistência da saúde não  se extinguiram. SÓ A MORTE DESTROI ESSE VÍNCULO.

 

Artigo 3º: “São objetivos precípuos da CASSI...:

I. conceder auxílios para cobertura de despesas com a promoção, proteção, RECUPERAÇÃO E REABILITAÇÃO DA SAÚDE, INCLUSIVE ODONTOLÓGICA, dos associados, de seus respectivos dependentes...”     

Obriga-se a proporcionar medicina curativa tecnológica de ponta, inclusive odontológica... Tenho a impressão que nessa área da Odontologia, a CASSI não realizou satisfatoriamente seu objetivo...

 

“III. desenvolver ações, incluídas pesquisas científicas e tecnológicas, visando à promoção da saúde e à prevenção de doenças dos associados, seus beneficiários inscritos e participantes externos;...”

Não tinha ideia de que a CASSI se propusesse objetivo tão ambicioso. Já li alhures que a pesquisa na área das ciências biológicas, medicina, farmácia etc. são altamente onerosas...

 

Todo esse edifício jurídico, que forma o regime da Assistência à Saúde no Brasil, foi construído e deve continuar sendo mantido e acrescido à luz dos valores que os Constituintes colocaram no Preâmbulo da Constituição Brasileira de 1988. Aqueles valores são as diretrizes constitucionais para as decisões judiciais e para os desenvolvimentos legislativos.

 

E o valor básico ali enunciado é a VIDA, seguido da DIGNIDADE e da AUTONOMIA DO SER HUMANO, e outros. De fato, atualmente insistimos muito no valor da vida humana. Insistimos muito no direito à Vida. Insistimos muito no direito à Vida digna, na Dignidade do ser humano.

 

Durante milênios, os sábios gregos – poetas, dramaturgos e filósofos – encararam a vida como a própria infelicidade: “E quem muitos anos ambiciona não pode ver a alegria onde ela realmente se encontra: não ter nascido vale mais que tudo.” Virgílio, o maior poeta romano, entendia que a felicidade consiste em possuir a exata compreensão da vida: que ela é total incerteza e insegurança, tanta que só uma certeza existe: ela finda.

 

O Cristianismo passou milênios doutrinando a Europa e o Mundo que esta vida terrena é infeliz. Veja as três mais populares orações católicas. O Padre Nosso: “O pão nosso de cada dia nos daí hoje. Perdoai os nossos pecados... Não nos deixeis cair em tentação... Livrai-nos do mal.” A Ave Maria: “Rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte.” A Salve Rainha: “Salve! Rainha, Mãe de Misericórdia, vida, doçura, esperança nossa, salve! A vós bradamos os degradados filhos de Eva. A vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas!” Esta vida terrena é um período de provação.

 

E, de fato, a vida humana até o século XVIII era realmente extremamente sofrida para todos, até para os reis. Assim, Luís XV, grande, poderoso e riquíssimo rei francês afirmou: “A vida vale nada.”

 

Já o Homem Moderno entende que a vida é breve, que a morte, enfim, a reduz a uma ironia da irracionalidade e do acaso. E quanto mais feliz e mais bem sucedido o indivíduo é, mais irônica lhe é a vida. Entende-a assim, porque a constata total incerteza e insegurança. O Homem Moderno, por isso, é trabalhado muito mais intensamente pelo anseio existencial da imortalidade, que já os babilônios, há uns cinco mil anos, nos primórdios da civilização, deixaram registrado na primeira epopeia produzida, o Gilgamesh. É que a Humanidade da Era Industrial - da eletricidade, motor e telecomunicação; da ferrovia, vapor, iates, transatlânticos, automóvel e aeronave – constituiu a Humanidade da Belle Epoque – dos casinos, teatros, cinemas, espetáculos esportivos globais, estâncias minerais, turismo em hotéis, ilhas, cidades e hotéis superlativamente deslumbrantes. A Joie de Vivre não é mais apenas sonho do Homem Moderno: é um direito. O Direito à Vida.

 

Assim, esses dois princípios - o do VALOR SUPREMO DA VIDA e o do DIREITO À VIDA-, são os dois princípios fundamentais da SOCIEDADE HUMANA NOS TEMPOS ATUAIS. O Homem Moderno é nietzschiano.

 

A luta pela sobrevivência está aí em toda a história diária da evolução humana desde o australopitecos e o homo faber, e na trajetória evolutiva do homo sapiens. Mas, foi a partir do século XVIII, sobretudo, que a Humanidade começou a orientar-se pela ideia de que a Vida, apesar de triste ironia, é o bem fundamental e máximo que se possui, e, por isso, interessa proteger e fazê-la a menos desditosa ou a mais feliz.

 

E para isso a Humanidade tenta alongar a Vida, cada vez mais, eliminar o máximo de infortúnios e conseguir o máximo de bens cada vez com menor esforço humano. Assim, a Humanidade busca, cada dia, mais bem estar, com o menor desgaste físico e mental. Isso é a aspiração da Humanidade nos tempos atuais. E a Humanidade, em poucos séculos, acumulou acervo colossal de bens e serviços para alongar a vida, evitar as desditas, acrescer o bem estar, aliviar o trabalho físico e mental, incrementar o entretenimento e o deleite. Carpe diem! Usufrui do dia presente!

 

Sim! É somente isso que se possui e é: o dia presente. Não se pode admitir que alguém apareça furtivamente e no-lo roube. O prolongamento da vida humana, o extraordinário aumento da expectativa de vida, é-nos proporcionado, sobretudo, pela MEDICINA CURATIVA TECNOLÓGICA DE PONTA. Não permitamos que no-la subtraiam. A Constituição Federal Brasileira, a Lei Brasileira, veda-o claramente.

  

 

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