terça-feira, 18 de dezembro de 2012

234. O Plano de Benefícios Previdenciários

Há três anos que me dedico a ler a Constituição Federal e a LC 109/2001 para entender o instituto da Reversão de Valores. Nesse ínterim, redigi dezenas de textos sobre a matéria e os publiquei neste meu blog. A minha intenção foi, e ainda é, provocar o debate. Pensava que poderia provocar reação no universo dos funcionários do Banco do Brasil, que são advogados, e até dos que exercem a profissão de advogados em nosso meio, os advogados da PREVI e do Banco do Brasil, ou na área do Regime da Previdência Complementar no Ministério da Previdência Social. Nenhuma reação. Ou não existo, ou pouco estão ligando para o que pensam os que vivemos na planície social, ou nada tem a contestar e esclarecer.

No ano passado tive a oportunidade de ter acesso a dois trabalhos sobre esse assunto, oriundos, um da antiga SPC do Ministério da Previdência Complementar, dirigido ao Senado Federal em resposta a pedido de esclarecimentos feito pelo Senador Álvaro Dias, o outro do Ministério da Previdência Social, dirigido à Câmara dos Deputados, em resposta a indagações formuladas pelo Deputado Chico Alencar. Refleti sobre ambos e sobre ambos publiquei aqui textos de minuciosa análise.

No início deste segundo semestre do corrente ano, por fim, tive a oportunidade de meditar sobre duas palestras, proferidas por eminentes servidores do Ministério da Previdência Social, participantes da equipe gestora do Regime da Previdência Complementar. Estampei aqui vasta série de indagações sobre a conferência proferida pelo eminente Professor Dr. Ricardo Pena, em recente seminário promovido pela ANABB em Brasília. Embora não tenha merecido a contestação dos meus argumentos, que caracterizam a ilegalidade e inconstitucionalidade da REVERSÃO DE VALORES, aquelas exposições, que tem origem no Ministério da Previdência Social, revelam as razões que se julga fundamentam a normalidade legal desse instituto.

Sinceramente, acho que meus argumentos possuem valor hermenêutico bem superior a todos esses trabalhos exibidos pelas autoridades citadas, inclusive os que são apresentados como base jurídica da invenção do instituto da Reversão de Valores e a proposta de resolução sobre a Retirada de Patrocínio, que também analisei. E essa convicção foi reforçada quando li o parecer jurídico do Desembargador aposentado, Dr. Sérgio de Andrea Ferreira, encomendado pela FAAB, sobre a Retirada de Patrocínio, e encaminhada ao Ministério da Previdência Social, área do Regime de Previdência Complementar.

Sei que os Consultores do Ministério da Previdência Social bem como os quadros jurídicos do Banco do Brasil e da PREVI são tão competentes quanto o ilustre Desembargador Sérgio de Andrea Ferreira. Gostaria, portanto, de ler pareceres por aqueles produzidos, na justificativa da Reversão de Valores ou da proposta de Retirada de Patrocínio, bem como nas defesas da Reversão de Valores perante os tribunais, com o mesmo requinte de argumentação jurídica que apresenta o elaborado pelo citado Desembargador.

Ele inicia-se focando o Plano de Benefícios Previdenciários. Plano, segundo o Houaiss, é um projeto (antecipação mental) de uma série de ações que se devem realizar para conseguir determinada coisa (um objetivo). É o conjunto de medidas (políticas, sociais, econômicas etc.) que se tomam para atingir um objetivo. É a maneira como uma determinada coisa está estruturada. Assim, entendo que Plano de Benefícios é a estrutura (organização, ordenamento) do conjunto de ações que a lei manda que se façam para que se efetuem os pagamentos de benefícios previdenciários.

