sexta-feira, 29 de novembro de 2019

473 Salim Mattar, Constituição, ONU e CASSI



Acabo de ler no Google que o Secretário de Desburocratização do atual governo Brasileiro, o do ínclito Presidente Jair Bolsonaro, cidadão temente a Deus, segundo se declara, e militar da reserva, cujo lema de governo é Pátria amada, em quem votei para a Presidência da República, em razão do seu programa de extirpação da corrupção na administração pública,  é o senhor Salim Mattar, empresário exitoso, dono da maior empresa brasileira de aluguel de carro com ramificação em vários países da América do Sul, cidadão, sem dúvida, respeitável pelo que já realizou.

A notícia relatava a entusiástica homenagem que a classe industrial mineira lhe prestou e a opinião que ele expressou nessa ocasião sobre a Constituição Brasileira, que ele deprecia por ser social democrática: “Ele condenou a constituição de 1988 e os “90 direitos e 7 deveres” que garantiu ao cidadão”.

Tentei, sem sucesso, obter informações sobre o nível de instrução do Sr. Salim Mattar. Queria saber se tinha formação acadêmica e de que nível e qualidade. Seja como for, estranho, e muito, que haja aceito o cargo de Secretário da Desburocratização, confundindo burocracia com Seguridade social. Seguridade Social, garantia estatal de subsistência, previdência e assistência à saúde, nas situações adversas da vida, é aspiração multimilenar humana que se extrai desde os primeiros escritos humanos sumerianos, há uns cinco mil anos. Passaram a integrar as constituições dos Estados, desde o final do século XIX, como direito fundamental social dos povos, porque penhor da paz social, condição imprescindível para que exista progresso. Eu recebi, em meu gabinete de Gerente da Carteira de Câmbio do Banco do Brasil, na década de 70 do século passado, notáveis empresários de São Paulo, chorando as quebradeiras que os operários, chefiados pelo notávl líder trabalhista Lula provocavam nas fábricas, e revelando que pretendiam transferir-se para o estrangeiro.

Visitei o portal da Localiza na Internet e percebi que o Dr. Salim deve ser um entusiasta da liberdade. Ficou-me a impressão de que ele pensa que liberdade é fazer tudo o que se deseja e pode conseguir, e confunde liberdade com livre arbítrio. Não me parece que já haja percebido que volumosos livros textos de Psicologia dos mestres mundiais das universidades norte-americanas tratam da atividade humana como se fosse um produto do cérebro tal qual é a urina dos rins e a bílis do fígado. O conceituado livro texto de Neurologia, “Cem Bilhões de Neurônios”, do professor Roberto Lendt, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, informa que atualmente se discute se existe o livre arbítrio. Creio que o Dr. Salim ainda não percebeu que a ciência do Direito hodiernamente se reporta ao crime como se fosse uma anomalia e o criminoso como se doente fosse, uma vitima de doença contaminável, que deve ser apartado da comunidade para cura, mas, logo, sanado, precisa nela reintegrar-se, porque ela é o seu hábitat natural.

A liberdade, pois, consistiria no trabalho conjunto de formular a Lei que embasa a sociedade aglutinando consistentemente as pessoas, proporcionando a cada uma a garantia de atividade producente de sua vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na alma, e no fato de que, como afirmou Péricles, há dois mil e seiscentos anos: “Sou livre porque não obedeço a homem algum, mas somente à Lei, que eu mesmo elaborei.”

Sim, a sociedade é uma criação do homem, mas o homem a cria por uma tendência natural, como a formiga fabrica o formigueiro e a abelha a colmeia, porque esses três animais são animais sociáveis, como explicava Aristóteles, e à feição daquilo que ele presentemente é e necessita,. Mas, a primeira condição, para que haja sociedade humana é que haja paz, tranquila coexistência, concordância, entre a amplíssima multidão de diversidades. E nos tempos atuais, a Era da Informação, essa concordância se fundamenta na igualdade efetiva de direito à vida boa como já pensavam Platão, Aristóteles e Epicuro, há dois mil e seiscentos anos, e que este último condensava em pequena e expressiva máxima: “uma vida boa, sem dor no corpo e sem angustia na alma”. O Estado é um meio, o mais importante meio para que todos os cidadãos realizem o seu projeto individual de vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na alma, em qualquer circunstância da vida, desde que viva segundo a Lei.

