sábado, 15 de agosto de 2015

342. "Ou o governo muda ou o povo muda o governo".

Quem disse isso foi o senador Romero Jucá ao repórter da Folha de São Paulo, segundo noticiário de hoje.

A afirmação do Senador Jucá coincide com as colocações que venho fazendo, desde o remoto ano de 2009 em que frequentava o almoço mensal da AAFBB, para compartilhar por alguns momentos da convivência com tantos colegas queridos, como Osni, Tavares, Douglas, Bassani, Betto, Teixeirinha, Bento, Larichia, Loreni e o Alberto de imorredoura lembrança.

A nossa coincidente colocação, todavia, não tem o mesmo embasamento. O senador atribui esse dilema ao fato de que o Governo estaria aplicando à sociedade brasileira uma política econômica divergente daquela que o Povo aceita ou quer. Eu já digo que o motivo é o fato de que estamos num regime democrático, e num regime democrático o Povo é autogovernado.

Com efeito, o senador Jucá em várias oportunidades dá a impressão de que formaria do Poder Legislativo conceito que ele certamente, excepcionalmente esclarecido como inegavelmente é, não tem, a saber, um grupo de pessoas que impõe ao Povo a conduta que lhe interessa:
“Ou a gente constrói uma agenda positiva para canalizar essa preocupação ou essa preocupação vai se manifestar espontaneamente em aumento de despesas para agradar a determinados setores como forma de tentar se salvar individualmente.”
“O governo está falando uma linguagem que a sociedade não está entendendo.”

Ele diz que a norma que aí está promovendo o reajuste não é a vontade do Povo, mas uma norma de determinada área do Governo que desagrada a outra área do Governo, isto é, nem consenso governamental é:
“(Dizia que) eu estava equivocado. Dizia que precisava fazer o ajuste para depois ir para essas etapas. Eu dizia que primeiro tinha de ir para essas etapas fazendo o ajuste. Podia ser junto.”

O senador esclarece o que ele acha que o Povo está querendo:
O primeiro sacrifício deveria ter sido do governo para dar o exemplo. Diminuir ministérios, consolidar empresas. Tinha de fundir empresas, acabar com estatais ineficazes e juntar agências reguladoras.”

Não acho, e muitas outras pessoas também, que a insatisfação do Povo Brasileiro se restrinja unicamente ao excessivo gasto do Setor Público, referido ao volume de recursos de que o Estado dispõe. Há muitas outras razões como, por exemplo, a corrupção, os conchavos políticos, a osmose do interesse político com o interesse privado, o apadrinhamento, o carreirismo político, a desigualdade política, a desigualdade entre os direitos dos recursos humanos do setor público e do setor privado, o aparelhamento do Estado.

E o senador tem certeza de que a Agenda Nacional, agora proposta, constitui o universo de matérias que o Povo Brasileiro quer discutir atualmente, para transformar em sua norma de conduta? Não. Ele não tem:
“Posso dizer que a prática para trás do governo mostra que ele errou, a prática para frente a gente precisa dar o benefício da dúvida, do bom senso, eu sou um otimista.”

Ora, em democracia, e Democracia de nossa Constituição, o Povo se governa, consoante o Preâmbulo (“Nós, representantes do povo brasileiro...”) e o parágrafo único do artigo 1º (“Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”) Entendo, pois, que os representantes do Povo  SÓ PODEM FORMATAR LEIS QUE ENTENDAM SER A VONTADE DO POVO.

E a Constituição Brasileira diz exatamente como se pode obter facilmente a expressão da vontade do Povo nesse parágrafo único do artigo 14, DIRETAMENTE: “Todo poder emana do povo, QUE O EXERCE por meio de seus representantes eleitos ou DIRETAMENTE...”). E no artigo 14, ela discrimina as três formas de expressão direta da vontade do Povo:

“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
 I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.”

Acho que essas formas “referendo e plebiscito” seriam muito apropriadas para ocasiões de graves insatisfações sociais e políticas, como a que ora estamos vivenciando. Elas diferem radicalmente de meras manifestações de opinião de determinadas pessoas e lideranças em audiências na Câmara e no Senado. Aquelas, plebiscito e referendo, são realmente democráticas, manifestação do Povo Li nos jornais que a Islândia, em 2009, numa situação de grave crise econômica, aprovou por referendo particular cada artigo de uma nova Constituição. Nos Estados Unidos, usa-se com frequência os institutos do referendo e do plebiscito. No começo deste ano, na Suíça o Povo, em referendo, recusou um salário mínimo proposto pelo Governo.

Aqui, no Brasil, os representantes do Povo só deram oportunidade à expressão direta da vontade do Povo, na opção da forma de governo (Presidencialismo/Parlamentarismo), um imperativo constitucional transitório, e na questão de armas, se não estou enganado. Essa evidente atitude governamental de obstruir o exercício do direito constitucional da manifestação direta da vontade popular permite nasça a especulação de que ela é temida, de que se queira obstá-la e, portanto, de que se estaria impedindo o autogoverno do Povo. A Democracia estaria sendo boicotada. Acho até que a nossa Constituição deveria ter sido aprovada por um referendo popular em 1988.

Na minha opinião, o Povo está querendo muito mais do que o ilustre senador Jucá está dizendo. O Povo está querendo total reformulação do Governo Brasileiro, que de fato ele se guie pelo caput do artigo 37 da Constituição: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Nova redação dada pela EC nº 19, de 1998)”.

O Brasil, na minha opinião, está ingressando na Idade da Informação. Nessa Idade tudo se sabe, tudo é transparente. Até os segredos de Estado vazam. A publicidade é um fato, não apenas um direito. Assim,
- se o Legislativo não fizer leis justas, de fato iguais para todos, o Povo acaba com o Legislativo;
- se o Executivo não obedecer a lei, o Povo acaba com o Executivo;
- se o Judiciário não prolatar sentenças legais, o Povo acaba com o Judiciário.

O Povo não aceita a política maquiavélica. O político precisa viver o que diz para o Povo. O político tem que ser a expressão do Povo. A política precisa ser transparente. O político precisa ser igual ao Povo. Frequentar o restaurante que o Povo frequenta. Vestir as roupas que o Povo veste. Usar o carro que o Povo usa. Morar na casa que o Povo mora. Usar o hospital que o Povo usa. Frequentar a escola que o Povo frequenta. O político não pode usar a política para escapar do tipo de vida que o Povo vive. O político não pode mais ser esperto. O político não é dono, feitor do Povo. O político é o criado do Povo. O político precisa ser igual ao ex-Presidente Mujica, do Uruguai.

Democracia é liberdade, igualdade política, transparência, verdade e convivência.

Estamos assistindo a uma síntese hegeliana: a Idade Moderna transformando-se em Idade da Informação. Que essa síntese se processe pacificamente.

 

 

 

3 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Dileto amigo Edgardo,

    Cumprimento-o por mais este brilhante artigo. E também por sua clarividência de notar o surgimento da "Idade da Informação". Bravo !!!!!

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  3. Estimadíssimo amigo Juarez

    Quanta saudade de você! Como faz falta o seu diálogo! A vida é convivência. A boa convivência é a vida feliz. É o que se tem e o que vale!
    Um abraço amigo do
    Edgardo

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