Este
texto, portanto, nada mais pretende ser que a revelação dos inarredáveis
pensamentos que me assaltam a mente, quando ela é atingida pelas notícias que
me estão chegando a respeito dessa audiência.
Entendi
aquele evento inicialmente como meramente restrito ao assunto do PDS 275 de
autoria de sua Excª, o Senador Paulo Bauer. Parece-me agora que a reunião alcançará o
amplíssimo espectro de debate sobre um projeto de lei para o regime da
Previdência Privada Complementar, incluindo, pois, é claro, o instituto de
Reversão de Valores, valorizado com a atuação de dois atores exponenciais, o
Advogado Geral da União e o Senador José Barroso Pimentel, ex-Ministro da
Previdência Social e principal responsável pelo instituto da Reversão de
Valores, que, parece, vem retardando a decisão sobre o PDS 275 do Senador Paulo
Bauer nas comissões do Senado,
coadjuvados pelo Dr. José Maria Rabelo, Diretor Superintendente da PREVIC.
Entendo
que a ampliação da matéria de debate já constitui a primeira cilada aos nossos
interesses nessa reunião, porque dilui, enfraquece, obscurece e poderá até
omitir a discussão da matéria que a originou, a saber, o próprio instituto da
Reversão de Valores. Seria, assim, talvez mesmo, a primeira derrota
estratégica. O adiamento da audiência, de início deste mês de maio para o
princípio de junho próximo, mês da Copa do Mundo de Futebol (já no dia dois de
junho começam a chegar ao Brasil os primeiros protagonistas deste espetáculo,
os juízes das competições, que empolga ampla parcela da população brasileira,
e, por isso, ocupa, por vários motivos, os interesses dos atores políticos),
mês em que parece terão início mais duas badaladas Comissões Parlamentares de
Inquérito e em que ocorrerão várias convenções de partidos políticos para
homologar os candidatos à Presidência da República, cuja eleição terá lugar em
outubro próximo, coloca-me em atitude de expectativa. Estou com o
pressentimento de que essa reunião de nosso interesse será mais uma vez adiada.
Seria a segunda derrota estratégica... Oxalá esteja equivocado...
A
presença do Advogado Geral da União será, se de fato ocorrer, momento extraordinário
para debate leal e decisivo para o reconhecimento da ilegalidade do instituto
da Reversão se Valores. Essa presença significaria que, de fato, os autores e
os interessados nesse instituto estão sentindo profundamente ruir as bases
racionais de sua convicção na legalidade desse instituto, ante a profusão de
contundente argumentação demonstrativa de sua ilegalidade. É fortíssimo bastião
protetor do instituto da Reversão de Valores que precisa ser conquistado.
Penso
que a estratégia de nossos representantes consistirá em prever, entender
profundamente e dominar com maestria a demonstração da improcedência dos
argumentos com que os autores do instituto da Reversão de Valores utilizam para
justificar a sua legalidade.
Eles
costumam alegar que o texto da Lei Básica da Previdência Complementar, a LC
109/01 é obscuro e omisso nesse assunto de excesso de reserva previdenciária.
Por isso, a interpretação corriqueira, normal, usual, habitual de uma lei, que
é a SIMPLES LEITURA DE SEU TEXTO, é insuficiente para decidir o sentido daquela
norma expressa do §1º do artigo 20: “Reserva Especial para revisão do Plano de
Benefícios”. A intelecção óbvia da Lei precisa, então, ser complementada por
interpretação extensiva, usando os princípios da hermenêutica jurídica.
Esta
argumentação dos autores do instituto da Reversão de Valores pode ser
vigorosamente rechaçada. A LC 109/01 é claríssima e completa no que tange ao
destino das reservas e das contribuições, e TANTO que reservou para isso um
artigo, o 19, e com expressões tão evidentes, que NÃO ADMITEM A MÍNIMA DÚVIDA:
“As CONTRIBUIÇÕES destinadas à constituição de RESERVAS TERÃO COMO FINALIDADE
PROVER O PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS DE CARÁTER PREVIDENCIÁRIO, OBSERVADAS AS
ESPECIFICIDADES NESTA LEI COMPLEMENTAR.”
O
que está aí dito? Contribuições, reservas, SOMENTE se gastam no pagamento de
benefícios previdenciários (aposentadoria e pensão). E mais, das formas como
ESTA LEI MANDA, e SOMENTE DESSAS FORMAS.
