A
Constituição brasileira é precedida por um preâmbulo onde os constituintes
expuseram os valores sob cuja influência foram movidos a construírem o Estado
Brasileiro: liberdade, igualdade, fraternidade, segurança, bem-estar,
desenvolvimento e justiça.
Tais
são as qualidades de que a sociedade brasileira deve ser dotada. Estes são os
valores que devem guiar os governantes em todos os seus atos de governo e em
todas as leis que promulgarem. O Poder Legislativo deve guiar-se por esses
valores ao confeccionar as leis. O Poder Executivo deve seguir esses valores ao
governar a Nação. O Poder Judiciário deve orientar-se por esses valores ao
emitir suas sentenças.
Lá
estão os três valores que Rousseau incutiu no povo francês e motivou a
Revolução Francesa, que mudou o Mundo: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
Essa
liberdade da Revolução Francesa é a liberdade política, que Rousseau reivindicava
quando escreveu: “O homem nasceu livre e em todos os lugares está acorrentado.”
O homem tinha um senhor e obedecia às leis do seu senhor, o rei. Rousseau se
insurgia contra o Príncipe que Maquiavel identificara nos tronos da Europa,
duzentos anos antes, e perfilhava a ideia de Étienne De la Boétie, a de que o
homem nasce livre. Este, contemporâneo de Maquiavel, escreveu o livro, Discurso
da Servidão Voluntária, para contestá-lo: o homem nasce livre e o Príncipe é,
sob todos os aspectos, odiável.
Mas,
o que, de fato, entendia o povo e ainda hoje a maioria das pessoas entende por
liberdade? Há dicionários que explicam ser a condição de uma pessoa dispor de
si, o poder de fazer ou de deixar de fazer alguma coisa. Outros definem de
forma mais consentânea com o pensamento científico contemporâneo: a faculdade
de cada um poder agir segundo a própria determinação. A primeira definição
contém a ideia de que o indivíduo humano está ordinariamente numa situação de
indeterminação, de escolha, de opção, e, de repente, faz a opção, determina-se,
age. A segunda definição, concentra-se na determinação, o homem se acha sempre
determinado, mas a determinação não é feita por outro ser, é feita pelo próprio
indivíduo, brota do seu interior, da sua mente racional, que faz a opção. Esta
ideia teve sua origem em Sócrates.
Assim,
abre-se um livro de Psicologia, do estudo da mente e do comportamento de todos
os animais, e nada se lê sobre liberdade. Lê-se, é verdade, sobre comportamento
moral. E vê-se que ele é adquirido com o tempo, à medida que o cérebro se
desenvolve, a racionalidade se desenvolve e num processo de reação à cultura
ambiente da sociedade em que se vive. Daí, então, centrarem-se a Ética e o
Direito neste constructo cultural da liberdade, como a autonomia pessoal do ser
humano. Ser livre é exatamente isso, perceber-se que se existe, pensa, sente e
age fazendo o que quer fazer, o domínio consciente de si próprio, o
livre-arbítrio.
A
liberdade, como dado científico, fato comprovado pela Neurociência residiria
nos lobos frontais, que Rita Carter apelida de lar da consciência
(autoconhecimento, responsabilidade pessoal, intencionalidade e significado). A
Neurociência descreve casos de pessoas normais que, por motivo de acidente ou
doença, ficaram privadas dos lobos frontais, e por isso transformaram seus
comportamentos ajustados em comportamentos monstruosos, incapazes de
discernimento, “estrangeiros neste mundo sem o saber”. Roberto Lent, em seu precioso livro “Cem
Bilhões de Neurônios” evita chegar tão longe, embora não omita a existência da polêmica.
Assim,
vamos entender o que diz o desembargador José Renato Nalini, doutor e mestre em
Direito Constitucional pela USP, na 6ª.edição de seu livro “Ética Geral e Profissional”:
“Isso conduz às aporias da liberdade moral, examinadas por Hartman, que conclui
ser indemonstrável a liberdade da vontade. É uma questão metafísica,
insuscetível de ser demonstrada, ou de ser refutada. Só pode ser discutida. Em
favor da existência livre existe a consciência da autodeterminação... Mas existe
outro indício... a existência da responsabilidade.”
Infelizmente, a reponsabilidade também se perde por simples lesão dos lobos
frontais..., em virtude de acidente ou moléstia...
Resta,
portanto, que atualmente só podemos fundamentar as ordens moral e jurídica como
valores fundamentais de uma sociedade de alto nível de cultura e civilização.
A
racionalidade e a liberdade, a autodeterminação, são os fundamentos da Ética,
da Moral e do Direito, o constructo cultural mais importante de uma sociedade
civilizada, uma sociedade em que de fato vale a pena viver-se. A nossa tão valorizada
ordem política, a democracia, funda-se num valor fundamental da cultura e
civilização humanas, construções culturais contemporâneas, a liberdade individual,
a dignidade humana. A punição vai aos poucos cedendo lugar ao tratamento... E a
segregação permanente humanizada preferida à pena de morte para os enfermos
insanáveis...
Prezado Edgardo.
ResponderExcluirÉ bom ler e saborear os seus escritos, amalgamados com os pensares de tantos ilustres e seus ajuizamentos inteligentes. Como é complexo e misterioso o ser humano !
Grande abraço, em meio às passageiras alegrias do dia 20.
Estimado e inesquecível Diretor
ResponderExcluirComplexo, misterioso e criativo no propósito de se perpetuar!...Como se pode cogitar que, a esta altura do progresso social e político se possa organizar, em plena Era da Informação, uma sociedade que não seja do Bem-Estar Social? Previdência e Saúde, PREVI e CASSI!
Edgardo Amorim Rego