sábado, 16 de junho de 2012

190. A Doutrina Invocada Pelos Advogados do Patrocinador



Ou
Reserva Especial É Alérgica à “Reversão de Valores”

Os advogados do Patrocinador passam, então, a justificar o argumento adotado para justificação da “Reversão de Valores” para o Patrocinador, exibindo a doutrina que, dizem, a fundamenta.

Advogados
Pois bem, dito isso, passamos a tecer considerações jurídicas sobre a legalidade da Resolução, em razão da lei regulamentada. O inciso IV do art. 84 da Constituição Federal Brasileira, dispõe que compete privativamente ao Presidente da República: “sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução”. Até aqui, os advogados.

Concordo.

Advogados
MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO ressalta que na doutrina há dois tipos de regulamento: o executivo e o autônomo, o primeiro complementa a lei, o segundo, inova na ordem jurídica. Informa que no direito brasileiro, excluída a hipótese do artigo 84, VI, da Constituição, com a redação dada pela Emenda Constitucional n.º 32, SÓ EXISTE O REGULAMENTO DE EXECUÇÃO, HIERARQUICAMENTE SUBORDINADO A UMA LEI PRÉVIA. Esclarece que o poder normativo da administração se expressa por decreto regulamentar, RESOLUÇÕES, portarias, deliberações, instruções. Por fim, ressalta que: EM TODAS ESSAS HIPÓTESES, O ATO NORMATIVO NÃO PODE CONTRARIAR A LEI, NEM CRIAR DIREITOS, IMPOR OBRIGAÇÕES, PROIBIÇÕES, PENALIDADES QUE NELA NÃO ESTEJAM PREVISTOS, SOB PENA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE (ARTS. 5º, II, E 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO). Até aqui, os advogados do Patrocinador

Depois de tudo o que expusemos nos artigos anteriores, creio que a doutrina acima não apoia a argumentação dos advogados. Ao contrário, condena-a. Com efeito, como já vimos, a Resolução CGPC 26 criou direito para o Patrocinador e obrigação para a EFPC. Ela não é, portanto, mera resolução EXECUTIVA, a legal. Ao contrário, ela é AUTÔNOMA, a ilegal. Com efeito, ela CRIA a “Reversão de Valores” para o PATROCINADOR, norma jurídica que contraria inúmeros dispositivos:

Da CONSTITUIÇÃO:
- O artigo 193. “A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.” Este artigo, o princípio jurídico básico de todo o Título da Seguridade Social, diz muita coisa importante. Primeiramente, ele afirma uma doutrina econômica, aquela de Adam Smith: a riqueza de uma nação não é o acúmulo de dinheiro e ouro, nem a extensão territorial, nem a qualidade do solo; é a produção nacional. Acrescenta-lhe que o trabalho produz o capital, a tecnologia, a inventividade, a criatividade, bem como a produtividade e a utilidade do solo, e tudo o de que se precisa para viver. E finaliza afirmando que o cidadão brasileiro obtém a sua subsistência mediante o próprio trabalho. Este artigo 193 articula o Princípio do primado do trabalho com o Princípio da Justiça Social, a justiça que reverencia a dignidade humana, outro princípio constitucional brasileiro, assegurando que a Sociedade e o Estado brasileiro proporcionarão essa subsistência na eventualidade de incapacidade física do cidadão para o trabalho. Este artigo, portanto, coloca a PREVIDÊNCIA SOCIAL SOB A UMBRELA DO TRABALHO E DA JUSTIÇA SOCIAL: o trabalho e o capital fornecem os recursos para a subsistência do cidadão incapacitado de trabalhar. Isso é PREVIDÊNCIA SOCIAL BÁSICA e COMPLEMENTAR. Em PREVIDÊNCIA SOCIAL o movimento dos recursos só possui uma ÚNICA DIREÇÃO, a saber, DO TRABALHO E CAPITAL PARA O CIDADÃO INCAPACITADO PARA O TRABALHO. Movimento em direção contrária infringe, pois, os dois princípios constitucionais básicos da PREVIDÊNCIA SOCIAL. Se esses dois princípios não se aplicarem no espaço constitucional e legal da Seguridade Social, não se aplicarão em nenhum outro. Serão absolutamente inócuos. Meros enfeites.
- O Artigo 201, onde os benefícios previdenciários elencados todos se caracterizam exatamente por essa propriedade, a saber, incapacidade de pessoa física para o trabalho.
- O Artigo 202, onde se afirma que a Previdência Privada é COMPLEMENTAR da Básica e “baseado na constituição de reservas que garantam o benefício CONTRATADO”, isto é, previdenciário, benefício a pessoa física incapacitada para o trabalho.