Quais
são essas formas? O artigo 20 as enumera:
Reservas
Matemáticas, pagando os benefícios contratados usuais; Reserva de Contingência
(se houver), pagando benefícios contratados usuais, caso as Reservas
Matemáticas, hajam se desfalcado; Reserva Especial, distribuindo benefícios
acima dos benefícios previdenciários contratados.
O
título “Reserva Especial para revisão do plano de benefícios”, é evidente, não
revoga o preceito contido no artigo 19. Por que? Porque isso em nenhuma parte
do artigo está dito, nem da lei. Porque a Lei, ao contrário, insiste em
chama-la de reserva. Porque todos os leitores entendem muito bem o que a
expressão está dizendo, a saber, gaste-se essa reserva no pagamento de
benefício previdenciário, mas, previamente se faça uma revisão dos parâmetros
financeiros e atuariais do plano de benefícios, para que se saiba exatamente o
valor do benefício previdenciário a pagar, como aliás se acha limpidamente
expresso no artigo 18 da LC 109/01.
Mas,
o artigo diz que também se pode equilibrar o Plano de Benefícios,
desequilibrado por excesso de reservas, mediante a flexibilização, para menos,
da Contribuição e contribuição não é benefício previdenciário. TENHO CERTEZA de
que o Advogado Geral da União não usará essa contra argumentação, porque ela é
simplesmente ridícula. Só apela para esse argumento quem não entende o mecanismo
do reequilíbrio de um Plano de Benefícios, desequilibrado por excesso de
reservas. Em primeiro lugar, diminuir contribuição ou suspendê-la não é, de
fato, benefício previdenciário. É benefício patrimonial do Contribuinte,
Patrocinador ou Participante. É até malefício previdenciário! Em segundo lugar,
o efeito de diminuir ou suspender a Contribuição é impedir que ela aumente o
excesso de Reserva ou anule total ou parcialmente o EFEITO DO GASTO DAS
RESERVAS MATEMÁTICAS COM O PAGAMENTO USUAL DOS BENEFÍCIOS CONTRATADOS, a saber,
BAIXAR O NÍVEL DAS RESERVAS. O que, de fato, baixa o nível das reservas é o
gasto com o pagamento de benefícios previdenciários, não é diminuir o valor da
Contribuição.
Reforce-se
toda essa argumentação com dois esclarecimentos. A Lei 6435/77, a que criou o
regime da Previdência Privada Complementar, mandava que as SOBRAS de recursos
fossem distribuídas exclusivamente entre
os participantes na forma de benefícios. E aquela ADI, solicitada pela FAAB,
acrescentava que, no documento justificativo da proposição dessa Lei, o Poder
Executivo proponente fez questão de esclarecer categoricamente que todos os
recursos das EFPC se destinavam a proporcionar o benefício do bem estar dos
Participantes. É óbvio que tais esclarecimentos se tornaram desnecessários na
LC 109/01 ante o contundente e indiscutível significado único do mandamento de
seu artigo 19: contribuições, reservas, gastam-se unicamente no pagamento de
benefícios previdenciários.
Outro
argumento muito usado pelos autores do instituto da Reversão de Valores é o do
benefício contratado. O Plano de Benefício é um contrato. O contrato tem como
princípio básico o equilíbrio entre reservas e benefícios contratados. Logo, os
participantes somente têm direito aos valores de contribuições e reservas que
forem absolutamente necessárias ao pagamento dos benefícios contratados.
Em
primeiríssimo lugar, o contrato previdenciário complementar é inserido no
REGIME de Previdência Privada Complementar pela CONSTITUIÇÃO (artigo 202) e
pela LC 109/01. O que isso significa? Que o contrato entre as partes não é
absolutamente livre. Ele tem que se submeter às normas da Lei Complementar
109/01, e, nos casos das EFPC ligadas a entidades governamentais, também às da
LC 108/01.
