terça-feira, 23 de abril de 2013

251. Novo Argumento

As EPC (Entidades da Previdência Complementar) não começaram com a Lei Complementar 109, publicada no ano de 2001. Elas começaram no ano de 1977, quando o Presidente Ernesto Geisel promulgou a Lei 6435.

Essa lei continha um artigo explícito, que visava exatamente a isso, a saber, impedir qualquer tentativa de desvirtuamento no tocante ao emprego dos recursos das reservas previdenciárias, perversão que o instituto da Reversão de Valores, inovação da Resolução CGPC 26, perpetra.

O artigo 46 da Lei 6435 prescrevia: “Nas entidades fechadas o resultado do exercício, satisfeitas todas as exigências legais e regulamentares no que se refere aos benefícios, será destinado: à constituição de uma reserva de contingência de benefícios até 25% (vinte e cinco por cento) do valor da reserva matemática; E, HAVENDO SOBRA, AO REAJUSTAMENTO DE BENEFÍCIOS ACIMA DOS VALORES ESTIPULADOS NOS §§1º E 2º DO ARTIGO 42, liberando, se for o caso, parcial ou totalmente as patrocinadoras do compromisso previsto no §3º do mesmo artigo.”

Olha aí, diria alguém, o legislador, eliminando da LC 109/2001 esse final do artigo 46 da Lei 6435, confirma a revelação do texto da ANAPAR, de que, lá pelos idos do ano de 2008, em entrevista concedida a representantes sindicais dos Participantes de EFPC, o então Ministro da Previdência Social, hoje Senador, Dr. José Barroso Pimentel, afirmara que, como membro do legislativo, participara dos debates da formulação da LC 109/2001 e, por isso, estava consciente de que o Legislador tinha a intenção de contemplar nessa Lei o instituto da Reversão de Valores. E ter-se-ia encerrado, destarte, o diálogo.

Não é bem assim, apressado e irrefletido leitor. A Lei 6435 trata desse assunto reservas em três passagens anteriores ao citado artigo 46. Nos artigos 42 e 43, a Lei contempla reservas, sem qualquer qualificativo. Já no artigo 40, ela se refere a “reservas técnicas”. Segundo Maria Helena Diniz, “reserva técnica é a reserva constituída com parte das rendas auferidas ou dos prêmios recebidos pelas sociedades de seguros terrestres e marítimos para garantia da execução das responsabilidades assumidas por elas, abrangendo os riscos não expirados e os sinistros não liquidados... É, portanto, o fundo constituído pela seguradora para garantir suas operações.”

Já vimos, em outro texto, que o Regime Básico da Previdência Social considera a Previdência Social como uma espécie de seguro. Estamos constatando que o Regime de Previdência Complementar também forma dela o mesmo conceito. Só aí, no supramencionado artigo 46, aparece essa referência à reserva matemática. Está claro que a reserva matemática é exatamente a reserva técnica do Direito Civil, definida pela Professora Maria Helena Diniz. Penso que ninguém se oporá a que se entenda também, como reserva técnica, aquela que o artigo 46 apelida de RESERVA DE CONTINGÊNCIA DE BENEFÍCIOS, já que se ajusta também ao conceito formulado pela Professora.

O que é, então, aquela eventual SOBRA, de que trata o final do artigo 46? É sobra de quê? A Lei 6435 a desvinculava dos benefícios? Não. Então, em primeiro lugar, aquela sobra, não é uma sobra qualquer, porque é excesso de reservas técnicas, mas reserva sobrando, tal qual contemplam os artigos 42 e 43. Em segundo lugar, o próprio artigo 46 confirma que é sobra de reserva, quando manda que seja gasta no pagamento de benefícios, previdenciários, é claro.

E qual é o nome que a essa sobra empresta a LC 109/2001? Reserva Especial. Como se gasta a Reserva Especial, segundo a LC 109? “Para revisão do plano de benefícios”.

O que pode significar “revisão do plano de benefícios”? Devolver a Contribuição para os Contribuintes, isto é, Reversão de Contribuição, apelido que é disfarçado neste menos agressivo, a saber, Reversão de Valores, isto é, devolver as contribuições aos Contribuintes, o Patrocinador e o Participante? Há algo mais mirabolante?! Excesso de reserva previdenciária ser gasta em pagamento de vantagem, benefício não previdenciário, a Participante, e até a Patrocinador, que nada tem a ver com recebimento de recursos previdenciários e, por LEI, só tem a obrigação de pagar contribuição e fiscalizar se os recursos previdenciários estão bem administrados e bem aplicados na sua finalidade?! Será que a Lei 6435 nos oferece alguma pista?