Esta, portanto, é a essência de qualquer Constituição moderna – “Uma vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na alma.”- em qualquer circunstância da vida, para qualquer pessoa humana, que, sem consulta prévia, foi lançada e aceita na sociedade dos homens.

É por isso, que julgo correta e louvável a Constituição Brasileira Social Democrática, haja vista os artigos:.
3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
 I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 
e
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Artigo com redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)
que os governos até hoje eleitos, todavia, vêm impedindo cumprir-se plenamente: “Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
 I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.

Nada obstante, o TÍTULO VIII - Da Ordem Social impõe ao povo brasileiro a orientação social democrática preponderante no ambiente cultural da civilização contemporânea:  “Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.”, que os capítulos detalhadamente prescrevem, esclarecendo, tratar-se de obrigação dos Poderes Púbicos e de toda a sociedade, e consequentemente, como o perfaz explicitamente nos artigos 201 e 202, das entidades dedicadas à realização de negócios, as produtoras da riqueza nacional: Capítulo II-Da Seguridade Social e da Saúde, Capítulo III-Da Educação, da Cultura e do Desporto, Capítulo IV-Da Ciência e Tecnologia, Capítulo VI-Do Meio Ambiente, Capítulo VII-Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso.

Assim, não consigo entender como Dr. Salim, cidadão que deve possuir excepcional nível de conhecimento e cultura para ser convidado a  ocupar a Secretaria de Desburocratização, não apenas confunda desburocratização com a eliminação das instituições consideradas atualmente pelo mundo culto como as produtivas de uma sociedade cujo ambiente é propício a promover “a vida boa, sem dor no corpo e sem angústia na alma” em cada participante individual, como, ao que parece, julga poder até realizar esse plano sem substituir essa Constituição por outra de um Estado  simplesmente liberal.

A substituição da atual Constituição Brasileira Social Democrática pode até ser possível, penso, mas de forma autoritária, não democrática e confrontando as diretrizes da Organização das Nações Unidas à qual o Brasil se vangloria de pertencer e anualmente proferir o discurso de abertura dos serviços, cuja Declaração dos Direitos Universais do Homem contém os seguintes artigos:
Artigo I Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.
Artigo III Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Artigo XXII Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade.
Artigo XXIII 1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. 4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses.
Artigo XXIV Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas. Artigo XXV 1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social.  Artigo XXVI 1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz. 3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.  Artigo XXVIII Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados. Artigo XXIX 1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível. 2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. 3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas. Artigo XXX Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos.”

Com base nessa Declaração de Direitos, a ONU não se contenta com restringir-se a avaliar os países pela produção de riqueza, o PIB. Ela instituiu o índice de Felicidade Nacional que abarca a avaliação de nove áreas da vida humana em sociedade: bem-estar psicológico, saúde, uso do tempo, vitalidade comunitária, educação. cultura, meio ambiente, governança e padrão de vida. Segundo essse Índie, no ano de 2017, o país mais feliz do mundo era a Noruega, enquanto os Estados Unidos ocupavam apenas o 13º lugar e a China o 86º. Como se percebe, a ONU valoriza os países, segundo  um critério social democrático de sociedade e de Estado, inspirado na mentalidade prevalecente nos altos nichos culturais da civilização contemporânea.

Assim, acho-me justificado em divergir não apenas da opinião do Dr. Salim sobre a Constituição Brasileira social democrática, como também de vários critérios básicos da reforma da previdência social promovida pelo eminente Ministro Paulo Guedes, como já manifestei aqui neste blog em textos anteriores, especificamente na substituição da fórmula da  seguridade pela do financiamento preponderantemente pessoal. Discordo do espírito que pervaga a formulação da LC108/01, bem como da recente RESOLUÇÃO Nº 23, de 18 de janeiro de 2018 da CGPAR, que orientou o Banco do Brasil em toda essa longa e dolorida negociação entre Banco do Brasil e funcionários sobre a capitalização da CASSI, por motivos que também já expus em textos deste blog sobre a matéria.



















































sábado, 16 de novembro de 2019

472. Os Primórdios da Atual Economia de Mercado


A História das Ideias reporta-se a um período com o nome de Renascença, que abarca, de modo amplo, os séculos XV e XVI da Era Cristã, fim do século XIV e começo do século XVII. É o período de transição da Idade Média para a Idade Moderna, Renascença ou Renascimento, isto é, reinício de uma mentalidade em que a Humanidade, como nos áureos tempos das cidades gregas, do helenismo e do Império Romano, se orienta  na sua vida individual e nos seus relacionamentos individuais e grupais, pelo objetivo da fruição de uma boa vida terrena.


