Lamento
externar minha decepção sobre o desenvolvimento do estudo que dedicam a
assuntos menos práticos, como por exemplo, a dignidade da pessoa humana (artigo
1º-III) e o artigo 193 da Constituição Federal: “A ordem social tem como base o primado
do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.”
Na minha opinião, este é o artigo que sintetiza o perfil da sociedade
que o Povo Brasileiro decidiu construir como espaço de convivência dos cidadãos
brasileiros: a sociedade do Estado Democrático do Bem Estar Social. E sinto
justificada essa minha estranheza quando ouço um vulto científico internacional,
vulto histórico proeminente da História da Ciência da Psicologia, como Kurt
Lewin, afirmar: “Nada é mais prático que uma boa teoria.” Entendo que essa
frase – a sociedade do Estado Democrático do Bem Estar Social – é o princípio
constitucional que embasa toda a estrutura jurídica da Nação Brasileira.
Lamento, portanto, confessar que, quase desde o nascimento da
Constituição Brasileira de 1988, já na década de 90 do século passado,
experimento a sensação de que toda interpretação dessa Constituição,
indiscutivelmente do Estado da Social Democracia, se faça com o viés de
amoldá-la exatamente ao oposto, a uma sociedade do Estado Liberal Capitalista,
sociedade que, segundo artigo desta semana de Paul Krugman, traz o germe
intestino da crise econômica e da crise social. Aliás, segundo relato de
Galbraith em A Era da Incerteza, esse já era também no início do século passado
o pensamento do famoso capitalista e empresário Henry Ford, que remunerava bem
os seus funcionários, porque os considerava a massa de compradores dos
automóveis que produzia em série.
Na minha modesta opinião, pois, esse artigo 193 da Constituição Federal
é a REGRA MÁXIMA da SEGURIDADE SOCIAL. Ele deveria ser exaustivamente estudado
pelos juristas para que a atividade jurídica nesta área dos interesses sociais
possa ser mantida dentro da legalidade e do ordenamento constitucional,
expressão da vontade do Povo Soberano e do respeito à dignidade da pessoa
humana!
Não tenho igualmente lido nenhum estudo mais desenvolvido sobre o §1º do
artigo 202 da Constituição Federal, aquele artigo que é o mandamento legal
máximo do Regime da Previdência Complementar. Depois de estabelecido, no caput desse
artigo, o que o Povo Brasileiro quer que seja a Previdência Complementar, o
primeiro mandamento que se segue é exatamente este:
“A lei complementar de que trata este artigo assegurará ao participante
de planos de benefícios de entidades de previdência privada o PLENO ACESSO às
informações relativas à gestão de seus respectivos planos.”
Não posso me conformar com que se entenda que mera publicação dos
demonstrativos anuais e episódica reunião anual para explicação perfunctória de
seus dados constituam o PLENO ACESSO, mandamento desse parágrafo primeiro do
artigo 202 da Constituição Federal.
Agora mesmo, em todo esse controverso debate sobre complementações
opulentas de aposentadorias, as discussões e os acertos estão sendo feitos nos
gabinetes da PREVI, do Patrocinador e dos Ministérios, onde os Participantes
não têm acesso. Porventura, não se trata de assunto de gestão do Plano de
Benefícios 1? Como explicar a exclusão dos Participantes, ante os termos do
mandamento constitucional?
Acho
que temos o direito de assistir a uma decisão totalmente justificada, cujos
minuciosos lances de argumentação e acertos sejam completamente accessíveis a
nós, os Participantes. Pleno Acesso!
Quero
apenas dar aqui o meu testemunho de como ocorrem muitas coisas sem que sejam
focadas pela luz da transparência, exigida pela Constituição.
Aposentei-me
com 31 anos de trabalho no Patrocinador. Por quinze anos, quase metade desse
tempo, com comissão do AP 2, classificação inferior unicamente a três postos de
AP 1, os três reservados aos principais auxiliares do Presidente: chefe de
gabinete, chefe da assessoria jurídica e chefe da assessoria econômica do
Presidente. Nos últimos seis anos, acumulei o último posto de carreira (Chefe
de Seção) e essa comissão AP 2. Por fim, no último ano da ativa, fui nomeado
Diretor de uma subsidiária do Patrocinador, com remuneração equiparada à de
Diretor do Patrocinador. Pois bem. Não fui aposentado com os rendimentos de
Diretor, nem mesmo com os rendimentos integrais de funcionário.
Certo
Diretor do Banco, por quinze anos, quando nomeado para esse posto, decidiu
aposentar-se com vinte e nove anos de trabalho no Banco. Ele também se
aposentou com valor inferior à renda da ativa de funcionário. Certa vez, em
conversa com amigo, ouvi-o revelar: minha aposentadoria é inferior à do Edgardo!
Essa
foi sempre a tradição do Patrocinador, segundo entendo. Os colegas que
trabalharam no Departamento de Pessoal têm condição de melhor explicar a norma
que estou explanando.