Ora,
a LC 109/01, como vimos, em seus artigos 19 e 20 NÃO COMPORTA ABSOLUTAMENTE
ESSA INTERPRETAÇÃO. Mais, a LC 109/01 em parte alguma diz que esse limite
contratado não pode ser alterado. Ao contrário, ela, no seu artigo 20, diz
claramente que pode e DEVE SER ALTERADO, e a LC 108/01, em vários artigos, diz
claramente que pode e, em determinados casos, esse valor contratado DEVE SER
ALTERADO. O único parâmetro admitido pela LC 109/01 para o contrato
previdenciário é o do elástico nível de vida do Participante na época da vida
ativa, quando ele compra o direito de aposentadoria e pensão, que por isso se
baseia numa elástica correlação com seu “salário de referência” sobre o qual
incide sua contribuição. Aliás, isso nem merece ser discutido, pois está
reconhecido pelos próprios termos da Resolução CGPC 26/08: o limite contratado
é aquele valor do benefício previdenciário que se compra, quando na vida ativa,
e que as reservas previdenciárias permitem prover. Não se esqueça, todavia, que
o contrato previdenciário, em razão do artigo 19 da LC 109/01, não pode incluir
o benefício da Reversão de Valores, porque ele NÃO É BENFÍCIO PREVIDENCIÁRIO,
TANTO QUE ELE SÓ FOI CRIADO PELA RESOLUÇÃO GCPC 26 PARA BENEFECIAR O
PATROCINADOR, que não pode receber aposentadoria nem pensão, porque é pessoa
jurídica, não é pessoa física, isto é, o Patrocinador não nasce, não se
desenvolve, não vive, não adoece, não envelhece nem morre...
Outra
forma de apresentar-se esse argumento é aquele em que se afirma que “todo valor
excedente ao valor das Reservas Matemáticas” está contratualmente desvinculado
do pagamento de benefícios previdenciários. É claro que essa interpretação
afronta o óbvio mandamento dos artigos 19 e 20 da LC 109/01, já que elas não
consideram o excedente às Reservas Matemáticas como mero excesso de dinheiro,
de recursos financeiros, mas como EXCESSO DE RESERVAS, isto é, contribuições
separadas para serem gastas no pagamento de benefícios previdenciários.
Outro
argumento constantemente utilizado pelos autores do instituto da Reversão de
Valores, e este tem tremendo impacto sobre os ouvintes e leitores, sem
familiaridade com os princípios do Direito Previdenciário, e até sobre Juízes,
é o ancorado no Princípio da Isonomia ou Equidade, que aqui assume a forma de
Princípio da Proporcionalidade Contributiva. Ele se resume na seguinte fórmula:
já que Patrocinador e Participante contribuem para a formação das reservas, e o
artigo 20 da LC 109/01 manda que se reequilibre o Plano de Benefícios,
desequilibrado por excesso de reservas, mediante a flexibilização da
contribuição para menos tanto do Patrocinador quanto do Participante, na
proporção dos valores de suas respectivas contribuições, então a lei é omissa
no tocante ao modo de fazer-se esse reequilíbrio através de diversas formas do
aumento dos gastos, que deve incluir o instituto de Reversão de Valores,
respeitado o Princípio da Proporção Contributiva de ambos, para Patrocinador e
Participante.
A
perversidade desta argumentação assombra, porque ela não somente afronta o
exato teor do artigo 20, e seus parágrafos, da LC 109/01, como vários outros
dessa Lei Básica, e tantos, que se pode afirmar que ela atenta contra a própria
Lei Complementar!
Já
vimos que o artigo 19 com o séquito dos artigos 20 e 21 formam um corpo
completo de normas para o gasto das CONTRIBUIÇÕES RESERVADAS para o pagamento
de BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS: as reservas só podem ser gastas no pagamento de
benefícios previdenciários. Está tudo dito, não precisa dizer mais nada. Não há
lacuna na LC 109/01 a respeito do modo como se gastam as CONTRIBUIÇÕES
RESERVADAS! Nela só existe o SILÊNCIO. E os mestres do Direito sabem que, há
séculos, ou MILÊNIOS, os jurisconsultos criaram famoso aforismo: ubi lex voluit
dixit, ubi lex noluit tacuit. Isto é, a lei disse sobre as contribuições,
porque ali era que ela queria aplicar o Princípio da Proporção Contributiva, e
calou no tocante aos gastos das reservas previdenciárias, porque ali ela não o queria
aplicar, NEM PODIA.
E
como se sabe que foi silêncio, não foi omissão?
Porque
a LC 109/01 já havia dito tudo que podia dizer no tocante às despesas com
gastos de reservas no artigo 19: contribuições reservadas (RESERVAS) SÓ SE
GASTAM NO PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS.
Porque
os artigos 7º, 9º, 11º, 14, 15, 19, 20 e 21 apresentam redação, que pressupõem
que esse Princípio da Proporção Contributiva deve ser aplicado onde pode ser
aplicado, quando se trata de gastos das RESERVAS com o Pagamento dos Benefícios
Previdenciários aos PARTICIPANTES ASSISTIDOS (ou beneficiários).