Findara-se a época das Cruzadas. Restabelecera-se o comércio das cidades italianas com o mundo árabe. Quando, então, se falava em Mundo inteiro entendia-se o Mundo Mediterrâneo, limitando-se, a Leste, às terras às margens do mar Negro e mar Cáspio, e à Rússia Europeia, onde se incluíam China e Índia; a Sul, à Ásia Menor e o Norte da África; a Norte, às terras às margens do Mar do Norte e Mar Báltico; e, a Oeste, às Ilhas Britânicas e às costas marítimas do Oceano Atlântico. Esse Mundo estava ocupado por cristãos em quase toda Europa e por muçulmanos na África, Ásia Menor e parte da Espanha.

Na virada do primeiro milênio da Era Cristã, apogeu do mundo feudal, a Europa, inclusive suas cidades, era propriedade de uns poucos reis, sustentados por grande número de senhores feudais aos quais doaram terras num pacto de defesa da soberania real. Esses feudos eram, pois, propriedades fortificadas de guerreiros e mosteiros (estes possuíam terras por doações dos proprietários que pretendiam assegurar, quando mortos, o ingresso no Reino dos  Ceus), que abarcavam até mesmo as antigas cidades do Império Romano, que haviam entrado em decadência, provocada pela insegurança diante dos ataques dos conquistadores bárbaros e árabes.

Como se vê a vida humana naqueles tempos medievais corria imenso e permanente perigo da parte da bandidagem local e da pirataria estrangeira de húngaros, normandos e árabes, inclusive nas cidades. O indivíduo humano sujeitava-se à servidão para garantir a sobrevivência. A vida das pessoas, pois, se circunscrevia ao âmbito do feudo, onde tudo o que se produzia era propriedade do senhor feudal. O mercado era, pois, reduzido ao escambo local e marginal de bens sobrantes dos reduzidos e necessários para a sobrevivência dos servos e a opulência dos senhores seculares e religiosos.

No século XIV essa situação já se modificara no Norte da Itália com a cessação das Cruzadas e das invasões normandas. Comerciantes das cidades do Norte da Itália já haviam voltado a viajar para comprar produtos onde eles eram mais baratos e vender onde eles eram mais caros, ou para produzir bens de que a população necessitava. O comércio cresceu, a indústria cresceu e a vida nas cidades se tornou mais livre e confortável que no campo. O surto econômico italiano contagiou o Mundo inteiro.

No curso de três séculos mudou a economia. A economia não era mais local, de sobras, e de escambo. Ela era mundial, monetária, capitalista, exercida por pessoas especializadas, que gozavam de vida abastada nas cidades, os burgueses, ou por associações de trabalhadores, que proviam a subsistência dos trabalhadores. Os comerciantes transportaram essa nova economia para toda a Europa, através de rios e mares, de barco impulsionado pelo vento, mas, sobretudo, a remo, ou por carroça puxada a cavalo por vias mal carroçáveis.  Os capitalistas fabricavam mercadorias em indústrias movidas a energia hidráulica ou eólica, os moinhos hidráulicos ou de vento. Brotaram as cidades nos estacionamentos das vias de transporte, nas encruzilhadas, nas vizinhanças dos mosteiros e dos castelos. O mundo inteiro da Renascença era um mercado mundial. Os banqueiros viabilizavam o pagamento nas diversas praças mercantis do mundo e financiavam o poder do papa sobre os reis, e dos reis sobre os senhores feudais, bem como suas guerras de extensão terrestre da soberania e acúmulo de riqueza.

O trabalho agrícola granjeou maior qualificação com nova modalidade de repouso da terra, mais extensão da tração bovina do arado, início do emprego da tecnologia do enxerto, e, sobretudo ampliou-se com a  derrubada das florestas (toda floresta da França foi abatida) e conquista de terras ao mar e o controle dos cursos d’água.