Da LC 109:
- Artigo 1º: “...baseado na constituição de RESERVAS que garantam o benefício (previdenciário, é claro)...”
- Artigo 3º-VI- “A ação do Estado será exercida com o objetivo de... - proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.” A adoção da “Reversão de Valores” para o Patrocinador é baseada em argumentação falaciosa, que violenta uma multidão de princípios constitucionais e legais exatamente para agredir este dispositivo legal.
- Artigo 8º: “Para efeito desta Lei Complementar, considera-se:
I - participante, a pessoa física que aderir aos planos de benefícios; e
II - assistido, o participante ou seu beneficiário em gozo de benefício de prestação continuada.” O Patrocinador é pessoa jurídica, não é pessoa física, não pode ser nem Participante nem Assistido de Plano de Benefício Previdenciário.
- Artigo 19: “As contribuições destinadas à constituição de reservas terão como finalidade prover o pagamento de benefícios de caráter previdenciário, observadas as especificidades previstas nesta Lei Complementar.”
- Artigo 20-§1º: “Constituída a reserva de contingência, com os valores excedentes será constituída RESERVA especial para revisão do PLANO DE BENEFÍCIOS.” A reserva especial é tão reserva previdenciária, quanto as outras duas, matemática e de contingência. Portanto, legalmente não pode ser gasta em pagamento de “Reversão de Valores” ao Patrocinador.
- Artigo 32: “As entidades fechadas têm como objeto a administração e execução de PLANOS DE BENEFÍCIOS DE NATUREZA PREVIDENCIÁRIA.” Logo, não podem gastar reserva com pagamento de “Reversão de Valores” ao Patrocinador.

Da LC 108:
- Art. 2º: “As regras e os princípios gerais estabelecidos na Lei Complementar que regula o caput do art. 202 da Constituição Federal aplicam-se às entidades reguladas por esta Lei Complementar, ressalvadas as disposições específicas.” A LC 109/2001 é a Lei Básica da Previdência Complementar, a que se reporta este artigo 2º da LC 108.
Isso tudo considerado, entendemos que a doutrina esposada pela Dra. de Pietro conduz à condenação da “Reversão de Valores” para o Patrocinador como ÓBVIA “OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE”.

Advogados
“Celso Antônio Bandeira de Mello, sobre a impossibilidade do ato normativo inovar em relação à lei regulada, registra que: [...] AO REGULAMENTO DESASSISTE INCLUIR NO SISTEMA POSITIVO QUALQUER REGRA GERADORA DE DIREITO OU OBRIGAÇÃO NOVOS. [...] há INOVAÇÃO PROIBIDA QUANDO SE POSSA AFIRMAR QUE AQUELE ESPECÍFICO DIREITO, DEVER, OBRIGAÇÃO, LIMITAÇÃO OU RESTRIÇÃO incidentes sobre alguém NÃO ESTAVAM JÁ ESTATUÍDOS e IDENTIFICADOS NA LEI REGULAMENTADA. A IDENTIFICAÇÃO NÃO NECESSITA SER ABSOLUTA, mas DEVE SER SUFICIENTE PARA QUE SE RECONHEÇAM AS CONDIÇÕES BÁSICAS DE SUA EXISTÊNCIA EM VISTA DE SEUS PRESSUPOSTOS, ESTABELECIDAS NA LEI E NAS FINALIDADES QUE ELA PROTEGE. Na LC 109/2001 há o estabelecimento de UM CRITÉRIO, de uma regra PARA REVISÃO DO PLANO que apresente DÉFICIT OU SUPERÁVIT, qual seja, revisão que adote O CRITÉRIO DA PROPORÇÃO existente entre as contribuições dos patrocinadores e dos participantes/assistidos ao plano. ASSIM, A RESOLUÇÃO, EM ANÁLISE, NÃO INOVA OU CRIA REGRA JURÍDICA, mas sim, em RESPEITO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE, implementa obrigação ou direito segundo critério ou regra jurídica previamente definidos pelo legislador, na LC 109/2001, PARA REVISÃO DE PLANO DE BENEFÍCIOS DESEQUILIBRADO, OU SEJA PLANO QUE APRESENTE SUPERÁVIT OU DÉFICIT.” Até aqui, os advogados.