Porque
o §1º do artigo 21 da LC 109/01 manda claramente aplicar o Princípio da
Proporção Contributiva na redução de DIREITOS PREVIDENCIÁRIOS DE PARTICIPANTES
para reequilibrar Plano de Benefícios Previdenciários, desequilibrado por
déficit de reservas previdenciárias.
Porque
essa aplicação destrói a própria arquitetura previdenciária construída pela LC
109/01, o âmago dessa Lei, aquilo para o qual ela mesma foi concebida, a saber,
blindar Empregador e Estado da obrigação de pagar benefícios previdenciários
complementares. O Estado criou para isso a EPC, entidade de previdência
complementar, isto é, a ÚNICA entidade que pode arcar com a obrigação de pagar
benefício previdenciário complementar no Brasil. E criou dois tipos de EPC, a
EAPC (Entidade Aberta de Previdência Complementar) e a EFPC (Entidade Fechada
de Previdência Complementar). Esta a EFPC é o INSS da previdência complementar.
Ela foi criada única e exclusivamente para isso para colher contribuição para a
formação das RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS, administrar financeiramente essas
reservas e GASTÁ-LAS NO PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS COMPLEMENTARES.
ELA FOI CRIADA PARA ALIJAR O ESTADO E O EMPREGADOR DA RELAÇÃO PREVIDENCIÁRIA.
Isso é indiscutível. Isso é reconhecido pelos Tribunais e alegado pela PREVIC
(Estado) e por Patrocinador (Empregador) nos tribunais.
Com
efeito, o Empregador contrata com a EFPC um Plano de Benefícios Previdenciários
(enquadrado, é claro, no REGIME da Previdência Complementar). E em que consiste
esse contrato? O Empregador tem a obrigação de contribuir para a formação das
reservas previdenciárias e o direito de fiscalizar a EFPC, já a EFPC tem o
direito de recolher a contribuição do Patrocinador (Empregador) e a obrigação
de gerir as reservas previdenciárias tão bem que nunca faltem reservas para
pagar os benefícios previdenciários que ela contratar com os empregados do
Patrocinador. A ESSÊNCIA DO PATROCÍNIO CONSISTE NISSO: PAGAR CONTRIBUIÇÃO. Mais
nada. SUA ESSÊNCIA É OBRIGACIONAL e OBRIGAÇÃO COM RELAÇÃO À EFPC, SOMENTE PARA
COM A EFPC. O contrato de Patrocínio é entre EFPC E EMPREGADOR (não entra nele
o Participante).
O
Contrato de Participação, esse sim, é o ÂMAGO DA RELAÇÃO PREVIDENCIÁRIA, a
saber, PAGAR E RECEBER BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS é firmado entre EFPC e
EMPREGADO (Participante). Nesse contrato de adesão, o Empregado compromete-se a
pagar Contribuição e adquire o direito de na época estabelecida por lei passar
a perceber o benefício previdenciário (aposentadoria ou pensão), isto é, prestações
mensais de natureza alimentar, de subsistência, complementar. Durante a vida
ativa, o empregado compra a sua subsistência complementar futura, do tempo da
inatividade, da incapacidade laboral. E esse contrato é entre EFPC e Empregado
(Participante). O Participante tem a obrigação de pagar a contribuição para
formar as reservas previdenciárias e tem o direito de em época futura, quando
ocorrer a sua inatividade legal, passar a perceber o benefício previdenciário.
Nessa relação não entra o PATROCINADOR, FOI EXATAMENTE COM ESSA FINALIDADE, a
saber, PARA QUE ELE NÃO ENTRASSE NESSA RELAÇÃO QUE SE ELABOROU TODA LEI BÁSICA
DA PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR, A LC 109/01! A EFPC obriga-se a recolher a
contribuição, administrá-la financeiramente de forma tal que sempre existam
reservas suficientes para Ela fazer o pagamento dos benefícios previdenciários.
Fica
assim patente o absurdo desta argumentação pró Reversão de Valores. Essa
aplicação do Princípio da Proporção Contributiva TRANSPORTA o Patrocinador para
uma relação da qual ele foge como o demônio foge da cruz... de um contrato, do
qual ele é parte, para outro ao qual ele não quer pertencer. E o transforma de
OBRIGADO em BENEFICIÁRIO! Isso não é mais HERMENÊUTICA, isso é magia... Isso é
vara de condão para encantar crianças... Esse argumento é tão absurdo, é tão
logicamente desqualificado, que raia as margens do ridículo, prato cheio para
humoristas da grandeza de Chico Anísio, Millor Fernandes e Jô Soares... E
pasmem foi recentemente usado para justificar a Reversão de Valores quando da
elaboração da Resolução CNPC 11, em evidente infringência do mandamento contido
no artigo 3º da LC 109/01 que coloca os interesses dos Participantes sob a
proteção do Estado!
