In
Memoriam de Insuspeitada Grande Personalidade
Mais que adentrar este venerando recinto
material, morada da Fraternidade, estou ingressando no templo espiritual de
veneração ao Grande Arquiteto, que planejou engastar nessa estupenda obra do
Universo a joia magnífica da Humanidade.
O grande filósofo Hegel ensinou à
posteridade que a Vida é portentosa mágica transformista da Mente humana. O
Grande Arquiteto conferiu-nos o poder de injetar no mundo material luz, cor,
som, sabor, espaço e tempo, prazer e sofrimento, dor e bem-estar, tristeza e
alegria, esforço e relaxamento, paz e guerra, ódio e amor. A Mente humana
confere significado aos fatos materiais físicos do movimento das
partículas-ondas constitutivas da Matéria, transformando-os magicamente nesse portentoso
espetáculo que é a Cultura, a Civilização e a desafiadora aventura da Vida.
Meu pai foi uma Mente seduzida,
sobretudo, pela magia da Terra e do Clã. Era uma personalidade atávica, atraída
pela beleza inebriante dos carnaubais e dos canais d’água, que inundam de
nutrientes os manguezais e a flora do exuberante delta do Rio Parnaíba, onde se
acha incrustada a cidadezinha amada onde nasceu, Parnaíba, a joia dos
manguezais opulentos.
Penso que poucos aqui nesta ínclita plateia
saibam da existência dessa cidadezinha. Ela se situa, há séculos, ali, num dos
paraísos terrestres brasileiros, o delta do rio Parnaíba, no esquecido Estado
do Piauí. Nem mesmo os jornalistas dos programas televisivos de meteorologia se
lembram de prenunciar as condições de tempo no Piauí. Diariamente, ouço-os
saltar do Maranhão para o Ceará.
Parnaíba, no século passado, quando meu pai nasceu, até a década de 40,
situava-se entre as cidades mais operosas e progressistas do Nordeste
brasileiro. As principais empresas parnaibanas competiam em desempenho com as
similares dos Estados do Maranhão e Ceará. Ela era notável polo brasileiro de comércio
internacional. Era uma cidade aberta, para usar o maravilhoso qualificativo que
Péricles pespegou a sua estupenda Atenas no famoso discurso. Naquela época,
Parnaíba era uma cidade litorânea. Hoje, o antigo porto marítimo de Parnaíba,
Amarração, é a sede do município de Luís Correia.
Amarração não era, contudo, a porta que conectava Parnaíba ao mundo.
Ela era, e ainda é hoje, um porto onde o Igaraçu, o braço parnaibano do rio,
arma ciladas aos raros navios que por ali se aventuram a adentrar. Ele vai
abrindo hoje uma nova passagem, que logo amanhã caprichosamente entulha com a
areia movediça, que atapeta aquela região submarina.
O porto de Parnaíba era o fluvial Porto das
Barcas, onde fervilhavam navios-gaiola, lanchas e barcaças. Eles desciam até
Tutóia, cidade litorânea maranhense. Lá, enchiam-se de mercadorias trazidas de
navio, sobretudo do Exterior. A ligação comercial de Parnaíba não era
propriamente com o Brasil. Era com a Europa e os Estados Unidos: os portos
holandeses, Hamburgo, New York e, sobretudo, Londres.
Parnaíba exportava babaçu, tucum, outras oleaginosas, couro de animais
silvestres, algodão e cera de carnaúba. Importava muita coisa, quase tudo, do Exterior,
não dos outros Estados brasileiros. O parnaibano comia manteiga e queijo
inglês, e biscoito suíço. As refeições eram servidas em louça inglesa. Bebia-se
cachaça e também uísque escocês em copos ingleses. Casas havia onde se
degustava à tarde o chá das cinco, à inglesa, enquanto se jogavam partidas de
bridge. As casas eram revestidas com estuque de procedência inglesa. Os homens
vestiam linho inglês e as mulheres seda importada de Londres. As parnaibanas
maquiavam-se com pó, rouge e batom inglês. Perfumavam-se com essências
francesas. Os poucos carros, que trafegavam pelas ruas arenosas da cidade, eram
Ford bigode, o produto revolucionário, produzido em série para a população de
classe média pelo genial americano. Para completar a paisagem de cultura
inglesa equatorial impunha-se a existência de um castelo. Havia-o, sim, o
castelo do Tó, solteirão de sangue inglês, sócio da Casa Inglesa, a mais
importante empresa parnaibana na época, de propriedade de meus bisavós maternos.
