sábado, 27 de abril de 2013

252. Histórico Instrutivo

A Lei 6435/77 é um histórico documento. Precedeu, é óbvio, à proclamação da Constituição Brasileira de 1988 e aos Governos neoliberais de Margareth Tchatcher na Inglaterra e de Ronald Reagan nos Estados Unidos, princípio político do recente movimento neoliberal e globalizador da economia mundial.
Ela possui linhagem. Foi inspirada nos ideais do Estado do Bem Estar Social, que nasceu no século XIX com Bismarck. O Estado do Bem Estar Social desenvolveu-se com as medidas sociais do Estado Inglês no início do século XX, a criação da OIT, a irrupção de Estados Socialistas, as teorias econômicas de John Maynard Keynes e as políticas do New Deal de Franklin Delano Roosevelt. Por fim, consolidou-se com os estudos de William Beveridge na década de 40 do século passado, quando estes se transformaram, no governo do Primeiro Ministro britânico, Clement Attlee, em diretrizes políticas do Estado de Bem Estar Social.

A Constituição Brasileira de 1988 estrutura a organização da sociedade brasileira exatamente nos moldes de um Estado do Bem Estar Social. Sociedade de cidadãos livres, iguais, dignos, operosos, empreendedores e solidários. Compreende-se, por isso, a vibração e o orgulho do Presidente da Assembleia Constituinte, o deputado Ulysses Guimarães, naquele dia 5 de outubro de 1988, de pé, em frente a todos os constituintes e, pela televisão, frente a todos os brasileiros, braço direito erguido e vibrante, empunhando o opúsculo da Nova Constituição, proclamando com orgulho a Nova Constituição Brasileira, a “Constituição Cidadã”!

Em razão disso, a Lei 6435/77 continuou em vigor. Ela nada mais consubstanciava que a longa tradição da sociedade brasileira, solidária e do bem estar social, que, li, se iniciara com Braz Cuba, quando criou uma Caixa Montepio na cidade de Santos, no princípio da colonização do território nacional.

Essa lei compunha-se de cinco capítulos. Os dois mais importantes capítulos eram o segundo, “Das Entidades Abertas”, e o terceiro, “Das Entidades Fechadas”. Admitia Entidade ABERTA de Previdência com fins lucrativos e SEM FINS LUCRATIVOS. Já a LC 109/01 só admite Entidade Aberta na forma de sociedade anônima. Toda Entidade Aberta, pois, atualmente é empresa, isto é, tem fins lucrativos. Por outro lado, a LC 109/01 repete a exigência de que toda Entidade Fechada seja pessoa jurídica sem fins lucrativos.

Já vimos, em texto anterior, que o artigo 46 da Lei 6435/77 mandava que o excesso de reservas de uma EFPC, acima do nível da Reserva de Contingência, fosse gasto no reajuste dos benefícios, isto é, aumento dos benefícios. Ela mandava, portanto, que o que a LC 109/01 denomina RESERVA ESPECIAL fosse gasto no pagamento de benefícios previdenciários aumentados. Já vimos que a LC 109 não replica esse mandamento da Lei 6435/77, porque ele já está contido no seu artigo 19 e no próprio nome RESERVA ESPECIAL que ela apõe àquela sobra no artigo 20.

Já vimos, também, no texto anterior, que o legislador da LC 109/01 sabia exatamente que são AS DESPESAS COM PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS CONTRATADOS QUE REEQUILIBRAM UM PLANO DE BENEFÍCIOS DESEQUILIBRADO POR EXCESSO DE RESERVAS, quando se reduz ou se suspende o pagamento de Contribuições do Patrocinador e do Participante. A RESERVA ESPECIAL pode desaparecer somente com o pagamento de benefícios rotineiros, feitos com recursos da Reserva Matemática.  Essa redução ou suspensão nada mais faz que EVITAR O AGRAVAMENTO DO EXCESSO DE RESERVA. Evita o aumento de excesso. Facilita o reequilíbrio.

Pois bem. Essa Lei 6435/77 encarava com tal respeito essa destinação das RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS que, até o excesso de reserva nos Planos de Benefícios das Entidades ABERTAS sem fins lucrativos, ela mandava que fosse gasto no pagamento de benefícios assistenciais e culturais aos participantes:

“Art. 23 - Nas entidades abertas sem fins lucrativos, o resultado do exercício, satisfeitas todas as exigências legais e regulamentares no que se refere aos benefícios, será destinado à constituição de uma reserva de contingência de benefícios e, SE AINDA HOUVER SOBRA, A PROGRAMAS CULTURAIS E DE ASSISTÊNCIAS AOS PARTICIPANTES, aprovados pelo órgão normativo do Sistema Nacional de Seguros Privados.” Nada para o Patrocinador.

Ainda naquele ano de l977, a Lei 6462/77 proibiu “a concessão de benefícios sob a FORMA DE RENDA VITALÍCIA...”, superior ao valor do salário de referência com pequeno reajuste para mais.

