Charles Louis de Secondat de Montesquieu formou-se em Direito e adquiriu fortuna que lhe permitiu dedicar a vida ao estudo da humanidade e a publicar as suas teorias políticas. A sua obra prima intitula-se “O Espírito das Leis”.
A Lei é a razão humana, uma norma racional de conduta: “A lei, em geral, é a razão humana, enquanto governa todos os povos da terra. As leis políticas e civis de cada nação nada mais devem ser do que os casos particulares aos quais se aplica tal razão humana.” O espírito das leis é o ambiente produzido pelo conjunto de relacionamentos dos indivíduos que formam uma nação: “Elas devem ser relativas à geografia física do país; ao clima...; à qualidade, situação e grandeza do país; ao gênero de vida dos povos...; ao grau de liberdade...; à religião, inclinações, riquezas, número, comércio, costumes, usos dos habitantes. Por fim, elas estão em relação entre si e com a sua origem, com as finalidades do legislador e com a ordem das coisas nas quais se fundamentam... Examinarei todas essas relações – e o seu conjunto constitui aquilo que chamo de espírito das leis.” Assim, cada nação tem suas próprias leis, as leis de uma nação não servem exatamente para outra: “Elas devem se adaptar tão bem ao povo para o qual foram feitas, que somente em casos raríssimos as leis de uma nação poderiam convir a uma outra.”
O livro Espirito das Leis é,
pois, esse estudo que ele realiza organizando o seu pensamento sob a luz de
princípios éticos que infundem a forma dos governos das nações: a virtude, a
honra e o medo.
Assim, “Existem três espécies de
governo: o republicano, o monárquico e o despótico... O governo republicano é
aquele em que o povo, em sua totalidade ou uma parte dele, possui o poder
soberano; o monárquico é aquele em que só um governa, mas com base em leis
físicas e imutáveis; ao passo que o despótico é aquele em que também um só
governa, mas sem leis e sem regras, decidindo tudo com base em sua vontade e ao
seu bel-prazer.” A virtude é o princípio ético da república, a honra da
monarquia e o medo do despotismo.
Virtude é a moralidade, a conduta
racional guiada pelo bem público: “não é precisa muita probidade para que um
governo monárquico ou despótico possa se manter e defender. A força das leis em
um e o braço forte ameaçador do príncipe no outro regulam e governam tudo. Mas
em um estado popular é precisa uma mola a mais, que é a virtude....Quando tal
virtude é deixada de lado, ambição
penetra nos corações a ela mais inclinados e a avareza penetra em todos....
antes era-se livre sob a lei, mas agora se quer ser livre contra as leis...”
Honra é um conjunto de qualidades
morais e intelectuais tais que fazem uma pessoa merecer determinada posição na
sociedade, a honesta busca de posição social, o comando social obtido por força
do interesse pessoal: “A ambição é perigosa em uma república, mas tem bons
efeitos em uma monarquia: ela lhe dá a vida e tem a vantagem de não ser
perigosa, porque facilmente pode ser reprimida... A honra faz mover todas as
partes do corpo político e as liga por meio de sua própria ação, eis que cada um se dirige para o bem comum,
crendo dirigir-se para os próprios interesses particulares.”
No governo despótico “é preciso o
medo: a virtude não é necessária e a honra seria perigosa... Portanto o medo
deve abater todos os corações , apagar também o mais fraco senso de ambição.”
Finalmente, Monstesquieu
argumenta pela defesa da liberdade do cidadão em confronto com o poder do
Estado pela divisão dos três poderes da soberania, o poder de legislar, o poder
de governar e o poder de julgar. Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder
Judiciário, três poderes iguais e independentes, para que o indivíduo permaneça
independente, livre para realizar o próprio destino, para tomar as decisões que
entenda necessárias para o seu bem estar: “A liberdade não consiste de modo
algum em fazer tudo o que se quer. Em um Estado, isto é, em uma sociedade na
qual existem leis, a liberdade não pode consistir senão em poder fazer aquilo
que se deve querer e em não ser obrigado a fazer aquilo que não se deve
querer,,, A liberdade é o direito de fazer tudo aquilo que as leis permitem...
A liberdade política em um cidadão é aquela tranquilidade de espírito que
deriva da persuasão que cada qual tem da sua segurança; para que se goze de tal
liberdade é preciso que o governo esteja em condições de libertar cada cidadão
do temor do outro... quando uma mesma pessoa ou o mesmo corpo de magistrados
concentra os poderes legislativo e executivo, não há mais liberdade porque
subsiste a suspeita de que o próprio monarca ou o próprio senado possam fazer
leis tirânicas para depois, tiranicamente, fazê-las cumprir.... Se o poder de
julgar ...estivesse unido ao poder legislativo, haveria um potestade arbitrária
sobre a vida e a liberdade dos cidadãos, posto que o juiz seja legislador. E se
estivesse unido ao poder executivo, o juiz poderia ter a força de um
opressor.... tudo estaria... perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos
governantes, dos nobres ou do povo exercesse juntamente os três poderes: o de
fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os delitos ou
causas entre os privados.”
A separação dos três poderes foi
estabelecida primeiro nos Estados Unidos e em seguida na França com a Revolução
Francesa e vem sendo implantada nas novas constituições.
(continua) .