Ora, a explicação do autor nos orienta para entender que Plano de Benefícios Previdenciários é algo muito mais rico: é um polo individualizado, não-personalizado, com legitimidade jurídica para ser referencial de direitos e obrigações. Assim, o Plano de Benefícios Previdenciários não é uma pessoa jurídica, isto é, não é sujeito de direitos nem de obrigações, mas é uma individualidade, isto é, algo único, distinto de tudo mais, separado, que o instituto jurídico reconhece como um polo de relações jurídicas, isto é, de relacionamentos regulados por normas jurídicas, as que criam direitos e obrigações.

Acho que posso dizer que o Desembargador esclarece que o Plano de Benefícios Previdenciários é como uma central de relações jurídicas, inconfundível, separada, identificável e reconhecida como tal na Ordem Jurídica, sem que, todavia, seja uma pessoa jurídica, isto é, “uma unidade de pessoas naturais ou de patrimônios, que visa à consecução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como SUJEITO DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES”, como a define Maria Helena Diniz. Toda essa descrição me faz imaginar o Plano de Benefícios Previdenciários à moda daquela central telefônica, diante da qual o operador se posiciona para providenciar as ligações de cada telefonema.

É uma central de relações jurídicas, cuja estrutura foi erguida na própria Constituição Federal (artigo 202 §§ 1º e 2º) e completado o edifício pela LC 109, onde ele é objeto central. A LC 109 trata do Plano de Benefícios antes mesmo de caracterizar as EPCs, cujo objetivo principal, a lei diz textualmente, é instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário (artigo 2º da LC 109). O Desembargador faz notar que, citado em dois parágrafos do artigo 202 da Constituição Federal, o Plano de Benefícios tem status de instituto constitucional.

Explica que o Plano de Benefícios não é o Regulamento. O Plano de Benefícios compreende além do Regulamento, um grupo de pessoas e um patrimônio.

O Regulamento contém o ordenamento dos negócios jurídicos, isto é, dos contratos que devem produzir o bem econômico que pretendem obter as pessoas neles envolvidas. Entendo que o autor teve o propósito de frisar que o Regulamento contém as normas, as cláusulas da PROPOSTA de DOIS NEGÓCIOS JURÍDICOS, a saber, o convênio de adesão dos Patrocinadores ou Instituidores ao Plano de Benefícios e os contratos de Participação dos Participantes no Plano de Benefícios.

Esses contratos são negócios jurídicos, isto é, atos humanos voluntários, postos pelo agente com o propósito de criar direitos e obrigações de seu interesse, conforme Nelson Palaia. Isso se concretiza através da assinatura do Convênio de Adesão ao Plano de Benefícios para assumir-se o status de Patrocinador, e mediante a Inscrição no Plano de Benefícios para adquirir-se o status de Participante, respectivamente. E esses atos são atos jurídicos perfeitos, isto é, geram direitos subjetivos (os assinantes adquirem o poder de obter as vantagens contratadas) e obrigações consolidadas (os assinantes estão obrigados a cumprir com as obrigações contratadas).

O Regulamento, pois, agrupa pessoas, físicas e jurídicas, que são membros, PARTÍCIPES do Plano de Benefícios, isto é, pessoas que possuem direitos ou obrigações, gerados nos negócios jurídicos do Plano de Benefícios. Cita três categorias de Partícipes, a saber, os Patrocinadores, os Participantes e os Assistidos. Cada categoria tem os seus direitos, interesses juridicamente tutelados, isto é, protegidos pelo Direito, por Lei. Tem também seus deveres, obrigações, pretensões, ações.

Permito-me acrescentar uma quarta categoria de Partícipe, a saber, a EPC, ou melhor, a EFPC de que temos interesse de investigar neste texto.

Isso que aí está explicado ratifica o que em meus textos venho afirmando que leio na LC 109. Aquele meu texto “Uma Leitura da LC 109” repetiu um aspecto importante que venho ressaltando em meus escritos: a relação jurídica previdenciária não é uma relação simples; ela resulta de dois negócios jurídicos, a saber, o convênio de adesão do Patrocínio entre Patrocinador e EFPC e o contrato de Participação entre Participante e EFPC.