Tão sagrada era essa destinação única (os Participantes) dos gastos de reservas previdenciárias, tão sério era aquele compromisso (sem fins lucrativos) das EFPC que a segunda alteração na Lei 6435/77, promovida já pelo Presidente Fernando Collor, governo declaradamente neoliberal, através da Lei 8020/90, apenas ordenava que a SOBRA DE RESERVA, isto é, o excesso sobre a Reserva de Contingência, fosse eliminada mediante a simples redução das Contribuições do Patrocinador e Participante, respeitado o Princípio de Proporção Contributiva, em se tratando de EFPC ligada a entidade estatal. Aquele Governo Neoliberal tinha o claro entendimento de que:

- a redução de Contribuições é benefício, sim, mas não é benefício previdenciário; pode até ser considerado malefício previdenciário;

- reserva previdenciária, até mesmo sobra de reserva previdenciária, tem destinação, digamos, sagrada, a saber, os Participantes;

- quando se reduz ou se suspende a Contribuição, gasta-se Reserva Matemática nos pagamentos contratados de benefícios previdenciários, fazendo-se baixar o nível de reservas ao da Reserva de  Contingência e, assim, desaparece a SOBRA, a ATUAL RESERVA ESPECIAL;

- que aquela caracterização “SEM FINS LUCRATIVOS” é algo muito sério, a saber, a EFPC não existe para enriquecer os Participantes nem, muito menos, o Patrocinador.

O artigo 18 da LC 109/01 existe exatamente para isso, para evitar AS SOBRAS EXCESSIVAS:

 “Art. 18. O plano de custeio, COM PERIODICIDADE MÍNIMA ANUAL, estabelecerá O NÍVEL DE CONTRIBUIÇÃO necessário à constituição das reservas garantidoras de benefícios, fundos, provisões e à cobertura das demais despesas, em conformidade com os critérios fixados pelo órgão regulador e fiscalizador.”

Explico exatamente o que, na minha opinião, toda essa legislação entende por superávit, sobra, excesso de reserva previdenciária, RESERVA ESPECIAL. No fim do exercício, o atuário apresenta o valor da Reserva Matemática. Esse valor representa, em valor atual, todo o custo de todos os pagamentos de benefícios contratados de um Plano de Benefícios, até o pagamento do último compromisso. Esse cálculo atuarial leva em consideração as condições de aplicação em um mercado de dinheiro normal. Hoje, conclusão atuarial, o Plano de Benefícios tem recursos para pagar todos os compromissos previdenciários, sem necessitar nem mesmo das contribuições futuras de Participantes e Patrocinador.

Pois bem. Acrescente-se a esse valor, para efeito de garantia, mais 25% desse valor, a Reserva de Contingência. Ainda há reserva sobrando? Esse valor é a Reserva Especial. O Plano de Benefícios não precisa desse valor. O que fazer com ele?

A Lei 6435/77 mandava recalcule-se o valor dos benefícios. A Lei 6462/77 mandava gaste-se em pagamento de benefício temporário. A Lei 8020/90 mandava reduzam-se as Contribuições de ambos, Participantes e Patrocinador, respeitando-se o Princípio de Proporção Contributiva. Já a Lei 109/01 manda: Reserva Especial para revisão do Plano de Benefícios. Isto é, refaçam-se todos os cálculos atuariais. Realmente há sobra? Paguem-se benefícios ou transitórios ou os contratados com valor refeito, se o valor da Reserva Especial o permitir.

Mas, então, por que existe a condicionante do §3º do artigo 20: “Se a revisão do plano de benefícios implicar redução de contribuições, deverá ser levada em consideração a proporção existente entre as contribuições dos patrocinadores e dos participantes, inclusive dos assistidos.”?

Porque o ambiente econômico, financeiro e político pode ser tal que não garanta a autossuficiência das Reservas Monetárias, acrescidas da Reserva de Contingência. É, então, que a RESERVA ESPECIAL desaparece com o simples gasto das Reservas Matemáticas nos pagamentos dos benefícios rotineiros contratados. Assim, o mandamento da Lei 8020/90 só se aplica em situações críticas do mercado de dinheiro. Ela é insuficiente para solucionar todos os casos de desequilíbrio de um Plano de Benefícios por excesso de reservas previdenciárias, como imaginava a Lei 8020/90.

Permito-me encerrar com uma observação. Leio no opúsculo “Da Caixa Montepio à PREVI”, publicado no ano de 2004, sob o patrocínio de diversas empresas, com evidente intuito de comemorar o centenário da PREVI, e com o apoio e contribuição também evidentes da PREVI, que esta sofreu intervenção em dezembro de 2000, com base nos artigos 51 e 54 da Lei 6435/77, “para adotar as medidas necessárias à implementação do instituto da paridade.”

Curioso que esse enquadramento à norma da paridade consistiu na repartição do excesso de reserva previdenciária entre Participantes e Patrocinador, em lugar de dar cumprimento ao que então ordenava a Lei 8020/90, na redução ou suspensão das Contribuições.

Creio que o interventor pensou que estava cumprindo fielmente a Lei 8020/90. Na minha opinião, a devolução de recursos ao Patrocinador constituiu um benefício não previdenciário, porque pago a pessoa jurídica, despindo-se da feição protetiva alimentar. Tratou-se de um benefício econômico, financeiro, lucrativo, de cunho capitalista. Nada previdenciário, mesmo que tenha sido destinado para pagamento de obrigações previdenciárias outras do Patrocinador, porquanto assumidas antes e na qualidade de Empregador.

Outra observação: até o ano 2008, as modificações na Previdência Complementar se processaram mediante leis. Em 2008, utilizou-se uma resolução, a Resolução CGPC 26/08 criou o instituto da Reversão de Valores.

Os doutos sabe-lo-ão explicar melhor que eu.
 
 
 
 
 
 
 

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