Outro
argumento, usado pelos autores do instituto da Reversão de Valores, e de profundo
impacto até sobre os Juízes, é o baseado no Princípio da Justiça: ambos
contribuem, Patrocinador e Participante, ambos são onerados com aumento de
contribuição quando as Reservas Previdenciárias se desfalcam, então é JUSTO que
ambos, Patrocinador e Participante, participem dos resultados superavitários
dos Planos de Benefícios Previdenciários!...
O
equívoco básico desse argumento é não entender o que é PATROCÍNIO. O Dicionário
Jurídico Universitário da renomada Mestre de Direito, Prof. Drª Maria Helena
Diniz, dá esta definição de patrocínio: na linguagem comum, proteção, auxílio,
amparo; no Direito Desportivo, transferência GRATUITA, EM CARÁTER DEFINITIVO,
para realização de projetos desportivos e paradesportivos, com finalidade
promocional e institucional de publicidade.
Pois
bem. Essa definição de patrocínio não caracteriza bem a contribuição para o
FGTS? Algum jurista ousará afirmar que o Patrão, em alguma situação anormal,
tem direito a participar desse benefício do empregado? Também não caracteriza
bem a contribuição para a Previdência Social Básica? Algum jurista ousará
afirmar que o Empregador tem o direito, em alguma situação anormal, de
participar dos resultados da reserva do INSS?
Contribuição
não é investimento em Fundo de Investimento bancário, que é um empréstimo, é um
NEGÓCIO FINANCEIRO, e foi feito para ter RETORNO e com LUCRO. Contribuição não
é cota nem ação de empresa, que é adquirida para isso, a saber, para ter
RETORNO e com LUCRO. Não! Contribuição é TRANSFERÊNCIA GRATUITA e EM CARÁTER
DEFINITIVO do Contribuinte (Patrocinador e Participante) para a EFPC, fundação
ou sociedade civil, SEM FIM LUCRATIVO.
Ah!
Mas não está lá, na contabilidade da EFPC, contadinho, mês a mês, o valor do benefício
de cada Participante, e discriminando contribuição do Patrocinador e
contribuição do Participante? Isso, meu caro leitor, é MERA CONVENIÊNCIA
CONTÁBIL, é CONTABILIDADE DE PASSIVO, de OBRIGAÇÃO DA EFPC. Ali, no seu ATIVO,
SÓ EXISTEM RESERVAS, a saber, RESERVAS MATEMÁTICAS, DE CONTINGÊNCIA e ESPECIAL!
No Ativo só existe o Patrimônio da EFPC, a sua propriedade fiduciária, isto é,
transitória que ela deve ir TRANSFERINDO nas épocas oportunas, segundo os valores
arbitrados no seu Passivo, para os CREDORES desse ATIVO, os PARTICIPANTES
ASSISTIDOS.
O
Participante não tem direito REAL sobre as Reservas da EFPC. Somente esta o
detém. O direito do Participante é um direito OBRIGACIONAL. A EFPC tem a
obrigação de pagar DETERMINADO VALOR ao PARTICIPANTE, no futuro. O PATROCINADOR
NÃO TEM DIREITO ALGUM, NEM OBRIGACIONAL NEM MUITO MENOS REAL, SOBRE O
PATRIMÔNIO DA EFPC. Ele fez uma CONTRIBUIÇÃO, e ponto final! O investidor em
fundo de investimento bancário e o capitalista ainda detêm um título
NEGOCIÁVEL. Já o Participante possui apenas um Certificado de Participação, e
este é absolutamente INEGOCIÁVEL. O Patrocinador nem título inegociável tem!
Estou
me estendendo neste assunto, porque, segundo me consta (infelizmente nunca tive a oportunidade de
ler o parecer jurídico que justificou a criação do instituto da Reversão de
Valores) teria sido este – a possibilidade de se determinar permanentemente na
Contabilidade da EFPC o valor atualizado das contribuições de Patrocinador e do
Participante – o argumento usado para justificar a criação do instituto da Reversão de
Valores. Mais ou menos assim: se é possível calcular o valor da Contribuição de
Patrocinador e Participante e se for feita a Restituição de Valor, ela, por
Justiça, deverá ser feita a ambos, Patrocinador e Participante, segundo o
Princípio de Proporção Contributiva! Oh! Deuses do Olimpo por onde andais?! E a
SPC e a PREVIC foram criadas para cumprir o MANDAMENTO DA LEI BÁSICA DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL, a LC 109/01, que no seu artigo 3º atribui ao ESTADO A
OBRIGAÇÃO DE PROTEGER OS INTERESSES DOS PARTICIPANTES!
