quarta-feira, 16 de setembro de 2020

511. História do Pensamento Político (continuação)


    Charles Louis de Secondat de Montesquieu formou-se em Direito e adquiriu fortuna que lhe permitiu dedicar a vida ao estudo da humanidade e a publicar as suas teorias políticas. A sua obra prima intitula-se “O Espírito das Leis”.

    A Lei é a razão humana, uma norma racional de conduta: “A lei, em geral, é a razão humana, enquanto governa todos os povos da terra. As leis políticas e civis de cada nação nada mais devem ser do que os casos particulares aos quais se aplica tal razão humana.” O espírito das leis é o ambiente produzido pelo conjunto de relacionamentos dos indivíduos que formam uma nação: “Elas devem ser relativas à geografia física do país; ao clima...; à qualidade, situação e grandeza do país; ao gênero de vida dos povos...; ao grau de liberdade...; à religião, inclinações, riquezas, número, comércio, costumes, usos dos habitantes. Por fim, elas estão em relação entre si e com a sua origem, com as finalidades do legislador e com a ordem das coisas nas quais se fundamentam... Examinarei todas essas relações – e o seu conjunto constitui aquilo que chamo de espírito das leis.” Assim, cada nação tem suas próprias leis, as leis de uma nação não servem exatamente para outra: “Elas devem se adaptar tão bem ao povo para o qual foram feitas, que somente em casos raríssimos as leis de uma nação poderiam convir a uma outra.”

    O livro Espirito das Leis é, pois, esse estudo que ele realiza organizando o seu pensamento sob a luz de princípios éticos que infundem a forma dos governos das nações: a virtude, a honra e o medo.

    Assim, “Existem três espécies de governo: o republicano, o monárquico e o despótico... O governo republicano é aquele em que o povo, em sua totalidade ou uma parte dele, possui o poder soberano; o monárquico é aquele em que só um governa, mas com base em leis físicas e imutáveis; ao passo que o despótico é aquele em que também um só governa, mas sem leis e sem regras, decidindo tudo com base em sua vontade e ao seu bel-prazer.” A virtude é o princípio ético da república, a honra da monarquia e o medo do despotismo.

    Virtude é a moralidade, a conduta racional guiada pelo bem público: “não é precisa muita probidade para que um governo monárquico ou despótico possa se manter e defender. A força das leis em um e o braço forte ameaçador do príncipe no outro regulam e governam tudo. Mas em um estado popular é precisa uma mola a mais, que é a virtude....Quando tal virtude é deixada de lado,  ambição penetra nos corações a ela mais inclinados e a avareza penetra em todos.... antes era-se livre sob a lei, mas agora se quer ser livre contra as leis...”

    Honra é um conjunto de qualidades morais e intelectuais tais que fazem uma pessoa merecer determinada posição na sociedade, a honesta busca de posição social, o comando social obtido por força do interesse pessoal: “A ambição é perigosa em uma república, mas tem bons efeitos em uma monarquia: ela lhe dá a vida e tem a vantagem de não ser perigosa, porque facilmente pode ser reprimida... A honra faz mover todas as partes do corpo político e as liga por meio de sua própria ação,  eis que cada um se dirige para o bem comum, crendo dirigir-se para os próprios interesses particulares.”

    No governo despótico “é preciso o medo: a virtude não é necessária e a honra seria perigosa... Portanto o medo deve abater todos os corações , apagar também o mais fraco senso de ambição.”

    Finalmente, Monstesquieu argumenta pela defesa da liberdade do cidadão em confronto com o poder do Estado pela divisão dos três poderes da soberania, o poder de legislar, o poder de governar e o poder de julgar. Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário, três poderes iguais e independentes, para que o indivíduo permaneça independente, livre para realizar o próprio destino, para tomar as decisões que entenda necessárias para o seu bem estar: “A liberdade não consiste de modo algum em fazer tudo o que se quer. Em um Estado, isto é, em uma sociedade na qual existem leis, a liberdade não pode consistir senão em poder fazer aquilo que se deve querer e em não ser obrigado a fazer aquilo que não se deve querer,,, A liberdade é o direito de fazer tudo aquilo que as leis permitem... A liberdade política em um cidadão é aquela tranquilidade de espírito que deriva da persuasão que cada qual tem da sua segurança; para que se goze de tal liberdade é preciso que o governo esteja em condições de libertar cada cidadão do temor do outro... quando uma mesma pessoa ou o mesmo corpo de magistrados concentra os poderes legislativo e executivo, não há mais liberdade porque subsiste a suspeita de que o próprio monarca ou o próprio senado possam fazer leis tirânicas para depois, tiranicamente, fazê-las cumprir.... Se o poder de julgar ...estivesse unido ao poder legislativo, haveria um potestade arbitrária sobre a vida e a liberdade dos cidadãos, posto que o juiz seja legislador. E se estivesse unido ao poder executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor.... tudo estaria... perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos governantes, dos nobres ou do povo exercesse juntamente os três poderes: o de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os delitos ou causas entre os privados.”

    A separação dos três poderes foi estabelecida primeiro nos Estados Unidos e em seguida na França com a Revolução Francesa e vem sendo implantada nas novas constituições.

(continua)  .

  

2 comentários:

  1. Resiliência para enfrentar a crise

    [...] Os números comprovam a resiliência dos nossos ativos, mesmo em um cenário tão negativo. Ao compararmos o desempenho dos fundos da Previ com outros do mercado, estamos perdendo menos – o que é um efeito da qualidade dos investimentos e da diversificação da carteira.