E
nem me parece correto invocar que o posto de Diretor só é possível ser ocupado
por funcionário do Banco. Não invocarei o argumento de que, em breve, por
interesse político um estranho possa ser nomeado para ocupar essa posição de
gestão. Lembro que, naqueles meus tempos de ativa, e desde muito tempo então,
havia o cargo de Diretor Superintendente, o segundo posto de hierarquia de
Direção, somente inferior ao de Presidente, que só podia ser ocupado por
funcionário do Banco. E, nem por isso, o funcionário que o ocupasse, ao que me
consta, se aposentava com a renda do posto.
Também
entendo, como vejo sendo afirmado, que as LC 109/01 e 108/01 não limitam o
valor da complementação da aposentadoria. Acho, porém, que elas mandam que essa
complementação corresponda ao valor do “salário referência” para cálculo da
Contribuição. E mais ainda, penso que elas mandam que esse “salário referência”
englobe toda a remuneração salarial do empregado, no decurso de sua vida ativa,
não apenas em virtude do artigo 201 da Constituição Federal, mas também por
dois outros motivos, a saber, trata-se de COMPLEMENTO do valor da renda
salarial da vida ativa e, sobretudo, em razão do Princípio do Equilíbrio
financeiro e atuarial (artigo 7º da LC 109).
Há
outro fato que pode corroborar o que pretendo aqui justificar. Vinte e seis
anos depois de me aposentar com valor de aposentadoria inferior ao salário que
percebia na ativa, a própria PREVI me informou em 2007 – o famoso benefício da
Renda Certa - que me devolveria um ano e três meses de Contribuição, porque essas quinze
contribuições eram excessivas para o pagamento da aposentadoria no valor
correspondente ao salário percebido na vida ativa. Para esse valor bastavam os
trinta anos de contribuição!
E,
prestem a atenção, a PREVI não reajustou minha aposentadoria ao valor integral
do meu salário da vida ativa!... Pelo que entendo, hoje existem os que fizeram
trinta anos de contribuição e percebem aposentadoria integral e os que fizeram
trinta anos de contribuição e não percebem aposentadoria integral! Tenho muita
dificuldade para entender contas tão perfeitas! Pleno Acesso!
No texto anterior, um colega me afirma que, durante anos, não lhe foi calculada a contribuição para a PREVI sobre todos os itens de pagamento salarial mensal! E que essa omissão é justificada pelos réus perante os tribunais! E estranha o que lhe parece duas medidas, para os Participantes funcionários que ganham salários, o benefício previdenciário não abrange todos os itens da folha de pagamento mensal, enquanto para os Participantes dirigentes, que nem salário ganham, computa-se o valor integral do pagamento?!
Se
é verdade o que leio nas notícias que me chegam, que a PREVIC teria acolhido a
opinião de que inexiste limitação legal para o valor da aposentadoria, exposta
pela PREVI e PATROCINADOR, isso já se
apresenta como auspiciosa alteração de pensamento daquele órgão fiscalizador,
já que, como mostramos em diversos textos anteriores aqui publicados, em mensagem ao Senado Federal, de dezembro de
2008, a SPC afirmava que existia limite de valor para o benefício, e que tudo o
que excedesse esse valor estava desconectado da obrigação de destinar-se aos
Participantes. Em suma, todo o excesso de reserva previdenciária não mais é
reserva previdenciária, é mera sobra de dinheiro, excesso de valor econômico. Esse foi o principal argumento que
a SPC exibiu naquela mensagem para justificar o anômalo instituto da Reversão
de Valores, criação da Resolução CGPC 26/08: o argumento do benefício
contratado.
Em
2011, em outra mensagem, esta dirigida à Câmara de Deputados, e resposta a solicitação
de informações feita pelo Deputado Chico Alencar, que também já analisamos em
textos anteriores aqui publicados, o órgão técnico da Previdência Complementar
do Ministério da Previdência Social afirmava que não havia limite para o
benefício contratado, enquanto o órgão administrativo-jurídico afirmava que
existia, e insistia no argumento do benefício contratado para justificar o
instituto da Reversão de Valores.
Afigura-se-me
lógico que o órgão ministerial da Previdência Complementar renuncie, a partir
de agora, a invocar o argumento do benefício contratado para justificar a
inovação do instituto da Reversão de Valores.
Enfim, como já
afirmei em texto anterior aqui publicado, a própria LC 109/01 me parece
justificar a longeva tradição do Banco do Brasil de não aposentar os seus
funcionários pelo valor de renda de natureza não salarial, já que o artigo 16-§1º
da LC 109/01 diz que, em se tratando de ingresso no Plano de Benefícios, os
dirigentes de patrocinador são equiparáveis aos empregados, isto é, podem
equiparar-se. Ele não diz “são equiparados”, isto é, devem ser equiparados.
Noutras palavras, a tradição do Patrocinador neste assunto não é discrepante do
que manda a Lei.
Acredito, por
esses motivos, que tenho o direito de exigir que, qualquer que for a decisão
sobre esse assunto, ela se faça acompanhar do respeito ao PLENO ACESSO às
informações a que os Participantes têm direito.