sexta-feira, 29 de novembro de 2019

473 Salim Mattar, Constituição, ONU e CASSI



Acabo de ler no Google que o Secretário de Desburocratização do atual governo Brasileiro, o do ínclito Presidente Jair Bolsonaro, cidadão temente a Deus, segundo se declara, e militar da reserva, cujo lema de governo é Pátria amada, em quem votei para a Presidência da República, em razão do seu programa de extirpação da corrupção na administração pública,  é o senhor Salim Mattar, empresário exitoso, dono da maior empresa brasileira de aluguel de carro com ramificação em vários países da América do Sul, cidadão, sem dúvida, respeitável pelo que já realizou.

A notícia relatava a entusiástica homenagem que a classe industrial mineira lhe prestou e a opinião que ele expressou nessa ocasião sobre a Constituição Brasileira, que ele deprecia por ser social democrática: “Ele condenou a constituição de 1988 e os “90 direitos e 7 deveres” que garantiu ao cidadão”.

Tentei, sem sucesso, obter informações sobre o nível de instrução do Sr. Salim Mattar. Queria saber se tinha formação acadêmica e de que nível e qualidade. Seja como for, estranho, e muito, que haja aceito o cargo de Secretário da Desburocratização, confundindo burocracia com Seguridade social. Seguridade Social, garantia estatal de subsistência, previdência e assistência à saúde, nas situações adversas da vida, é aspiração multimilenar humana que se extrai desde os primeiros escritos humanos sumerianos, há uns cinco mil anos. Passaram a integrar as constituições dos Estados, desde o final do século XIX, como direito fundamental social dos povos, porque penhor da paz social, condição imprescindível para que exista progresso. Eu recebi, em meu gabinete de Gerente da Carteira de Câmbio do Banco do Brasil, na década de 70 do século passado, notáveis empresários de São Paulo, chorando as quebradeiras que os operários, chefiados pelo notávl líder trabalhista Lula provocavam nas fábricas, e revelando que pretendiam transferir-se para o estrangeiro.

Visitei o portal da Localiza na Internet e percebi que o Dr. Salim deve ser um entusiasta da liberdade. Ficou-me a impressão de que ele pensa que liberdade é fazer tudo o que se deseja e pode conseguir, e confunde liberdade com livre arbítrio. Não me parece que já haja percebido que volumosos livros textos de Psicologia dos mestres mundiais das universidades norte-americanas tratam da atividade humana como se fosse um produto do cérebro tal qual é a urina dos rins e a bílis do fígado. O conceituado livro texto de Neurologia, “Cem Bilhões de Neurônios”, do professor Roberto Lendt, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, informa que atualmente se discute se existe o livre arbítrio. Creio que o Dr. Salim ainda não percebeu que a ciência do Direito hodiernamente se reporta ao crime como se fosse uma anomalia e o criminoso como se doente fosse, uma vitima de doença contaminável, que deve ser apartado da comunidade para cura, mas, logo, sanado, precisa nela reintegrar-se, porque ela é o seu hábitat natural.

A liberdade, pois, consistiria no trabalho conjunto de formular a Lei que embasa a sociedade aglutinando consistentemente as pessoas, proporcionando a cada uma a garantia de atividade producente de sua vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na alma, e no fato de que, como afirmou Péricles, há dois mil e seiscentos anos: “Sou livre porque não obedeço a homem algum, mas somente à Lei, que eu mesmo elaborei.”

Sim, a sociedade é uma criação do homem, mas o homem a cria por uma tendência natural, como a formiga fabrica o formigueiro e a abelha a colmeia, porque esses três animais são animais sociáveis, como explicava Aristóteles, e à feição daquilo que ele presentemente é e necessita,. Mas, a primeira condição, para que haja sociedade humana é que haja paz, tranquila coexistência, concordância, entre a amplíssima multidão de diversidades. E nos tempos atuais, a Era da Informação, essa concordância se fundamenta na igualdade efetiva de direito à vida boa como já pensavam Platão, Aristóteles e Epicuro, há dois mil e seiscentos anos, e que este último condensava em pequena e expressiva máxima: “uma vida boa, sem dor no corpo e sem angustia na alma”. O Estado é um meio, o mais importante meio para que todos os cidadãos realizem o seu projeto individual de vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na alma, em qualquer circunstância da vida, desde que viva segundo a Lei.

