Imaginei titular este texto “Estado
Mínimo Afogado e Soterrado”. Desisti. No Brasil, nunca houve um Estado Mínimo.
Aqui nestas úberas terras de Peri e Iracema, sempre houve um Estado explorado pelos
políticos.
No Império, nada de estranhar porque o
Imperador, segundo o conceito tradicional, era o senhor de tudo, que proporcionava
uma propriedade perfuntória para os parentes e relacionamentos interesseiros,
de modo que o resultado da atividade econômica do país resultasse na boa vida
da família real e do restrito grupo de súditos insignes e fieis.
Proclamada a República, o destino do
País caiu durante décadas sob o comando de políticos, dominados por ricos
latifundiários regionais e comerciantes urbanos, que orientaram o destino da
nação segundo seus interesses.
A Revolução de 1930 pretendeu ser a
subversão dessa política, iniciando, de fato, no país, o governo do povo, para
o povo e pelo povo. Tudo pareceu que tomaria o rumo correto, o rumo da
racionalidade, da iluminação mental, do conhecimento científico, do melhor
conhecimento atual, do conhecimento da Humanidade. E tanto que Franklin Delano
Roosevelt, o maior presidente da História dos Estados Unidos, o mais avançado
país neste último século da História, confessou aqui no Rio de Janeiro, em
1936, num discurso proferido no Palácio do Itamarati, que a famosa política
econômica revolucionária por ele adotada em seu assombroso país era lição aprendida,
por exemplo, da inventada pelo governo brasileiro.
O Mundo conseguiu, por fim, sentar-se,
mutuamente desconfiados os deliberantes, é certo, para discutir os problemas
comuns e tentar resolvê-los pacificamente. O Mundo decidiu por um Estado do Bem
Estar Social em que a vida humana seja, de fato, uma Vida Boa, sem dor no corpo
e sem angústia na alma, para todos os viventes e não apenas para alguns. É essa
a ambição da Organização das Nações Unidas como atestam tanto a Declaração dos
Direitos do Homem como a Declaração dos Deveres do Homem.
Nesse interregno, no entanto, o Brasil
cedeu terreno e ficou para trás. A política deixou de ser uma atividade do povo
para a consecução do bem estar do povo, salvo em poucas ocasiões, para retornar
a ser a pratica de indivíduos ousados e oportunistas, interessados em beneficiar-se
da produção nacional. O canibalismo político individualista sugou o sangue da
produção nacional, da vida da nação que contínua anêmica.
Essa é a razão dessas cidades
superpovoadas, sem a mínima condição de vida segura, registrando prejuízos,
desastres, desabamentos de casas e encostas e morte de pessoas, por óbvia
omissão da mais elementar política urbanística, em pleno século XXI, decorridos
já quatro séculos da iluminação científica.
Cidades superdimensionadas e
superpovoadas, sem a mínima condição de vida com dignidade; Cidades de maltrapilhos,
famintos, morrendo na luta desesperada e assassina pela sobrevivência, de lares
mal formados ou simplesmente inviáveis, de indivíduos mais próximos da situação
animalesca do que da autonomia humana que dignifica e orienta com a
racionalidade. Cidades afogadas no lamaçal das inundações das águas dos esgotos
insuficientes e ilusórios. Cidades soterradas no lixo dos serviços de limpeza
ludibriantes ou inexistentes, nos deslizamentos de encostas prenunciantemente
ameaçadoras. Cidades morrendo de sede, por inexistente ou perfunctório
fornecimento de água potável no país de maior riqueza hídrica do Mundo! É
patente a incapacidade administrativa do Estado, único capaz de gerir o bem público,
de orientar a vida pública.
È verdade que a liberdade econômica, no
momento, é considerada a base da riqueza e do progresso de uma nação. Mas não
menos verdadeiro é que essa liberdade, para ser exitosa, precisa ser guiada
pela razão, pelo conhecimento, pelo planejamento, pela Ordem, para que ela
atinja seu objetivo. E essa ordem não elimina a liberdade, porque ela é a
liberdade de quem não se submete a outro homem algum, mas somente à lei que ele
mesmo contribuiu para ser proclamada, a lei que deve ser aprovada
individualmente por todos os cidadãos.
Essa calamitosa situação urbana
brasileira, no meu entendimento, resulta de básico engano de percepção
econômica da população e das lideranças nacionais, o equívoco da dissociação do
mundo micro e do mundo macro. O insigne, único e instrutivo erro de Einstein
foi quando ele pretendeu recusar a teoria quântica e pronunciou aquela famosa
frase: “”Deus não joga dados”.
Na construção do Mundo, como na
construção da riqueza, Deus joga dados, sim. Cada indivíduo cuida de sua
própria existência. A Neurologia ensina que, a cada momento, nós nos
modificamos. Logo, somente os nossos sensores individuais são capazes de nos
fornecer através de dificultosa filtragem racional momentânea e constante o que
devemos fazer para curtir uma vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na
alma. Mas, na vida coletiva, na vida pública, tudo que acontece é sentido pelo
corpo social. Todos compartilhamos e sentimos os males de nossas sofridas e
desorganizadas cidades, até a mais alta autoridade atual do País carrega no
abdome vestígio de uma facada e outro, na dignidade, a marca deprimente de
condenação judicial.
Assim como na Física a mão invisível das
leis, que regem os movimentos nebulosos das partículas do microcosmo que compõe
a teoria quântica, gera um mundo macrocósmico, cujos movimentos se regem pela
leis do movimento da teoria da relatividade, assim também na Economia a mão invisível das
leis que regem a via microeconômica do mercado competitivo de bilhões de trocadores
concebe o mundo macroeconômico das
Nações, que precisa para funcionar das regras da Justiça, e só pode ser organizado e eficiente
submetendo-se às regras do Direito, impostas pela Ordem criada pela
concordância racional de toda população, do Povo, o único ente capaz de captar-lhe a natureza e ajustar-lhe
a atividade aos caminhos do progresso.
O Brasil, precisa, antes de tudo, de
planejamento macroeconômico, Ordem macroeconômica, fixação do Norte do
progresso nacional, com a consequente abertura das veredas que a ele levam. A
macroeconomia precisa do Estado, o governo livre do Povo, para o Povo e pelo
Povo, das leis do Estado Democrático eficiente, que funcione.
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