A sociedade modificara-se. Não mais se restringia a senhores e servos, nobres e plebe, ricos e pobres. A terra não mais era a origem única da riqueza. O comércio com ela competia, e até a suplantara. Existia, agora, a nobreza (reis, clero e senhores feudais seculares), burgueses (comerciantes e banqueiros ricos), trabalhadores associados, súditos e servos. Os burgueses já eram mais  ricos que os senhores feudais e até adquiriam terras dos fidalgos. Trabalhadores e súditos tinham condições de subsistência superiores às dos servos. Associações de trabalhadores, hunas e guildas, empolgavam o poder político das cidades, conquistavam-lhes a liberdade e democratizavam nível de vida superior para toda a população, inclusive a seguridade social, subsistência e saúde, para os inválidos. A burguesia se aliava aos reis para submeter os senhores feudais e conquistar a independência para as cidades. A vida na cidade era mais aprazível que nos feudos rurais e permanente atrativo para os servos.
A mentalidade da sociedade humana também se modificava. “A transição foi tão gradativa que somente depois de mais um século é que os homens começaram a sentir-se em um mundo diferente.”, afirmou Wiil Durant.  Dante Alleghieri, o último grande vulto literário da cultura medieval, é marco histórico da mentalidade agostiniana da Idade Média, com sua Divina Comédia, redigida em italiano, o idioma do povo, não em latim, o idioma dos literatos: o homem nada é, deus é tudo; o homem tem natureza perversa e propensa para a maldade, degenerada pelo pecado, mas Deus o ama e quer que pratique o bem e pode fazer praticá-lo; esta vida, pois, é época de prova e de expiação do pecado, abstendo-se da fruição dos prazeres da vida, e dedicando-se à adoração da Eucaristia nas vinte e quatro horas do dia; através da infusão da graça, Deus regenera a natureza dos eleitos e nele opera maravilhosas coisas boas, de modo que, uma vez mortos, ressuscitarão para a vida eterna feliz, no Ceu, na companhia de Deus, provavelmente passando por um período de purificação no purgatório, enquanto a multidão dos reprovados, que levarem a vida praticando o mal e esbaldando-se nos prazeres mundanos, passará a vida eterna nos mais tremendos e insuportáveis castigos existentes, no fogo do Inferno; a vida terrena é época de provação, de expiação dos pecados e preparação para a vida futura feliz na contemplação de Deus, no Ceu, após a morte; o cristão é cidadão da Cidade Celeste, ensinou Santo Agostinho.  

Nada obstante, Dante, essa grande personalidade de mentalidade profundamente medieva,l já emitia no século XIII sobre assunto político ideia dissonante da que o Papa abraçava. Ele escreveu o livro De Monarchia, onde defendeu a soberania do Imperador do Sacro Império Romano nos assuntos terrenos, limitando-se sua sujeição à soberania papal nos assuntos religiosos. Segundo Dante, a atividade humana distintiva é a atividade intelectual. Esta só se desenvolve em sua plenitude num ambiente de paz. A paz só se consegue através de um governo universal, único para o mundo inteiro. O governo universal é imagem terrena do governo celeste. Cristo nasceu sob o governo de Augusto para aprovar o governo universal, então, quase completamente realizado, cuja autoridade foi aprovada pelo próprio Jesus Cristo: “dai a César o que é de César.” Assim, a autoridade do Imperador do Sacro Império Romano não deriva do Papa, mas sim, da lei natural que põe a ordem nas coisas, e é a vontade de Deus em exercício. O Imperador do Sacro Império Romano, portanto, só se subordina ao Papa em matéria religiosa, sendo soberano nos assuntos da esfera terrena. Esse livro póstumo teve grande repercussão, foi queimado em público por ordem papal, permaneceu no Índex dos livros proibidos pela Igreja durante quase seis séculos.

Filipe, o Belo, rei da França decidiu impor tributo sobre o clero. O Papa discordou. O rei francês provocou a transferência da corte papal de Roma para a cidade francesa de Avignon, onde permaneceu por um século (o cativeiro de Avignon), provocando a existência simultânea de dois papas, sustentado cada um por santos da Igreja, e até três papas.