O
argumento dos autores do instituto da Reversão de Valores que mais impressiona
os Juízes é o do ENRIQUECIMENTO ILÍCITO: canalizar o excesso de superávit tão
somente para o Participante, sobretudo se o Patrocinador é entidade estatal ou
ligada a entidade estatal, é enriquecimento ilícito. O excesso de reservas
previdenciárias, pois, precisa ser repartido entre Patrocinador e Participante.
Primeiramente,
o justo é o legal. Ora, o legal é gastar as reservas previdenciárias somente no
pagamento de benefícios previdenciários (artigo 19 da LC 109/01). Logo, canalizar todo
o excesso de reservas previdenciárias para o Participante Assistido é o legal,
é o justo, não é enriquecimento ilícito. Enriquecimento ilícito é canalizá-lo
para o Patrocinador, porque é ilegal, porque é injusto, porque é um absurdo diante de tudo o que
já expusemos até aqui!
Mas,
existem mais razões para afirmar que a participação do Patrocinador no resultado superavitário de reservas
previdenciárias é, de fato, enriquecimento ilícito. De fato, o excesso de
Reservas Previdenciárias é consequência da administração financeira das
reservas que supera as expectativas e sobretudo de circunstâncias
excepcionalmente lucrativas e insuspeitadas da economia em geral. Em geral, o
valor da renda constitui mais da metade do valor das reservas previdenciárias
dos Planos de Benefícios Previdenciários. Supera, portanto, o valor das
contribuições do Patrocinador e dos Participantes juntas! Nada tem que ver com
o Patrocinador nem com os Participantes. Trata-se da inteligente e competente
atuação da administração da EFPC no mercado financeiro, cuja atividade
investidora é tão produtiva que acaba até aportando mais valores para o mercado
do que recebendo: é o progresso econômico. A atuação das EFPC no mercado
financeiro é promotora do desenvolvimento do mercado, da economia do País!
Há
até determinada fase em que a EFPC se torna auto-suficiente, ela prescinde das
Contribuições, e de tal forma que ela
não precisará de contribuição nunca mais, de ninguém, nem de Patrocinador nem
de Participante. E aí está explicação porque o Patrocinador tem interesse em
patrocinar Plano de Benefícios Previdenciários, porque ele pode atrair ótimos,
competentes empregados com baixíssimo ônus para ele! Quem afirma isso é a
própria Resolução CGPC 26, não sou eu não.
Há
ainda mais. A contribuição é retirada do resultado da empresa antes do cálculo
do imposto de renda, isto é, sobre ela não incide o imposto de renda. Restituição
de Valor, portanto, é DUPLO BENEFÍCIO PARA O PATROCINADOR: ele é isento do
imposto de renda e ainda recebe a contribuição de volta! Por tudo isso, o
instituto da Reversão de Valores é, claramente, uma injusta fonte de
enriquecimento ilícito do Patrocinador.
E
ela é também, por isso mesmo, fonte de empobrecimento ilícito para o
Participante de Planos de Benefícios Previdenciários, sobretudo de EFPC ligada
a entidade estatal. No afã de obter excesso de reserva previdenciária, o
Patrocinador passa a pressionar a administração da EFPC para obter excesso de
reservas permanentemente e cada vez maiores. Então, a EFPC se transforma, de
fato, em uma EAPC, contra os exatos termos da LC 109/01. Ela se torna, de fato,
uma empresa, um empreendimento capitalista, uma fábrica de lucros, às custas do
empobrecimento ilícito dos Participantes, que veem cláusulas contratuais
modificadas e benefícios previdenciários reduzidos ao longo da sua existência
de forma compulsória, de forma parcial e ao arrepio da Lei, sem prévio
conhecimento e impotentes ao que até se poderia apelidar de esbulho. Isso é relato
da História!