As mercadorias chegavam a Parnaíba pelo rio. As estradas eram
imprestáveis para o trânsito de veículos motorizados, que praticamente
inexistiam. Além do rio, apenas a estrada-de-ferro ligava Parnaíba à capital,
Teresina. Assim, Parnaíba era o umbigo econômico e cultural do Piauí, que
ligava o Estado ao Mundo, inclusive ao Brasil. Os abastados comerciantes
parnaibanos eram conhecidos no Brasil e no Mundo: a Casa Inglesa, a Casa Marc
Jacob, os Moraes Correia, Pedro Machado & Trindade, Casa Torquato, José
Narciso. A Booth Line agenciava navios. Filhas de família da classe média
casavam com ingleses. Algumas foram morar na Inglaterra. Agentes de empresas
alemãs foram lá perseguidos e presos, quando os navios brasileiros foram
bombardeados durante a Segunda Guerra Mundial.
Documentos comerciais, redigidos em inglês, atulhavam os escritórios
das empresas parnaibanas: cartas, telegramas, faturas, letras de câmbio e
ordens de pagamento. Parnaíba foi uma das primeiras dezenas de cidades
brasileiras agraciadas com agência do Banco do Brasil. E, é óbvio, até a década
de 60, a
agência de Parnaíba era uma das poucas que possuíam a Seção de Câmbio.
Os jovens parnaibanos, que ambicionavam um
futuro mais promissor, faziam o curso ginasial e estudavam contabilidade.
Tinham, é claro, que ler e escrever inglês. Os jovens de famílias abastadas iam
para Recife, Salvador e Rio para diplomar-se em medicina, direito ou
engenharia. Regressavam doutores e herdavam os negócios dos pais.
Os jovens de famílias da classe média aventuravam-se no Rio de Janeiro,
a capital da federação brasileira, ou nesta cidade de São Paulo, o fenômeno
econômico brasileiro. Ou ficavam e se acomodavam lá mesmo, empregando-se no
comércio local. Ou se submetiam a concurso para trabalhar no serviço público ou
no Banco do Brasil.
Os cinco irmãos, filhos de meus avós paternos, ingressaram no Banco do
Brasil, realizando inconscientemente desejo expresso pelo Pai, que, certa vez,
passando pela frente do suntuoso prédio da agência do Banco do Brasil, situada
na formosa Praça da Graça, em Parnaíba, confidenciou aos amigos o vaticínio que
acalentava como sonho de vida: “Meus filhos ainda um dia trabalharão nesse
Banco.” Percorreram toda a hierarquizada carreira funcional desse
estabelecimento, todos eles. Meu pai optou pelo quadro da Tesouraria. E tem a
sua explicação.
José tinha seis anos, quando meu avô
Gonçalo faleceu, vítima da diabetes, aos 41 anos de idade, longevo já, para a
época, em que a expectativa de vida do brasileiro se limitava a 37 anos.
Meu pai cresceu, portanto, numa família
de sete irmãos sobreviventes de doze nascidos, conduzida por uma matriarca
corajosa, de rosto tranquilo e doce, rasgado frequentemente por um sorriso
crítico e zombeteiro. Minha avó materna, escrevia com caligrafia impecável
textos gramaticalmente impecáveis. Falava sem incorreções e detestava
impropérios e desrespeito, preocupada com o bem-estar da família e o futuro da
prole. Criou os filhos com elevado senso de responsabilidade pelo próprio
destino, com mesa farta, mas severamente limitados os gastos ao consumo de bens
necessários à sobrevivência. Casa limpa, arejada e ensolarada através de seis
janelas e três portas, abertas para amplo quintal ajardinado, cheirando ao
jasmim do jardim nas tardes bucólicas e repleto de amplo conjunto de árvores
frutíferas: mangueira, laranjeira, sapotizeiro, bananeira, romãzeira, ateira,
umbuzeiro, limeira, cajueiro, araticunzeiro.