O frade franciscano Guilherme de Ockham afirma, naqueles tempos, que o universal não existe, só existe o individual. O universal é mero signo, sinal, nome. Ficou, então célebre, com a expressão de um princípio, que é básico no sistema científico hodierno, “a navalha de Ockham”: “não se devem multiplicar os seres desnecessariamente”. Não existe o movimento, existem coisas moventes; não existe substância, existe conjunto de qualidades; não existe causa eficiente nem causa final. Entre duas teorias científicas satisfatórias, a mais simples é preferível. Essas ideias individualistas de Ockham estão na origem do pensamento político liberal e da ciência experimental que hoje se praticam. E Ockham aplicou-as à disputa política do Papa e do Imperador: o Papa não recebeu de Cristo a plenitude do poder; se a tivesse recebido, ela seria a mais ampla escravidão possível, o que contraria o Evangelho, a mensagem da libertação. Não é o Papa nem os Concílios que formulam os dogmas cristãos, mas a Igreja, isto é, a comunidade dos fieis que os determina, pois esta é que é iluminada pelo Espírito Santo. Teocracia e aristocracia não se coadunam com a Igreja. Ockham se acha na origem do princípio do primado do indivíduo (a liberdade individual, a autonomia do indivíduo) que embasa o espírito ds modernidade, que gerou o direito subjetivo e a ciência do direito civil.  Suas teses foram condenadas e sua leitura proibida em Paris.

Em 1304 nasceu Petrarca, o Pai da Renascença, sobre o qual escreveu Will Durant: “O primeiro homem moderno, não só redescobriu o mundo clássico, como desviou o foco do sobrenatural para o mundo natural... moderadamente devoto, uma vez ou outra interessado na outra vida, ... criou o espírito da Renascença focado no homem e na terra, na legitimidade do prazer dos sentidos e na glória da morte como substitutivo para a imortalidade do indivíduo. Admite-se ter sido o primeiro humanista, o primeiro escritor a defender com clareza e vigor o direito de o homem a interessar-se por esta vida, de gozar e aumentar suas belezas e de esforçar-se por merecer o respeito da posteridade....” E Will Durant continua:  Em “De Vita Solitaria” louva a solidão como remédio que curava, mas não alimentava... Provocou o ódio da classe médica, exortando o Papa a precaver-se contra as receitas médicas. Acusava os advogados de criarem litígios sobre questões triviais. Esteve na iminência de ser excomungado pelo Papa. Escreveu De Otio Religiosorum e pensou ser monge... Em Trionfi, livro de poesias, exalta o triunfo do desejo sobre o homem, da castidade sobre o desejo, da morte sobre a castidade, da fama sobre a morte, do tempo sobre a fama, e da eternidade sobre o tempo. Pediu perdão pela sensualidade de seu amor. Escreveu “Do dever e das virtudes de um imperador”, “Remédios para a boa e má sorte”,  “De viris illustribus”, “Epistola ad pósteros” (autobiobgrafia). Em “De republica optime administranda” aconselha o senhor feudal não ser amo, mas pai, para seus súditos, amá-los como filhos; drenar os pântanos, prover o abastecimento de víveres; manter igrejas; cuidar dos enfermos e pobres; e proteger os literatos de cuja pena depende sua fama.

Will Durant prossegue esclarecendo: a Itália fora divida em cidades rivais pela história e assim a lava do ódio derramou-se por todas as avenidas da vida. Os homens pensavam em termos de  sua cidade e somente uns poucos filósofos, como Maquiavel, ou um poeta, como Petrarca, é que pensavam na Itália como um todo. Petrarca alimentava a esperança de que Rienzo uniria a Itália; quando essa esperança se desfez, voltou-se, como Dante, para o chefe do Sacro Império Romano teoricamente o herdeiro secular de todos os poderes temporais do Império Romano pagão no Ocidente. Petrarca procurou-o em Praga..., mas sem que tivesse conseguido resultados significativos para a Itália.

