Venerável
sacerdote italiano, meu professor sábio e compreensivo, no solo vasto, límpido,
generoso e lindo da Serra de Baturité, no estado do Ceará, apreciava contar
histórias sobre um reino que existiu em alguma parte do Universo, o Reino de
Maquiavel, um reino regido sob o império da violência e da farsa.
A
Constituição fora redigida pelo próprio rei, mas o rei convencera a população
de que ela própria a elaborara, contendo, pois, a vontade soberana do Povo, uma
constituição democrática.
O
rei nela outorgou-se, com enorme, suntuoso e festivo aparato a missão de
Protetor do Povo. Ele se obrigava a elaborar todas as leis com a finalidade de
promover o bem-estar do Povo e a proferir todas as sentenças do Tribunal no
interesse do Povo. O principio fundamental do reino era o interesse do povo. A
meta da sociedade era que todos os cidadãos vivessem sem dor no corpo e sem
angústia na alma!
Tudo
isso o rei de Maquiavel estabeleceu no reino, na verdade, tão só para se livrar
da pressão interna do Povo e da pressão externa dos outros Estados que já se
haviam humanizado, civilizado, guiando-se pela ideia de que povo feliz, sem dor
no corpo e angústia na alma, é povo trabalhador, criativo, eficiente, progressista,
realizado e pacífico. A vida é uma festa e a Terra é um paraíso.
Certa
vez, em razão das muitas rapinagens que o rei Maquiavel e seus comparsas haviam
solertemente praticado, a situação do reino, uma das terras mais férteis e
ricas do Universo, havia chegado a tanta degradação que o reino não mais
possuía recursos para sustentar-se e era mantido às custas de empréstimos que
estavam na iminência de estancar, porque os credores já não mais confiavam na
capacidade de pagamento do reino.
O
rei Maquiavel, então, convocou o povo e lhes dirigiu eloquente discurso,
descrevendo a trágica e iminente ameaça da falência do reino, imputando a
situação aos grandes gastos com o programa do reino, “sem dor no corpo e sem
angústia na alma”, previdência social e saúde do povo, hospitais. Disse-lhes que ia substituir a previdência por
poupança de reponsabilidade pessoal, que era uma coisa maravilhosa, dava até
para o indivíduo passear no estrangeiro durante uma aposentadoria que se
estenderia por décadas. Já a saúde, ele a confiaria, com todos os recursos
necessários, fornecidos em valor paritário entre ele e o povo, à exclusiva supereficiente
administração do povo, tão integralmente, que doravante cessaria toda a sua
contribuição financeira para o fundo de saúde.
Esse
discurso do rei Maquiavel passava ao largo, tentando ocultá-lo ao Povo, do fato de que ele permitira solertemente que
no reino somente seis cidadãos detivessem riqueza equivalente à de outros cem milhões
de cidadãos... Ele pretendia resolver o problema do reino com a fome e a morte de
cem milhões de pessoas, e a proteção do patrimônio
integral dos seus seis amigos íntimos.
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