Nesse palco edênico, meu pai brincava de
Tarzã, saltando dos galhos das árvores. Ou embalava-se nos balouços que neles
dependurava. Ou fingia-se de pugilista nos ringues que armava à sombra das
copas generosas das mangueiras. Ou jogava futebol e, até, na estação chuvosa,
promovia a plantação de uma roça de milho e feijão. Não faltava a companhia do
irmão caçula nem a dos colegas, filhos das famílias da mesma Rua D. Pedro II,
vizinhança amiga e pacata.
A sua infância ainda recebeu a
influência do pai, originário do interior do Piauí, da fazenda de Esperantina,
hoje cidade, onde avultava a personalidade linda de minha bisavó, Loura, de
olhos azuis como o céu e doces como o mel.
Parnaíba, polo comercial e cultural de todo
o Norte do Piauí, naquela época não possuía hotel. A casa de meu avô abrigava
os primos de todo aquele interior, que vinham à cidade de Parnaíba, para
negócios e tratamento de saúde, assim como os filhos deles que vinham estudar
na cidade. A estada dos parentes era mais que uma novidade, constituía época de
prazeroso consumo de todo tipo de doces, que àquela época se fabricavam nas
fazendas do Piauí, terra de exuberante quantidade e generosa qualidade de
iguarias. Mesa farta e gostosa, armada às margens férteis do Rio Parnaíba. Foi
nesse contato e nesse ambiente que se forjaram os vínculos atávicos da
personalidade de meu pai. Não havia como não deixar-se cativar por tão generosa
Terra e por tão aconchegante clã!
José ligava-se por intenso vínculo
sentimental a toda a família. Era o sobrinho predileto da tia Carlotinha de
Nequinha, a mãe de José. Tia Carlotinha habitava a casa da sobrinha, desde o
falecimento do marido. Afinal de contas, naquela época ainda não existia
Previdência Social no Brasil, instituto esse que naqueles tempos ainda
engatinhava no Mundo todo. A sobrevivência, em casos de invalidez e morte, era
em geral garantida pela descendência, a geração seguinte dos filhos, a
realização prática da cobertura previdenciária por repartição simples, hoje tão
vilipendiada pelos doutos teóricos do neocapitalismo.
Tia Carlotinha, a Mãeminha, como era
conhecida na família, era um meigo vulto de mulher bonita. Branquinha, rosada,
cabelos brancos, esguia, trabalhadeira, conversadeira, sabia de histórias do
arco da velha e, o mais importante, exímia quituteira. Claro, os quitutes por
ela feitos tinham sobretudo um destino: o José.
Havia intensa sintonia sentimental entre
a tia velhinha e o elétrico sobrinho, garoto ainda, que adorava escutar-lhe as
histórias da família. José deu às duas filhas, os nomes da Mãe, Maria Edith, e
o nome da tia, Ana Carlota. Nós fomos para meu Pai, além de filhas,
extremamente amadas, as lembranças vivas e permanentes, de dois dos seus
grandes amores: a Mãe e a tia Carlotinha.
Garoto hiperativo e perspicaz, as
excentricidades de seu temperamento configuravam estripulias, conflitantes com
a pacata rotina da vida tranquila de uma família da classe média, daqueles
longínquos idos das décadas de 20 e 30, de pequena cidade brasileira.