Will Durant adverte: não é preciso exagerar para se apreciar o grau em que Petrarca e Boccaccio escreveram em italiano, o idioma do povo, e prepararam a Renascença. Encontravam-se ambos ainda presos às ideias medievais... Mas de novo seria um erro exagerar as contribuições dos tempos antigos para aquele apogeu da Itália... Por conseguinte, todas as bases da Renascença foram lançadas ao tempo da morte de  Petrarca.                                                       

Boccaccio foi contemporâneo e amigo de Petrarca. Em Amorosa Visione, Boccaccio assim se expressa: “Não tenhais tanto receio de dizer que tendes um marido e que as leis sagradas e o juramento de fidelidade vos proíbem tais coisas. Isso não passa de conceitos inúteis e de objeções frívolas contra o poder de Eros, pois, à semelhança de um forte e poderoso príncipe, ele estabelece suas leis eternas; pouco lhe interessam as outras leis de estados inferiores, as quais considera disposições baixas e servis.”

O mais famoso livro de Boccaccio, o Decamerão (deca=dez, hemera=dia, dez dias, em grego) foi escrito sob o impacto emocional da peste negra, importada do Oriente com as pulgas dos ratos que acompanhavam as mercadorias importadas, e que devastou a população da Itália naquela época. São cem histórias, narradas, dez por dia, por um grupo de dez jovens, sete jovens italianas, nobres e ricas, que, após a missa, combinam fugir da contaminação da peste, fazendo uma excursão até uma vila no campo, em companhia de três belos e educados  jovens, ardentes no fogo do amor, que tinham acabado de entrar na igreja, em busca da suprema consolação, encontrar-se com três delas, suas namoradas. Levantada a hipótese de escândalo, essa objeção é repelida: “Sendo minha vida honesta e tranquila a minha consciência, pouco me importa a opinião dos outros.” Os jovens vivem dez dias de maravilhoso convívio numa linda região em uma maravilhosa na vizinhança de Florença, narrando cada um uma história por dia, sob esta norma: ”proibida a transmissão de qualquer notícia que não seja alegre.”

Já se disse sobre o Decameron: “O tema principal, sem dúvida, é sexo e adultério, mas sempre de uma perspectiva leve. .. .A obra, chamada por alguns de A comédia do sexo, foi desafiadora para a Idade Média ao mostrar a natureza humana como nunca antes na trajetória da literatura... É, por isso, considerada um marco literário na ruptura entre a moral medieval, em que se valorizava o amor espiritual, e o início do realismo, iniciando o registro dos valores terrenos, que veio redundar no humanismo; nele não mais o divino, mas a natureza, dita o móvel da conduta do homem...Boccaccio não está preocupado com dimensões divinas ou religiosas: seu tema é a vida humana tal como ela se apresenta, e nas cem novelas contidas no Decameron vemos abordados todos os seus aspectos.” 

Will Durant continua sua crítica: aos 37anos, Boccaccio não era cristão dogmático. Sua tolerância contrasta com a amarga intolerância de Dante, o qual condena Maomé a vivissecções no inferno. Na segunda história, o judeu Jehanar converte-se ao cristianismo com o argumento de que deve ser divina porque sobreviveu, não obstante as imoralidades e simonias praticadas pelo Clero. Boccaccio ridiculariza, não obstante o ascetismo, a pureza, a confissão, as relíquias, os sacerdotes, os monges, as freiras, e até mesmo a canonização dos santos. Uma das histórias narra que o Frade Cipolla, para obter boa coleta, promete apresentar aos ouvintes sacratíssima relíquia, a pena da asa do arcanjo Gabriel que caíra na câmara da Virgem Maria durante a Anunciação. A mais obscena das histórias conta como o jovem e viril Masetto satisfez todo um convento. Noutra após narrar o caso de adultério de Frei Rinaldo, o narrador interroga “Quais os monges que não praticam tais coisas.?” As damas do Decameron coram um pouco com tais histórias, porém divertem-se com seu espírito relesiano e chauceriano.

Boccaccio foi criado naquela alegria desprendida de Nápoles e quase sempre pensava no amor em termos sensuais. Conquanto se tivesse casado duas vezes, parece que acreditava no amor livre. Após contar uma série de histórias hoje inconvenientes faz um dos homens dizer às damas: “não notei nenhuma ação, nenhuma palavra, enfim nada que fosse digno de censura, quer de vossa parte, quer de nós, homens.” Concluindo o livro, o autor revela certas críticas feitas sobre a licenciosidade nele empregada e especialmente “porque “escrevi, em vários lugares, a verdade acerca dos frades.” E congratula-se com seu “longo labor, inteiramente realizado com o auxílio do favor divino”.

