quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

172. Resumo de Uma Opinião

(Em homenagem à colega Tânia, solitária comentarista do meu blog)

1. O Contrato é um ring. Admito que o contrato de previdência complementar é negócio jurídico estabelecido entre o patrocinador, o participante e a entidade de previdência complementar (EFPC), sendo que estas partes contratam entre si com total liberdade, de maneira autônoma e independente, NAQUELE ESPAÇO DE AUTONOMIA DELIMITADO PELA VONTADE DO ESTADO.
"...NÃO SE PODENDO IDENTIFICAR COM O CONTRATO EM ESTADO PURO, PRATICAMENTE INEXISTENTE, POSTADO O VÍNCULO A MEIA DISTÂNCIA DO CONTRATO DE ADESÃO E DA INSTITUIÇÃO..." (Curso de Direito Previdenciário, Wladimir Moraes Martinez, pgs. 1325/26)
"...O DESEJO DO PARTICIPANTE É SOBERANO; SALVO QUANDO AFETADO PELA NORMA PÚBLICA ele é pleno e deve ser respeitado."(Ibidem, pg.1278) Não se pode ser mais claro.
É que a PREVIDÊNCIA SOCIAL é organizada pela Constituição Federal (o MAPA DO CONSENSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA) na forma de REGIME:
"Art. 201. A PREVIDÊNCIA SOCIAL será organizada sob a forma de REGIME GERAL... NOS TERMOS DA LEI...
Art. 202. O REGIME DE PREVIDÊNCIA PRIVADA, de caráter complementar... e REGULADO POR LEI COMPLEMENTAR...
§ 4º LEI COMPLEMENTAR DISCIPLINARÁ A RELAÇÃO entre a União... E SUAS RESPECTIVAS ENTIDADES FECHADAS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA."
Portanto, o Estado não só pode interferir, como já interferiu e interferirá muitas vezes.

2. Inexiste lacuna. A PREVIDÊNCIA SOCIAL pode ser básica ou complementar, pública ou privada. Esta se subdivide em Aberta e Fechada. Este problema da "Reversão de Valores" pertence à PREVIDÊNCIA SOCIAL COMPLEMENTAR PRIVADA FECHADA. As leis que o Artigo 202 da CF manda editar são as LC 108 e 109, esta reconhecida como a LEI BÁSICA DA PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR (LBPC). Nem a Constituição Federal nem as LC tratam desse instituto "Reversão de Valores". Ela foi criada pela Resolução CGPC 26/2008, a pretexto de OMISSÃO OU LACUNA NO ARTIGO 20 DA LC 109, QUE ESTABELECE COMO SE PROCESSA O EQUILÍBRIO DE UM PLANO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS SUPERAVITÁRIO.
O Mestre Wladimir acha que inexiste lacuna, que a LBPC estabeleceu as duas formas possíveis de equilibrar o superávit:
" a) REDUZIR AS CONTRIBUIÇÕES...; ou b) MAJORAR O VALOR DAS PRESTAÇÕES..." (Ibidem, pg.1502)
Também não percebo lacuna.

3. A "Reversão de Valores" é uma Perversão. E mais a "Reversão de Valores" em benefício do Patrocinador está perpetrando uma PERVERSÃO, isto é, uma destinação descabida, indo contra o Artigo 202 da CF, o Artigo 1º e o Artigo 3º-III da LC 109 e, SOBRETUDO, PELOS INDISCUTÍVEIS TERMOS DO ARTIGO 19 da LBPC que estabelece o DESTINO DAS CONTRIBUIÇÕES E DAS RESERVAS:
O DESTINO DE TODAS AS CONTRIBUIÇÕES (AS NORMAIS E AS EXTRAORDINÁRIAS, acrescenta o parágrafo único) É A FORMAÇÃO DAS RESERVAS, DE TODAS ELAS, E TERÃO ESTA FINALIDADE: O PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS DE CARÁTER PREVIDENCIÁRIO. Por isso, todas esses Reservas se chamam RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS.