É
contra essa deterioração da Previdência Social, que a própria História
tristemente nos relata, que a LC 109/01 coloca através do artigo 3º-VI os
interesses dos Participantes sob a proteção do poder soberano do Estado. O que
significa isso? Significa que os interesses dos Participantes dos Planos de
Benefícios Previdenciários integram aquele conjunto de interesses cuja
satisfação compõe a RAZÃO DE SER ÚLTIMA DO ESTADO BRASILEIRO, como erigido pelo
artigo 193 da Constituição Brasileira: “A ordem social tem como base o primado
do trabalho, E COMO OBJETIVO O BEM-ESTAR E A JUSTIÇA SOCIAIS.” O Estado
Brasileiro foi constituído e organizado para proporcionar o bem estar social e
a justiça social, mediante a SEGURIDADE SOCIAL. Tudo o que é o Estado
Brasileiro se submete a essa finalidade suprema, até a ordem econômica.
O
que isso significa? Significa que o patrimônio da EFPC deve ser gerido, de
forma que contribua sim para o progresso do País, para o seu desenvolvimento
econômico (Título VII da Constituição Federal), mas que essa harmonização
(artigo 3º-II da LC 109/01) não implica o sacrifício da plena realização dos
objetivos para o qual foi criado o Regime da Previdência Privada Complementar,
porque a satisfação de todos esses compromissos constitucionais e legais da
Previdência Complementar fazem parte da concretização do fim supremo do Estado
Brasileiro, a saber, o bem estar social e a justiça social. Não é o bem estar
social e a justiça social que se submetem ao progresso do País. Não, é o
contrário, o progresso do País é perseguido exatamente para isto, a saber, para
que se realize o bem estar e a justiça social.
Mas, ainda existe um argumento invocado pelos autores
do instituto de Reversão de Valores, que impressionou tanto um Juiz de
Brasília, que o levou a prolatar sentença favorável à sua legalidade. Longe de
mim desmerecer da competência do ilustre Jurista. Entendo, todavia, que essa
decisão do meritíssimo Juiz se deve atribuir a um deslize no processo mental de
utilização da técnica hermenêutica da intelecção do §1º do artigo 21 da LC
109/01: “O equacionamento referido no caput poderá ser feito, dentre outras
formas, por meio do aumento do valor das contribuições, instituição de
contribuição adicional ou redução do valor dos benefícios a conceder,
observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador.” Diz
ele que a expressão “dentre outras formas” indica que a LC 109/01, quando se
reporta à contribuição e ao valor do benefício como instrumentos de
reequilíbrio de um Plano de Benefícios Previdenciários, não está fazendo uma
relação completa destes instrumentos, mas tão somente uma lista exemplificativa
e, portanto, ela admite o reequilíbrio também através do instituto da Reversão
de Valores.
Ocorre, entretanto, que mais uma vez a LC 109/01 foi
MUITÍSSIMO CLARA. Ela diz COM TODAS AS LETRAS, na redação desse citado
parágrafo que essa “relação exemplificativa” SOMENTE VALE para o CASO DO
REEQUILÍBRIO DE UM PLANO DESEQUILIBRADO POR DÉFICIT DE RESERVAS: “O
equacionamento referido no caput...” Ora, meritíssimo Juiz, o caput do artigo
21 está tratando do processo de reequilíbrio de um Plano de Benefícios
desequilibrado por DÉFICIT e não por Excesso de Reservas!... Assim,
meritíssimo, não se pode DE FORMA ALGUMA concordar com a infelizmente
desastrosa sentença de Vossa Senhoria. Essa forma de fazer hermenêutica jurídica
é inadmissível. O próprio parágrafo diz que ELE SE RESTRINGE AO CASO DE
DESEQUILÍBRIO DO PLANO POR FALTA DE
RESERVAS!
Todos que lidam com esse assunto de Previdência
Complementar sabem, e a própria LC 108/01 o prevê, que os Planos de Benefícios
podem receber empréstimos e doações. É a isso que se reporta a expressão
“dentre outras formas”. E não pense,
caro leitor, que essas doações não acontecem. Recentemente Bill Gates e esposa
constituíram uma fundação com a modesta quantia de um terço da fortuna deles, a
bagatela de TRINTA E TRÊS BILHÕES DE DÓLARES do casal. Há pouquíssimos anos,
outro bilionário americano contratou alguns poucos executivos financeiros
brasileiros para administrar sua fortuna. Falecendo ele, os nossos compatriotas
foram surpreendidos com o fato de que se haviam tornado herdeiros do seu
patrão!