Will Durant resume sua análise: O Decameron continua sendo uma das obras-primas da literatura universal. Fama devida mais à sua moral, que à sua arte. Perfeitamente elaborado, estilo ainda não ultrapassado pela literatura italiana. Prosa, às vezes envolvente e florida, porém, em sua maior parte, eloquente e vigorosa, pungente e vivaz e clara. É um livro de amor à vida. No maior desastre que desabou sobre a Itália em mil anos, Boccaccio ainda assim encontrou em seu íntimo coragem para ver a beleza, o humor, a bondade e a alegria palmilhando a terra. Às vezes mostrou-se cínico, como  em sua cruel sátira às mulheres, no Corbaccio; no Decameron, porém, foi um alegre Rabelais que saboreava... os altos e baixos do amor e da vida.

Contemporâneo de Petrarca e Boccaccio, Coluccio Salutati,chanceler da República de Florença, escreveu: “Afirmo corajosamente que... deixo para ti e para quem eleva ao ceu a pura especulação todas as outrs verdades, desde que se me deixe a cognição das coisas humanas. Podes permanecer cheio de contemplação, mas que, ao contrário, eu possa ficar rico de bondade. Podes meditar por ti mesmo, procura o verdadeiro e regozija-te ao encontra-lo,,, que eu, ao contrário, esteja imerso na ação, voltado para o fim supremo. Que toda a minha ação sirva a mim, à família, aos parentes e, o que é ainda melhor, que eu possa ser útil aos amigos e à pátria, e possa viver de modo a  servir à sociedade humana pelo exemplo e pelas obras.”

Já no século XV, Paggio Bracciolini, igualmente chanceler de Florença, sustentava que ”cada um é artífice da própria sorte” e “a verdadeira nobreza é aquela que cada um conquista”. Leon Battista Alberti contrapunha as investigações morais às teológico-metafísicas  que considerava vãs. Exaltava o homem faber, a atividade humana voltada para o bem do indivíduo e também para o benefício da cidade, de todos os homens.: o homem nasceu “não para murchar jazendo, mas sim para estar de pé fazendo” e “a fortuna subjuga apenas a quem se lhe submete.” Lourenço Valla conclui o “Discurso sobre a falsa e mentirosa doação de Constantino”, sobre o qual a Igreja fundava a legitimidade   de seu poder temporal, fonte de corrupção, assim “ Que eu possa um dia ver... o Papa sendo apenas vigário de Cristo e não também de César!” Já se afirmou:  “Para Valla... a língua é a encarnação do espírito dos homens e a palavra é a encarnação do seu pensamento... Daí a sacralidade da linguagem e a necessidade de respeitar a palavra...Com Valla, o humanismo alcança uma de suas conquistas mais elevadas e duradouras.” E Pico dela Mirandola sintetiza sua teoria da dignidade do Homem: “A grandeza e o milagre do homem estão no fato de ele ser artífice de si mesmo, auto construtor.”

No domínio das ideias políticas o Renascimento é marcado principalmente pela influência do epicurismo e do estoicismo. A teoria aristotélica do Estado como ser natural é cada vez mais abandonada em proveito da teoria epicurista do acordo social. Já no século XVI, Maquiavel enaltece o governo forte e sem escrúpulos morais: o Estado é construção do homem, não é planejamento divino, organização, criação divina. O homem não nasce rei. Ele se faz rei.

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

471. Mensagem a um Líder (Redigida no ano 2010)



Amigo

Nos meus sonhos utópicos, gostaria de ver todos os participantes, aí inclusas as pensionistas, congregados em uma única associação, onde todos debatêssemos, com ampla clarividência e em plena consciência de igualdade, os nossos interesses de aposentados e pensionistas. Que fôssemos obcecados por esse objetivo único: os nossos interesses de aposentados e pensionistas no curto e no longo prazo.

Isso é impossível? Não, absolutamente não. Temos hoje a Internet. Ela já se insere nos celulares, que já são, no Brasil, utilizados em número superior ao da própria população brasileira. Possuímos hoje um espaço de convívio virtual para todo o universo de brasileiros, quanto mais para a população de participantes e assistidos da Previ.