Não existe contrato de previdência complementar entre Patrocinador e Participante. Existe um Plano de Benefícios Previdenciário, ofertado pela EFPC, que tem a garantia do Patrocínio, negócio jurídico entre EFPC e Patrocinador. O empregado só pode inscrever-se como Participante em Plano de Benefício que, antes, o seu empregador a ele haja aderido no status de Patrocinador. A relação jurídica previdenciária é o resultado desses dois negócios jurídicos do Patrocínio e da Participação, que dizem respeito ao mesmo objeto, a saber, o Plano de Benefícios Previdenciários. Patrocinador e Participante estão unidos pelos resultados desses dois contratos. O Participante tem o direito de exigir o benefício previdenciário da EFPC e tem o direito de exigir do Patrocinador o cumprimento das obrigações de Patrocínio que contratou com a EFPC. O Desembargador lá adiante, como veremos, explica como nasce, é e funciona essa relação previdenciária, exatamente do inter-relacionamento desses dois negócios jurídicos.

Quando leio aqueles documentos, onde as Autoridades da Previdência Complementar ministraram esclarecimentos ao Senado Federal e à Câmara de Deputados, fica-me a impressão de que um dos motivos que fazem aquela argumentação carecer de força de convencimento, consiste exatamente nisso: ela apresenta a relação jurídica previdenciária como se fosse uma relação jurídica direta entre Patrocinador e Participante.

Não. A relação previdenciária é indireta, através da EFPC e de seu Plano de Benefícios Previdenciários. Esta se compromete a recolher as contribuições do Patrocinador e do Participante, a formar as reservas do Plano de Benefícios, a administrá-las e a gastá-las no pagamento desses benefícios. O Patrocinador se compromete a patrocinar o Plano de Benefícios Previdenciários. Ele se compromete a contribuir para a formação do patrimônio previdenciário do Plano, isto é, patrimônio que seja um montante tal de reservas que todas as obrigações contratadas sejam honradas, e a supervisionar a EFPC de modo tal que ela se mantenha sempre em condições de cumprir sua missão. Ele é a principal garantia de que reservas não faltarão para que a EFPC possa desincumbir-se da missão previdenciária contratada. Ele é a garantia dessa provisão. O Patrocínio é CONTRATUALMENTE APENAS ASSUNÇÃO DE UMA OBRIGAÇÃO PARA OBTER UM DIREITO: O DE EXIGIR QUE A EFPC HONRE O COMPROMISSO DE PAGAR OS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS.

A pessoa jurídica responsável pelo benefício previdenciário é a EFPC, UNICAMENTE A EFPC. O empregador é apenas parceiro da EFPC nesse negócio jurídico do BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, que assume a forma jurídica e econômica de um Plano. O Patrocinador é a PRINCIPAL GARANTIA do sucesso desse Plano. O Desembargador explia isso mais adiante.

Onde essa relação previdenciária se perfaz? No espaço jurídico do Plano de Benefícios Previdenciários, esse polo ou essa central de relacionamentos jurídicos, onde a atuação dos atores, dos Partícipes (Patrocinador, EFPC, Participantes e Assistidos), se opera sob a égide dos dois negócios jurídicos: o do Patrocínio e o da Participação.

Fiquemos por aqui hoje. Meus textos, estou convencido, têm fundamento jurídico sólido.






2 comentários:

  1. O fato de NÃO existir relação jurídica direta entre o Patrocinador e o Participante, parece-me que elucida toda a questão. Mais uma evidencia de que o Patrocinador não pode se beneficiar com eventual REVERSÃO, além de que eventual retirada de patrocínio deve ser precedida de aporte de recursos que possibilitem o pagamento dos benefícios até que não haja participante a ser contemplado.
    O articulista está coberto de razão.
    Parabéns por seu trabalho exemplar, altamente esclarecedor.

    Luiz Faraco, de Florianópolis (SC)

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    1. Estou com você, Faraco. Veremos noutros textos a magistral lição dada pelo Desembargador.
      Edgardo

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