Pronto. Estamos conversados. O Dr. Celso Antônio Bandeira de Mello, dizem os advogados, forneceu a doutrina esclarecedora e justificadora da “Reversão de Valores” para o Patrocinador: o critério da proporção é o critério que TUDO rege, em se tratando de distribuição de Reserva Especial, porque ele é USADO NO PRÓPRIO ARTIGO 20. Releiamos, então, o que ele ensina:
Inovação proibida: quando se possa afirmar que aquele ESPECÍFICO DIREITO, DEVER, OBRIGAÇÃO, LIMITAÇÃO OU RESTRIÇÃO... NÃO ESTAVAM JÁ ESTATUÍDOS E IDENTIFICADOS NA LEI REGULAMENTADA.
Responda o leitor, depois de lido tudo o que expusemos até aqui: a Constituição e a LC 109 proíbem, ou não, OBVIAMENTE O GASTO DA RESERVA ESPECIAL DO PLANO DE BENEFÍCIOS AO PATROCINADOR? Não existe outra resposta: ÓBVIO QUE PROÍBE. Logo, a doutrina exposta pelo Dr. Celso Antônio desautoriza a “Reversão de Valores” do Patrocinador, ao contrário do que afirmam os advogados do Patrocinador.
Os advogados do Patrocinador usaram a doutrina do Dr. Celso Antônio como um fórceps mental, uma prestidigitação mental e descobriram não um DIREITO, UMA OBRIGAÇÃO, mas o PRINCÍPIO DA LEGALIDADE no CRITÉRIO DA PROPORÇÃO, utilizado sempre nos artigos 20 e 21 quando eles tratam de CONTRIBUIÇÃO. Já debatemos esse assunto. Uma relação jurídica é a da Contribuição. Outra é a relação jurídica do Benefício Previdenciário. Em razão dos DOIS CONTRATOS, AMBOS, Patrocinador e Participantes, são sujeitos da relação jurídica da CONTRIBUIÇÃO, na extremidade da OBRIGAÇÃO. Mas, na relação jurídica do BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, A LEI e o próprio CONCEITO SÓ COLOCAM O PARTICIPANTE E REJEITAM OBVIAMENTE O PATROCINADOR. Na Contribuição, pois, há espaço para o uso do CONCEITO DE PROPORÇÃO, é ÓBVIO, entre Participantes e Patrocinador. No PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS É SIMPLESMENTE IMPOSSÍVEL. Com a RESERVA ESPECIAL SÓ SE PODE PAGAR GASTO PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO AO PATROCINADOR NÃO É GASTO PREVIDENCIÁRIO, é ÓBVIO, porque ELE NÃO É PESSOA FÍSICA. ESSE GASTO, pois, É CONTRÁRIO À CONSTITUIÇÃO E ÀS LEIS COMPLEMENTARES 109 e 108, como já vimos à saciedade. Logo, os artigos 20 e 21 da LC 109 usou o CRITÉRIO DA PROPORÇÃO NOS LIMITES EXATOS, a saber, onde estavam presentes Participante e Patrocinador, na relação da Contribuição. Não usou na relação do Pagamento de Benefícios (gastos de reserva previdenciária), porque não podia usar, PORQUE NESSA RELAÇÃO SOMENTE ESTÁ PRESENTE O PARTICIPANTE, pessoa física que nasce, vive e morre. Logo, a doutrina do Dr. Celso Antonio não ampara a interpretação dos advogados do Patrocinador. Ela embasa a OBVIEDADE de que a “Reversão de Valores” para o Patrocinador é uma INOVAÇÃO PROIBIDA.
Mas, alegam os advogados, o Critério da Proporção está USADO NO ARTIGO 21 e NO PRÓPRIO ARTIGO 20. É esse, portanto, o Princípio que se deve observar em QUALQUER CIRCUNSTÂNCIA, ATÉ MESMO ONDE NÃO PODE SER APLICADO! Pois bem, demonstrar-lhes-ei que esse critério da proporção é REPELIDO POR OUTRO, o Princípio da Legalidade, que está contido EM TODA PARTE (Constituição, Leis, Regulamentos etc), ou pelo menos DEVERIA ESTAR, e também está USADO NO PRÓPRIO ARTIGO 20 da LC 109, DE FORMA A PROIBIR PEREMPTORIAMENTE O SEU USO PARA JUSTIFICAR a “Reversão de Valores” para o PATROCINADOR. Sabem onde está? Não está apenas em TODO O CORPO DAS LEIS, NA CONSTITUIÇÃO, NAS LC 109 e 108, nos ARTIGOS e PARÁGRAFOS DESSAS LEIS, NOS ARTIGOS 20 E 21 da LEI 109. Ele está No PRÓPRIO NOME QUE O ARTIGO 20 ATRIBUI AO EXCEDENTE DISTRIBUÍVEL: Reserva Especial. RESERVA PREVIDENCIÁRIA, RESERVA QUE SOMENTE PODE SER GASTA NO PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. “Reversão de Valores” não é benefício previdenciário. Ninguém ousa dizer que é, advogado algum nem juiz algum. Nem mesmo os advogados do Patrocinador. Empresa, Patrocinador, não pode receber benefício previdenciário. Ninguém ousa dizer que pode, advogado algum nem juiz algum. Nem mesmo os advogados do Patrocinador. Conclusão: RESERVA ESPECIAL É ALÉRGICA, LETALMENTE ALÉRGICA, à “Reversão de Valores” para o PATROCINADOR.

