Sensibilizou-me
a mensagem que me enviou no blog do Ari Zanella às 16:03 do dia 19/02/18.
Tratou-se de um texto elegantemente redigido e expressando ideias bem
justificadas. Compreende-se, pois, que experimente irrefreável impulso de
analisa-lo detidamente e manifestar, no meu entendimento, as ideias que
comungamos e aquelas em que divergimos.
1.
Logo de início fui emocionalmente desestabilizado pela expressão vocativa
“prezado amigo”. Dizem que Friedrich Nietzsche, o filósofo da pós-modernidade,
entendia que a busca conjunta pelo conhecimento seria uma amizade: “Sonho com
um amor em que duas pessoas compartilham a paixão de buscar juntas uma verdade
mais elevada. Talvez não devesse chamá-lo de amor. Talvez seu nome ideal seja
amizade.”
2. “Para clarear ideias acerca de
patrocínio, com base em argumentos sólidos, sem achismos.”
Também me horroriza a difusão de ideias
irracionais, absurdas, irresponsáveis. Até a opinião, o achismo, para ser
respeitável, precisa ser justificada.
3. “O patrocinador é a empresa
(empregador) privada ou estatal, ou o ente público (União, Estados, Distrito
Federal ou Município) que patrocina o plano de previdência complementar para
seus empregados ou servidores, conforme disposto no artigo 31, I, da LC
109/2001. A figura do patrocinador de plano de previdência já existia sob a
égide da legislação anterior (Lei 6.435/1977) e tem como pressuposto o vínculo
empregatício. Já o instituidor tem como pressuposto o vínculo associativo, caso
de um Sindicato, Associação, Fundação, etc.”
Concordo. Wladimir Novaes Martinez ensina, no seu Curso de Direito
Previdenciário, que “Patrocinador
particular é pessoa jurídica,
normalmente empresa de porte... Preocupada com a entidade propriamente dita a
legislação não cuida de descrever a patrocinadora... A própria EFPC pode ser, e
frequentemente é, patrocinadora... Patrocinador
estatal. Certa organização do Estado
empreende complementação...as primeiras foram estatais (Banco do Brasil e
Petrobras)... Designa-se provedora a
PATROCINADORA INCUMBIDA INTEIRAMENTE DO CUSTEIO COM AS DESPESAS COM O FUNDO DE
PENSÃO...” Até a aqui o que o direito previdenciário complementar diz desse
ente patrocinador.
Mas, no Direito desportivo, ensina Maria Helena Diniz,
no seu Dicionário Jurídico Universitário, que patrocínio é transferência
gratuita, em caráter definitivo, ao proponente, de numerário para realização de
projetos ou cobertura de gastos para realização de projetos pelo proponente. E
acrescenta que, na linguagem comum, patrocínio é proteção, auxílio, amparo.
Penso que, numa análise ampla do direito
previdenciário, não podemos nos ater simplesmente ao texto da lei. Por que?
Porque o legislador pode ter-se equivocado ao produzir a lei. Trata-se, pois,
de minha opinião, não apenas de achismo, pois é inegável que, desde o final da
década de 30 do século passado, abundam no Brasil as edições de normas
previdenciárias questionáveis e o próprio livro comemorativo do centenário da
PREVI diz na página 107: “O modelo de seguridade social preconizado na Carta
Magna acabou por não ser posto em prática: sua regulamentação foi
sistematicamente postergada e, quando ocorreu, tendeu a contrariar, em alguns
aspectos, o próprio espírito da
Constituição.”
3. “Os fundos de pensão americanos nasceram
como planos de benefícios definidos-BD. Ao regulamentar a previdência
complementar, com a Lei Federal 6.435/1977, depois revogada pela LC 109/2001, o
Brasil foi fortemente influenciado pelo modelo americano, razão pela qual, nas
décadas de 70 e 80 do século passado, os Planos de Benefício Definido (BD) eram
muito comuns entre nós, inclusive o nosso Previ 1 é de Benefício Definido.”
Desconheço a história e a
legislação dos fundos de pensão norte-americanos. Entendo que a lei 6435/1977
tenha sido influenciada por toda a cultura previdenciária mundial, inclusive a
norte-americana. Penso, não obstante, que duas orientações foram determinantes:
repartir o ônus previdenciário direto entre Estado e cidadão, até antevendo o
comprometimento progressivo maior deste no custeio com o fluir do tempo, e toda
a longa e rica história da seguridade social brasileira. Braz Cuba fundou o
primeiro Montepio no Brasil na primeira metade do século XVI, ainda nos primeiros passos do
Brasil colônia. No Brasil colonial já existia o Montepio da guarda imperial. No
Brasil império existiam os montepios do Exército, dos servidores do Estado, dos
ferroviários, dos Correios, e da Imprensa Nacional. No fim do século XIX existiam associações
mutualistas nas principais cidades brasileiras e centenas delas no Rio de
Janeiro. Em 1886, quando os funcionários propuseram a criação do montepio do
Banco do Brasil, eles invocaram o exemplo de um banco brasileiro, o COMIND, não
se reportaram a nada estrangeiro. Em
1913, a Assembleia de Acionistas do Banco do Brasil decidiu instituir a
aposentadoria por invalidez e por tempo de serviço, por este insigne motivo: a
INDIGNIDADE DE UM PATRÃO RICO DESAMPARAR EMPREGADO INVÁLIDO, bem como tempo de
serviço EXCESSIVO (ACIMA DE 30 anos) e, atente-se, INDIGNIDADE ATÉ EM EXIGIR
EXAGERADO TEMPO DE SERVIÇO! Em 1920, O BB tornou obrigatório o ingresso na
Caixa Montepio (pensão). Em 1923, editou-se a lei Eloy Chaves. Em 1933, cria-se
o primeiro Instituto de Aposentadoria e Pensão. Toda essa história antecede o
new deal de Franklin Roosewelt que, em 1937, declarou em discurso aqui no Rio
de Janeiro: “Despeço-me esta noite com grande tristeza. Há algo, no entanto, que devo
sempre lembrar. Duas pessoas inventaram o New Deal: o Presidente do Brasil e o Presidente dos Estados Unidos.”
Acho que a ideia de patrocínio, pois,
é legitimamente nacional. Pouca influência advinda do estrangeiro, se
considerarmos legitimamente brasileira o que nela existe de herança portuguesa.
E, atente-se, o próprio autor do New deal norte-americano, o Presidente
Roosevelt, se envergonhava de que lhe atribuíssem EXCLUSIVAMENTE a PATERNIDADE DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL NORTE-AMERICANA. Fez questão de reconhecer publicamente a influência
brasileira na sua decisão. O Estado brasileiro e o patronato brasileiro, pois, na
minha modesta opinião (não se trata de achismo) possuíam, já na época do New Deal,
multicentenar tradição de patrocínio previdenciário estatal e privado. Aquele,
o New Deal norte-amricano, foi, sim, influenciado por esta, a providência
social brasileira, é o próprio autor do New Deal que o confessa!
(continua)
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