José, ainda garoto de dez, onze anos,
era fascinado pela vida borbulhante de atividade do comércio de Parnaíba, onde
dois tios possuíam bem sucedido escritório de representações, tanto de empresas
estrangeiras, como de pequenos empresários, estabelecidos nas cercanias de
Parnaíba. Agenciavam importações e exportações. Eram ativos, inteligentes,
eficientes e confiáveis. Possuíam um Ford bigode, vestiam impecáveis ternos
brancos de linho inglês. Eram falantes e comunicativos, interessados por
novidades. José de Castro era um senhor exuberante, inteligente, louro, de
olhos azuis, de caráter generoso e impetuoso, comunicativo, lindo e atraente. Eram
homens de sucesso. José os admirava e eles apreciavam a esperteza do sobrinho.
José adorava trabalhar para eles porque, além de lhe render umas comissões e
lhe revelar os segredos da face econômica da esfinge da Vida, ainda o
introduzia no burburinho do cais do Porto das Barcas e na azáfama da alfândega
de Parnaíba.
Meu Pai deixou-se marcar, aí então, por
visão muito pragmática da Vida. Escrevia com correção. Expressava com clareza e
correção os pensamentos e os sentimentos. Conhecia os fundamentos da
Aritmética. Apreciava informar-se dos acontecimentos sociais e políticos,
através da leitura dos jornais, e, sobretudo, entender os acontecimentos
econômicos nacionais e internacionais. Mas, não se sentia nada atraído pela
vaidade da posse de vasta cultura, sem repercussão ponderável na rotina da vida
de um cidadão comum. Sem dúvida, aqueles dois tios tiveram enorme influência na
formação da personalidade de meu Pai. Ele percebeu que a Vida é uma conquista.
Ele aprendeu que os negócios e a Vida são jogos, que têm normas próprias. Ele
aprendeu que a Vida vale a pena ser vivida, quando se funda na fraternidade da
convivência e se adquirem os meios materiais consentâneos.
E isso já o caracterizava na
adolescência. Parnaíba nas décadas de 30 e 40 do século passado, restringia-se
a oferecer a instrução média aos seus cidadãos: dois estabelecimentos de ensino
primário, dois estabelecimentos de ensino secundário (o Ginásio Parnaibano e o
Colégio das Irmãs) e a União Caixeiral, que ensinava Contabilidade.
Meu Pai se contentou com esse grau médio
de aprendizagem. E o seu interesse teórico se limitava à prática da Língua
Portuguesa e da Aritmética, bem como aos acontecimentos históricos
contemporâneos, ocorridos no palco limitado dos grandes interesses políticos e
econômicos. É claro que isso tinha influência no seu convívio com colegas e professores
nas salas de aula do Ginásio Parnaíbano, onde a irmã Edmée trabalhava como
professora e secretária.
Certa vez, as divergências entre meu Pai
e os colegas e professor se inflamaram a tal ponto que a aula teve de ser
suspensa. Meu Pai ficou, então, preso na sala de aula, à espera do Diretor do
Ginásio Parnaibano. Minha tia sentia-se arrasada com a expectativa da punição,
que o irmão certamente iria padecer. Quando o Diretor chegou, se dirigiu à sala
de prisão e a abriu, lá não encontrou o transgressor da ordem. Meu Pai já achara
meios de escapulir para o seio aconchegante da Liberdade.
O Rio Parnaíba, sobretudo no Porto das
Barcas, era o grande espaço de divertimento da garotada. Nadar no rio. Escalar
o costado das barcas e lanchas. Delas saltar para mergulhar na água corrente e
profunda. Todas essas deliciosas emoções fascinavam a garotada da cidade
naquelas décadas. José, apesar de franzino, e isso preocupava muito a minha
avó, enfrentava qualquer dificuldade para participar dessa esfuziante farra
juvenil.
Na esquina fronteiriça à casa de minha
avó, residia um casal amigo, Sr. Cristiano e D. Bela, numa casa bem construída.
Era um casal sem filhos, que apreciava promover reuniões e festas. Sr.