Dá, sim. A pista está exatamente naqueles dois parágrafos citados, 1º e 2º do artigo 42. Faça-se a correção dos benefícios, acima dos critérios usuais de correção, que são: a ORTN (§1º), ou, §2º, variação coletiva de salários, outro índice aprovado pelo Ministério da Previdência e Assistência Social. E então? Então, caro leitor, revisão do Plano de Benefícios SIGNIFICA REVER AS NORMAS QUE ORDENAM O PLANO DE BENEFÍCIOS, adequar o pagamento de benefícios às reservas previdenciárias, AUMENTAR O VALOR DOS BENEFÍCIOS PREVIDDENCIÁRIOS. NUNCA PODERÁ SIGNIFICAR CRIAR NOVA ESTRUTURA, NOVO INSTITUTO, INTRODUZIR INSTITUTO INEXISTENTE NA LEI!

Mas, ainda não se desfez totalmente aquela dúvida inicial: não teria a LC 109/2001 omitido propositadamente aquele final do artigo 46 da Lei 6435 exatamente para isso: para que se fizesse viável a Reversão de Valores?

E eu a desfaço com três indagações:
Por que, então, ela não introduziu claramente a Reversão de Valores, da forma que, antes, claramente a Lei 6435 a vetava?
Por que todo o texto da LC 109 a repele?
Por que os artigos 19 e 20 foram redigidos de tal forma que tornam inviável a introdução do instituto da Reversão de Valores?

Explicitemos este último argumento. O artigo 19 reza: “As contribuições (norma e extraordinária), destinadas à constituição de reservas, terão como finalidade prover o pagamento de benefícios de caráter previdenciário, observadas as especificidades previstas nesta Lei Complementar.” Tenho certeza de que o leitor acata estas minhas expressões como equivalente a:

As contribuições, que ingressam no Plano de Benefícios como reservas, só podem ser gastas no pagamento de benefícios previdenciários. Reservas Previdenciárias só podem ser gastas no pagamento de benefícios previdenciários.

Eis aí, é exatamente o que mandava a Lei 6435: todas as reservas (as reservas técnicas – matemática e de contingência – e a sobra de reserva (que também não deixa de ser reserva, por ser sobra) só podem ser gastas no pagamento de benefícios previdenciários.

Ora, é exatamente isso que confirma o artigo 20 da LC 109/2001: existem três tipos de reserva, a saber, as reservas matemáticas, a reserva de contingência e a reserva especial. As duas primeiras são reservas técnicas, a última é sobra de reserva previdenciária, isto é, destinada para imediato uso em pagamento de benefícios previdenciários, porque é igualmente reserva previdenciária, isto é, reserva de um Plano de Benefícios, que o artigo 19 manda gastar no pagamento de benefícios previdenciários.

O mandamento da LC 109/2001 é o mesmo da Lei 6435. Não se alterou. O  mandamento explícito -  E, HAVENDO SOBRA, AO REAJUSTAMENTO DE BENEFÍCIOS ACIMA DOS VALORES ESTIPULADOS NOS §§1º E 2º DO ARTIGO 42 – foi eliminado, porque ele era desnecessário. Seria redundância, ante os expressos termos do artigo 19.

 

2 comentários:

  1. Mestre Edgardo, na forma usual, consegue trazer maior clareza à esse tema de grande interesse relativo às EPCs. A evidencia de que a LC 109/2001 foi calcada na Lei 6435/77 faz cair por terra a assertiva do Sr. Pimentel de que outra teria sido a intenção do legislador. Quanto mais o colega Edgardo se aprofunda no exame da matéria, mais aflora a distinção entre os propósitos, deveres e direitos do trinômio por ele tão bem suscitado: EFPC, Patrocinador e Participantes. Ficou evidenciado historicamente que somente os Participantes Assistidos é que são os beneficiários do fundo. Não consigo ter visão diferente.

    Luz Faraco - Florianópolis-SC

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  2. Faraco amigo.
    É assim também que entendo. Tenho mais coisas para expor a respeito da relação processual entre Lai 6435 e LC 109. Lembre-se é o Enclave Neoliberal... com contribuição de personalidades que se dizem trabalhistas e até socialistas... Não dá para entender... ou dá?
    Edgardo Amorim Rego

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