Esta, portanto, é a essência de qualquer Constituição moderna – “Uma vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na alma.”- em qualquer circunstância da vida, para qualquer pessoa humana, que, sem consulta prévia, foi lançada e aceita na sociedade dos homens.

É por isso, que julgo correta e louvável a Constituição Brasileira Social Democrática, haja vista os artigos:.
3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
 I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 
e
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Artigo com redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)
que os governos até hoje eleitos, todavia, vêm impedindo cumprir-se plenamente: “Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
 I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.

Nada obstante, o TÍTULO VIII - Da Ordem Social impõe ao povo brasileiro a orientação social democrática preponderante no ambiente cultural da civilização contemporânea:  “Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.”, que os capítulos detalhadamente prescrevem, esclarecendo, tratar-se de obrigação dos Poderes Púbicos e de toda a sociedade, e consequentemente, como o perfaz explicitamente nos artigos 201 e 202, das entidades dedicadas à realização de negócios, as produtoras da riqueza nacional: Capítulo II-Da Seguridade Social e da Saúde, Capítulo III-Da Educação, da Cultura e do Desporto, Capítulo IV-Da Ciência e Tecnologia, Capítulo VI-Do Meio Ambiente, Capítulo VII-Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso.

Assim, não consigo entender como Dr. Salim, cidadão que deve possuir excepcional nível de conhecimento e cultura para ser convidado a  ocupar a Secretaria de Desburocratização, não apenas confunda desburocratização com a eliminação das instituições consideradas atualmente pelo mundo culto como as produtivas de uma sociedade cujo ambiente é propício a promover “a vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na alma” em cada participante individual, como, ao que parece, julga poder até realizar esse plano sem substituir essa Constituição por outra de um Estado  simplesmente liberal.

A substituição da atual Constituição Brasileira Social Democrática pode até ser possível, penso, mas de forma autoritária, não democrática e confrontando as diretrizes da Organização das Nações Unidas à qual o Brasil se vangloria de pertencer e anualmente proferir o discurso de abertura dos serviços, cuja Declaração dos Direitos Universais do Homem contém os seguintes artigos:
Artigo I Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.
Artigo III Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Artigo XXII Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade.
Artigo XXIII 1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. 4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses.
Artigo XXIV Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas. Artigo XXV 1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social.  Artigo XXVI 1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz. 3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.  Artigo XXVIII Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados. Artigo XXIX 1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível. 2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. 3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas. Artigo XXX Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos.”

Com base nessa Declaração de Direitos, a ONU não se contenta com restringir-se a avaliar os países pela produção de riqueza, o PIB. Ela instituiu o índice de Felicidade Nacional que abarca a avaliação de nove áreas da vida humana em sociedade: bem-estar psicológico, saúde, uso do tempo, vitalidade comunitária, educação. cultura, meio ambiente, governança e padrão de vida. Segundo essse Índie, no ano de 2017, o país mais feliz do mundo era a Noruega, enquanto os Estados Unidos ocupavam apenas o 13º lugar e a China o 86º. Como se percebe, a ONU valoriza os países, segundo  um critério social democrático de sociedade e de Estado, inspirado na mentalidade prevalecente nos altos nichos culturais da civilização contemporânea.

Assim, acho-me justificado em divergir não apenas da opinião do Dr. Salim sobre a Constituição Brasileira social democrática, como também de vários critérios básicos da reforma da previdência social promovida pelo eminente Ministro Paulo Guedes, como já manifestei aqui neste blog em textos anteriores, especificamente na substituição da fórmula da  seguridade pela do financiamento preponderantemente pessoal. Discordo do espírito que pervaga a formulação da LC108/01, bem como da recente RESOLUÇÃO Nº 23, de 18 de janeiro de 2018 da CGPAR, que orientou o Banco do Brasil em toda essa longa e dolorida negociação entre Banco do Brasil e funcionários sobre a capitalização da CASSI, por motivos que também já expus em textos deste blog sobre a matéria.



















































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