Cristiano, funcionário da Alfândega, acrescia seus rendimentos com atividades
criatórias. Ele mantinha uma criação de vacas leiteiras no pequeno quintal de
sua residência. Por vezes, meu Pai e o irmão caçula eram obrigados a ir lá
beber leite mugido para se fortalecerem. Ele apreciava ver o Sr. Cristiano
desfilar pela rua, montado no seu reluzente, vigoroso, insubmisso e lindo
cavalo castanho, o Iconoclasta. Outras
vezes, assistia ao espetáculo de amansar os animais em plena Rua D. Pedro II.
Lá, no longínquo bairro da Coroa, na
margem esquerda do Rio, fronteiriça à cidade, Sr. Cristiano possuía um sítio.
Alí, na estação chuvosa, o caudal do rio se avolumava e descia rápido, forte e
revolto, confrontando-se violentamente contra as margens, fazendo redemoinhos
perigosos e até fatais. Certa vez, numa dessas épocas, minha avó sentiu
ausência de meu Pai, mais longa que a habitual. Preocupou-se. Procurou obter
notícias dele na vizinhança. D. Bela forneceu-lhe: deixei José lá na Coroa, no
meu sítio; ele não para de atravessar o Rio, de um lado para o outro; não quis
vir para casa comigo. Claro, minha avó foi busca-lo, puxando-o pelas orelhas.
Parnaíba era uma cidade progressista.
Ela possuía uma usina elétrica, movida a energia térmica, obtida da queima de
madeira. A usina funcionava todos os dias, mas apenas das 18 às 22 horas. Não
encerrava suas atividades, sem antes avisar a clientela com longo apito. Certo
dia, pelas 18 horas, meu Pai desapareceu e não se apresentou para a ceia.
Claro, outra vez a ausência provocou preocupação em minha avó. Onde estava
José? Simplesmente satisfazendo a sua curiosidade em saber como aquela usina
funcionava.
Frequentemente, meu Pai partia para o
interior do Estado, onde moravam os tios, os primos e os parentes do lado
paterno. Conhecia-os todos e todas as suas propriedades.
Apreciava passar férias em Miguel Alves,
cidadezinha comandada por José Rego, irmão de meu avô paterno, onde somente a
casa de meu tio avô, a do vigário e a Igreja tinham, àquela época, coberta de
telha. Grande era a mesa de refeições da casa de José Rego, ao redor da qual se
sentavam quase duas dezenas de pessoas para alimentar-se: pai, mãe, avó, filhos
e primos. A porta sempre aberta, ingresso franco para todos, parentes e amigos,
e por onde com frequência penetrava em passos rápidos, quase correndo, o
empregado carregando o boi, abatido para refeição!
Meu Pai montava em um cavalo e ia com os
primos, especialmente o José Rego Filho, visitar os parentes. Passava por Porto
Alegre, hoje Luzilândia, onde o primo Alcides de meu Pai, era líder político.
Alcides era um comerciante lúcido, comunicativo e vitorioso. O tipo de gente
por quem meu Pai nutria, desde criança, admiração. Esses eram os seus heróis.
Esses eram os entes que habitavam o seu imaginário infantil e adolescente.
Ia até Barras, hoje cidade, visitar os
Lajes, primos de meu Pai, que constituíam família importante da região, em razão
de suas propriedades, atividades comerciais e liderança política.
Tinha extraordinária veneração pelo tio
Alfredo, da região de Esperantina, como a avó Loura. Deleitava-se ouvir as
histórias da família e as lutas políticas do tio Alfredo e dos primos, sentados
em cadeiras confortáveis, no alpendre à frente da casa, de onde se abria vasta
visão panorâmica sobre a redondeza. Por vezes, assustava-se com a aproximação
de cavaleiros armados de facas e fuzis, para logo se acalmar percebendo que se
tratava dos primos, prevenidos contra qualquer emboscada de inimigos da
família. Esperantina também hoje é cidade.
Fez estreitos laços de amizade com as
pessoas de todo esse imenso clã. Mais tarde, aqui em São Paulo, as portas de
sua residência sempre estiveram abertas para aqueles parentes que a
procurassem. Acolheu-os sempre que precisaram dele, por motivos de estudo ou
por motivos de saúde, ou por motivos de negócio.