Advogados
Nesse sentido, Pontes de Miranda disciplina: O PODER REGULAMENTAR É O QUE SE EXERCE SEM CRIAÇÃO DE REGRAS JURÍDICAS que alterem as leis existentes e sem a alteração da própria lei regulamentada. [...] O regulamento é proposta de interpretação ou conjunto de normas de direito formal administrativo. Nenhum princípio novo, ou diferente, de direito material se lhe pode introduzir. [...] Vale dentro da lei; fora da lei, a que se reporta, ou das outras leis, não vale. Em se tratando de regra jurídica de direito formal, o regulamento não pode ir além da edicção de regras que indiquem a maneira de ser observada a regra jurídica. Não pode o regulamento [...] a pretexto de interpretar, dizer algo diferente daquilo que o sistema jurídico permite que se leia na lei. A Resolução 26/2008 está vinculada à regra estipulada pela Lei Complementar. Logo, o artigo 15 da Resolução não poderia adotar outro critério, que não fosse o da “proporção contributiva do período” para fins de destinação da reserva especial entre participantes e assistidos, de um lado, e patrocinador, do outro. Até aqui, os advogados.

Os advogados misturam o que diz Pontes de Miranda com o que eles dizem. Deixe-se isso pra lá. Tudo o que está aí dito por Pontes de Miranda resume-se naquela norma que ele ministra: “Não pode o regulamento [...] a pretexto de interpretar, dizer algo diferente daquilo que O SISTEMA JURÍDICO permite que se leia na lei.” O que a LC 109 ordena? Que as reservas do Plano de Benefícios, que a RESERVA ESPECIAL SOMENTE PODE SER GASTA COM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, já provamos isso à saciedade. Logo, Pontes de Miranda não embasa a “Reversão de Valores” para o Patrocinador. Sabe qual o princípio que os advogados, citando Pontes de Miranda, estão pretendendo invocar a favor deles? O Princípio da Sistematicidade do Corpo de Leis de um País, o da Coerência. A LEI não pode mandar uma coisa na Constituição e outra na Lei. A Constituição manda que a renda do capital e do trabalho preserve a dignidade do cidadão incapacitado: os Princípios Constitucionais da dignidade humana e da justiça social. A LEI JAMAIS PODERÁ MANDAR, e já vimos que PROÍBE, QUE A RENDA DO CIDADÃO INCAPACITADO SEJA TRANSFERIDA PARA A EMPRESA CAPITALISTA! O argumento dos advogados não embasa a tese deles. Fundamenta, ao contrário, a tese da ILEGALIDADE, da INCONSTITUCIONALIDADE da “Reversão de Valores” para o Patrocinador. Bateu o nome Reserva Previdenciária Especial cospe-se fora “Reserva de Valores” para Patrocinador.

Ainda existe um último autor citado pelos advogados do Patrocinador. Farei um texto somente para ele, porque este já se acha demasiadamente extenso.







2 comentários:

  1. Dileto amigo Edgardo,

    Aprecio muito esta sua vertente contestatória o que demonstra seu profundo conhecimento na área do Direito. Você vem muito claramente escancarar as falhas argumentações dos advogados do patrocinador, que à maneira de Voltaire, têm a estratégia de mentir mil vezes : "Menti!, menti! Que da mentira sempre algo resultará."
    Só esperamos que os juízes julgadores tenham sabedoria suficiente para distinguir a mentira da verdade.
    Forte abraço!

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  2. Amigo Ari Zanella
    Nós estamos obsevando, às escâncaras, que a advocacia é uma PROFISSÃO, meio de obter subsistência e, para alguns, até um meio de obter VIDA FAUSTOSA. Então, você tenta defender o seu cliente.
    Um abraço do
    Edgardo

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