    Dados apurados pelo sistema da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostram que os fundos de ações do mercado tiveram, em média, um desempenho negativo de 33,41%. O segmento de renda variável do Plano 1 recuou bem menos: 25,98 %.

    [...] Numa situação adversa tão brutal como a que estamos presenciando, ter investimentos com rentabilidades que recuam menos que as do mercado são um sinal importante de resiliência das carteiras de ativos.

    (fragmento de texto extraído de A EXPLICAÇÃO DA PREVI: "VAI PASSAR", blog do Professor Ari, 15/05/2020)

    - Entretanto, permitimo-nos discordar totalmente do acima dito. Em primeiro lugar, a razão de nossa discordância cinge-se ao fato de que o acima mencionado é tão somente o “preço de mercado” dos ativos. Portanto, nada tem a ver com o "valor fundamental", como a seguir veremos.

    Os seguintes aforismos de autoria do grande trader norte-americano, Warren Buffett, permitem-nos entender a grande diferença que frequentemente existe entre o “preço de mercado” e o “valor fundamental”:

    (1) Price is what you pay; value is what you get. (24)

    (2) In the short run, the market is a voting machine, but in the long run, it is a weighing machine. (24)

    Em segundo lugar, a resiliência é apenas uma das quatro dimensões principais da liquidez bursátil, conforme se segue:

    [...] La résilience se caractérise par la rapidité avec laquelle le prix des actifs revient au niveau atteint avant l’exécution d’ordres de taille importante (impact des transactions sur le cours boursier) ou après un épisode de perturbation des marchés (7)

    Traduzindo:

    [...] A resiliência é caracterizada pela rapidez com que os preços dos ativos retornam ao nível alcançado antes da execução de grandes pedidos (impacto das transações sobre o preço das ações) ou após um episódio de pertubação do mercado (7)

    Em terceiro lugar, a liquidez bursátil é uma ilusão. Neste sentido, encontramos na literatura técnica o
    seguinte fragmento de texto:

    [...] Keynes não cessou de lutar contra a primazia injustamente concedida à liquidez: “De todas as máximas da finança ortodoxa não há nenhuma mais anti-social do que o fetichismo da liquidez. Tal teoria ignora o fato de que para a comunidade como um todo, não há nada que corresponda à liquidez do investimento”. (28)

    Por seu turno, o equívoco entre os conceitos de "preço de mercado" e "valor fundamental", como o acima mencionado, tem sido uma confusão recorrente que encontramos muitas vezes nos comentários de alguns distintos colegas de chat. Tal confusão parece-nos normal. Não obstante, tal confusão quando vinda de palavras do presidente do fundo Previ não nos parece normal. A razão de nossa desconfiança cinge-se ao fato de que a literatura técnica sustenta de forma pacífica que “as principais dificuldades no tocante à administração dos fundos de pensão relacionam-se à [...] divergência de objetivos entre o principal* e o agente;** (21)

    * proprietários FORMAIS da poupança concentrada coletiva (“pFdpcc”)

    ** proprietários MATERIAIS da poupança concentrada coletiva (“pMdpcc”)

    Consequentemente somos levados a classificar o acima mencionado, como um caso semelhante a "diante de um cego (lifnei iver) não colocarás um obstáculo", conforme se segue:

    continua...

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  2. continuação

    [...] Em Deuteronômio 19:14, os rabinos encontraram um conceito importante: "Diante de um cego (lifnei iver) não colocarás um obstáculo". Este conceito reconhece a obrigatoriedade de perceber não apenas as interações que realizamos, mas de conhecer também a natureza daquele com quem estamos entrando em interação. Devemos então meditar sobre esta noção bastante "visual" em que podemos nos imaginar saindo pelas ruas e pela vida a colocar obstáculos nos caminhos dos cegos. E quem são os cegos? Todos aqueles cuja "visão" é menor do que a nossa. Nós também somos cegos diante de outras pessoas, sendo que cabe, portanto, a elas a responsabilidade nas transações que tiveram conosco. Quem vê mais tem este tributo do Mercado - é responsável. (38)

    (24) LOWE, Janet. Warren Buffett speaks: wit and wisdom from the world’s greatest investor. New York: John Wiley & Sons, 1997;

    (7)BOURGHELLE, David e HYME, Pauline. Du mythe de l'efficience des marchés au krach: l'illusion de la liquidité boursière, 2010. Disponível em: . Acesso em: 27.06.2011;

    (28)www.parisschoolofeconomics.com/orlean-andre/depot/publi/RAP2004tBOUR.pdf;

    (21) MOTA DE FARIA, Cláudio. Fundo de pensão estatal brasileiro: uma fundamentação equivocada e inadequada, 2006;

    (38) BONDER, Nilton. A Cabala do Dinheiro. Rio de Janeiro: Imago Ed., 1991.

    ÍNDICE

    1. A liquidez bursátil é uma ilusão
    2. A enorme diferença que eventualmente pode existir entre o
    “preço de mercado” e o “valor fundamental”
    3. Os beneficiários dos fundos de pensão: “determinado capital financeiro” e os “proprietários MATERIAIS da poupança concentrada coletiva” (“pMdpcc”)
    4. O relacionamento ao longo do tempo entre a Bolsa de Valores e os Fundos de Pensão
    5. O hodierno capitalismo bursátil é apenas uma conspiração

    1. A liquidez bursátil é uma ilusão

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