Pelo final da década de 40, meu Pai, já
funcionário do Banco do Brasil, decide transferir-se para São Paulo, onde já
trabalhavam dois irmãos. Ficaria próximo deles e de outro, o Haroldo, de quem
sempre foi muito amigo e residia no Rio de Janeiro. Fixou-se inicialmente na
cidade de Lins, onde conheceu um inspetor do Banco Bradesco, chamado Amador Aguiar.
Os dois fizeram sólida amizade. Sob influência do amigo, José tornou-se
acionista do Banco Bradesco. Essa amizade foi tão forte que se transferiu para
os sucessores de Amador Aguiar na Presidência daquela instituição, perdurando
até o fim da existência de meu Pai.
A mesma afeição que meu Pai dedicava ao
Piauí e aos clãs dos Rego e dos Amorim, ele nutria pela cidade e pelo Estado de
São Paulo e pelos paulistas. Orgulhava-se desta Terra e desta Gente. Além de
Amador Aguiar, estreito foi o laço de amizade com Ernesto Prado. Apreciava o
ambiente do Clube Hípico Paulista, onde mantinha cavalos que montava com assiduidade.
Esta era a sua grande diversão.
No ano de 1958, o tio Edgardo, irmão
caçula de meu Pai, conhece uma jovem de São Luís do Maranhão numa festa no
clube dos funcionários do Banco do Brasil, a AABB da Tijuca na cidade do Rio de
Janeiro. O pai da moça, percebendo que o namoro rumava para casamento, procura
o amigo, famoso inspetor do Banco, Rego Monteiro, que logo se tornaria o
Gerente instalador da Carteira de Colonização do Banco do Brasil. É, o Banco do
Brasil na época do Juscelino, época da Marcha para o Oeste, teve uma Carteira
de Colonização! Pois bem, quis obter informações sobre o provável futuro genro.
Rego Monteiro, confundindo meu tio com meu Pai, deu-lhe as melhores informações
sobre o rapaz, mas com uma advertência: “Uma coisa não posso deixar de
confidenciar-lhe, esse rapaz namora muito, mas não casa.”
José casou-se logo depois do irmão
caçula, com minha Mãe, Sônia, espírito prático e alma gêmea dele, dedicados à
família, sentimentalmente ligados ao clã, e formaram um belo e responsável
casal. Ambos, grandes cidadãos e grandes chefes de família.
Mas, não posso encerrar esta revelação
da insuspeitada rica personalidade de meu Pai, sem me reportar à grande amizade
que nutria pelo primo Francisco de Assis Gonçalves de Amorim Brandão, grande
engenheiro químico nuclear, antigo professor do Instituto Tecnológico da
Aeronáutica, o famoso ITA, em São José dos Campos, e Inspetor na AIEA em Viena
na Áustria. Essa amizade nasceu em Parnaíba, na infância, quando ia visitar
minha bisavó, que morava com a filha, a tia Eugênia, esposa do farmacêutico,
Zeca Brandão, que foi professor concursado da Faculdade de Farmácia de Pernambuco,
em Recife. Os dois se distraíam contando as novidades de Parnaíba, do Piauí e
dos parentes ou analisando os acontecimentos políticos e econômicos,
recentemente ocorridos no Brasil e no Mundo. O importante era o convívio e o
relacionamento entre os dois.
Encerrando, é preciso que fique bem
expresso o grande carinho e a imensa consideração que ele dedicava a esta Loja
Maçônica e aos irmãos que aqui encontrou. Cada pessoa desta confraria ocupava
um lugar especial no escaninho das amizades, que engrandeciam a pessoa de meu
Pai, iluminavam o seu espírito e inundavam de satisfação a sua existência.
Nota.- Panegírico proferido na loja maçônica paulista, a que o homenageado pertencia, pela filha caçula, Ana Carlota, em sessão realizada em sua memória.
Nota.- Panegírico proferido na loja maçônica paulista, a que o homenageado pertencia, pela filha caçula, Ana Carlota, em sessão realizada em sua memória.
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