Ah! foi dito, lá no site da Anapar, que, em entrevista com o então Ministro da Previdência Social, em 2008, o eminente Senador José Barroso Pimentel, ele teria afirmado que, como participante nos debates da formulação da LC 109/01, ele estava convencido de que a LC 109/01 foi redigida de forma a acolher o instituto da Reversão de Valores. Quem sou eu para contestar o eminentíssimo senador. Só que hoje se lendo o texto da LC 109/01, ele é EM TUDO INCOMPATÍVEL COM ESSE INSTITUTO...
Assim, tenho plena certeza de que os nossos
representantes, altamente qualificados que são, não se intimidarão diante das
doutíssimas autoridades com que irão dialogar, e respeitosamente, mas intransigentemente
defenderão as posições de condenação da ilegalidade do instituto de Reversão de
Valores, amparados na limpidíssima evidência fornecida por uma argumentação
irrefutável. E estarão confortavelmente estimulados por aquele Juiz do Rio
Grande do Sul que afirmou crer que o instituto da Reversão de Valores é ilegal.
E daquele colegiado de desembargadores de Brasília que afirmou alto e bom que o
instituto de Reversão de Valores da Resolução CGPC 26 DEVE SER FUZILADO. E do
admirável lamento do Meritíssimo Juiz, decano do Supremo Tribunal Federal, que
afirmou encontrar ilegalidade, por ser praeter legem e contra legem, no
instituto de Reversão de Valores. E, por fim, o recente teor da Ação Cívil
Pública do eminente Procurador da República no Estado do Rio de Janeiro, que
demonstrou a ilegalidade do instituto da Reversão de Valores e denunciou a
forma ilegal como ela por vezes é decidida pelas administrações das EFPC.
Tenho certeza de que se manterão intransigentes em
debater primeiro a legalidade do instituto da Reversão de Valores, o PDS 275 de
sua Excelência, o Senador Paulo Bauer. Aceitarão, sim, debater um novo Regime
para a Previdência Privada Complementar, em tempo oportuno, posterior,
certamente no primeiro semestre do ano próximo, depois de INTENSAMENTE
PREPARADOS através de estudos da História da Previdência Social no Mundo e no
Brasil, bem como do Direito Previdenciário Comparado do Brasil com os de outros
países, como França, Inglaterra, Portugal.
Não aceitarão, tenho plena certeza, essa estratégia
diversionista de unificar as duas matérias num mesmo debate, e nele ingressando
para perder, porque para esse debate amplíssimo, creio, estariam
despreparados... Essa era a advertência de meus saudosos mestres, Padres
Jesuítas: sempre entre em debates, bem preparado!
Isso é o que penso... Esta é minha modesta
colaboração. Boa sorte.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPrezado e admirado amigo Edgardo,
ResponderExcluirEsta sua nova postagem deveria ser lida e bem entendida por todos os nossos representantes que participarão da citada audiência. Nela você expõe, pormenorizadamente, todas as contra-argumentações necessárias de serem enfatizadas nos debates que ali acontecerão.
Parabéns mais uma vez por seus artigos extremamente bem elaborados e perspicazes.
Apenas peço-lhe para retificar a segunda linha de seu 32o. parágrafo (O que se inicia com a expressão "Ah!"), onde o termo "Patrocinador" está empregado em duplicidade, salvo seu melhor juízo.
Um fraterno abraço e minha torcida para que seus problemas atuais de saúde se estabilize.
Caro, e muito caro, amigo Juarez Barbosa
ResponderExcluirOs seus comentários sempre me umedecem os olhos de comoção. Obrigado. Tenho imensa saudade de seu blog, um blog sério, cheio de informações utilíssimas e bonito. Um abraço do
Edgardo
Caro Sr. Edgardo
ResponderExcluirSempre busco no seu Blog, informações sobre a ACP.Então. Em junho, iniciarão as audiências. Fico rogando a Deus por sua saúde, para que continue a nos informar de uma forma tão brilhante e que Ele também ilumine nossos debatedores. Acredito em mudanças profundas no Regime de Previdência Privada Complementar, após todo este movimento. Obrigado. Um grande abraço. Socorro.
Estimada colega Socorro.
ResponderExcluirObrigado pelas palavras de estímulo. Espero como você que nossos colegas atuem de forma convincente nessa próxima audiência. Entendo que ela terá grande impacto sobre as nossas pretensões, se ficar limitada ao assunto do PDS 275 e se lá estiver presente o Advogado Geral da União. O importante é a argumentação. Foi a argumentação que convenceu o Procurador da República aqui do Rio de Janeiro. E ele ouviu os dois lados!...
Edgardo