Você sabe também quanto insisto por que as nossas associações, a começar por essa nossa associação global dos funcionários da ativa e aposentados, sejam de fato democráticas, que todos dela participem ativamente, que todos sejam ouvidos, que todos se manifestem, que todos tenham plena consciência do que falam e do que ouvem. E, assim, se construa uma mente comum (era o ideal de Rousseau e Péricles afirmou que era a realidade de Atenas de sua época) e uma vontade comum sobre o que queremos a respeito da Previ e da Cassi.

Isso é impossível? Não. Isso já acontece em muitas pequenas cidades dos Estados Unidos e da Suíça.

Amigo, isso pode acontecer, se nós quisermos, se nós formos apóstolos competentes da construção de uma sociedade, cujos sócios sejam lúcidos, sinceros, leais, transparentes, despidos de motivações egoísticas e movidos pelos interesses do grupo, sem vaidades, iluminados por uma ética de respeito à dignidade e à igualdade social humana bem como de valorização da palavra dita e ouvida, como direito de todos, e, sobretudo, reverenciando como o mais alto dos valores da sociedade a construção de um pensamento e de uma vontade comum.

Entristece-me, entrar num site de uma das três dezenas de associações de funcionários do Banco do Brasil e ler os despautérios com que se insultam colegas (que fazem muito e o que podem) bem como assistir às manifestações de ânsia por empréstimos, quando o que de fato nos interessa e nos redime é a renda.

Dito, tudo isto, lamento que somente umas poucas associações se tenham incorporado para dialogar com o Banco do Brasil e a representação (cujos componentes me merecem o mais alto respeito pelo que são e pelo que foram na história do Banco do Brasil recente) não tenha recebido o aval de todas as associações e de todos os participantes e assistidos da Previ. Infelizmente ainda não soubemos e não quisemos construir a Nação Satélite.

Estou entendendo que o interesse realmente era levar ao Banco do Brasil uma opinião legal e tecnicamente consistente a respeito da Resolução 26. Mostrar ao Banco do Brasil que ela é uma excrescência, um aborto jurídico. O estudo elaborado pelo colega Rui Brito me pareceu esplêndido, irretorquível.

A peça introdutória apresentou apenas alguns dos diversos assuntos que merecem ser revistos na gestão da Previ e no relacionamento entre Previ, Banco do Brasil, Governo e participantes. Esse relacionamento é muito complexo, envolve muitos interesses, interesses vitais para nós participantes, interesses políticos infelizmente, interesses econômicos. É assunto para estudo minucioso feito por técnicos, em continuado processamento, e transformado em propostas facilmente compreendidas pelos componentes da Nação Satélite e por eles abraçadas num pensamento e numa vontade comum.

Um abraço do colega e amigo que o admira, e muito
Edgardo

Amigo.
Em aditamento às ideias que rascunhei na mensagem, que ontem lhe enviei, permita-me acrescentar que, no dia 26 do corrente mês, o The New York Times publicou uma reportagem sobre a União Europeia, que acaba se abrir para "as iniciativas cidadãs". Lá o articulista afirma:

"Criticada há muito tempo por sua falta de democracia, a União Europeia deve dar mais voz a seus 500 milhões de cidadãos – se eles conseguirem coletar 1 milhão de assinaturas de um número “significativo” de países-membro."

É verdade que isso já existe no Brasil, embora eu ache que ainda somos predominantemente governados pelos interesses dos que ocupam o Governo. A democracia só existirá, de fato e completamente, quando a mentalidade da sociedade não mais suportar, até mesmo na área dos interesses privados, uma administração oligárquica e elitista. Não ouvimos sempre nas aulas de administração que a gerência corporativa deve ser democrática? que todos, inclusive o operário da mais básica posição, devem ser auscultados? Essa democracia tão valorizada e tão pouco praticada, ela deve existir muito mais em associações de classe voltadas para o bem-estar da coletividade, é óbvio.  

O citado artigo, entre muitas outras coisas, também afirmava: "Mas ainda há dúvidas se a voz do povo vencerá a burocracia." O ranço ainda permanece profundamente incrustado em nossa cultura: "O mais dotado sempre pretende se impor"... é assim que interpreto Maquiavel.

Um abraço do
Edgardo