4. Superávit é Reserva Previdenciária. Logo, superávit não é mera sobra de dinheiro. Dinheiro não tem carimbo. Mas, reservas têm. Reservas Previdenciárias possuem este carimbo: "DESTINADO AO PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS! Nos termos do artigo 19 da LC 109, as CONTRIBUIÇÕES entram numa EFPC transformando-se em RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS: RESERVAS MATEMÁTICAS PREVIDENCIÁRIAS, RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS DE CONTINGÊNCIA E RESERVA ESPECIAL PREVIDENCIÁRIA. Esta só diverge das outras porque já pode ser totalmente gasta na forma de benefício previdenciário, é claro. E esta é a CARACTERÍSTICA, A NATUREZA DA RESERVA ESPECIAL: RECURSOS PREVIDENCIÁRIOS PARA DESEMBOLSO IMEDIATO!!! Isso tudo está dito no contexto da LC 109 e explicitamente no Artigo 19.

5. O Benefício Previdenciário é de natureza alimentar. E o que significa "BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS"? O Mestre Wladimir esclarece:
"O DIREITO PREVIDENCIÁRIO... É DIREITO INSITAMENTE PROTETIVO..." Ínsito é CARACTERÍSTICA, NATUREZA, ESSÊNCIA. TODOS OS PAGAMENTOS, UTILIZANDO AS RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS, TÊM QUE SER UM ATO DE PROTEÇÃO. PROTEÇÃO À VIDA! A vida do beneficiário. "... CONVÉM SEMPRE LEMBRAR A NATUREZA ALIMENTAR E SUSTITUIDORA DA PRESTAÇÃO DE PAGAMENTO CONTINUADO." (pg. 48).
LOGO, A EFPC SÓ PODE DESEMBOLSAR RESERVAS PARA QUEM TEM VIDA, PARA PESSOA FÍSICA. É UM ABSURDO, UMA CONTRADIÇÃO, UMA DESCARACTERIZAÇÃO O DESEMBOLSO DE RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS PARA PESSOA JURÍDICA, QUE NÃO TEM VIDA. É UMA PERVERSÃO! Assim, fica claro que não se pode aceitar essa INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA COM BASE NO PRINCÍPIO DE EQUIDADE, que o texto analisado emprega para justificar o instituto da "Reversão de Valores", ante o que ensina o Mestre Wladimir:
"Recomposto o texto... olhe para o resultado. Veja se não é ABSURDO ou CONTRÁRIO AO SISTEMA.(pg.1289)

6. Outras violações do sistema. Além de ser absurdo, esse resultado comete várias outras violações ao sistema:
Artigo 5ºda CF: "II - NINGUÉM SERÁ OBRIGADO A FAZER OU DEIXAR DE FAZER ALGUMA COISA SENÃO EM VIRTUDE DE LEI." A "Reversão de Valores carece de legitimidade: não é preceito legal.
Art. 5º- da CF: "XXII - É GARANTIDO O DIREITO DE PROPRIEDADE", já que, afirma o Mestre Wladimir: "Com a contribuição pessoal e a da patrocinadora, quando da aquisição de títulos, ações e debêntures, o FUNDO DE PENSÃO e, consequentemente, OS SEUS PROPRIETÁRIOS - OS PARTICIPANTES - adquirem, da mesma forma, esses capitais." (pg. 1276) O resultado EQUIPARA O DONO AO NÃO DONO.
ARTIGO 3º da LBPC: "A AÇÃO DO ESTADO SERÁ EXERCIDA COM O OBJETIVO DE:... VI - PROTEGER OS INTERESSES DOS PARTICIPANTES E ASSISTIDOS DOS PLANOS DE BENEFÍCIOS. Atente-se bem para esta norma legal. Existe alguém que possa afirmar que a "Reversão de Valores" não seja afronta direta a este preceito da LBPC?! Existe?!

7. Mal uso da Interpretação Extensiva. Concluamos com estas considerações do Mestre Wladimir a respeito do uso da Interpretação Extensiva feita no texto para apoiar a "Reversão de Valores" e na Resolução para criá-la: "DIFICILMENTE, SE PODERÁ CRIAR PRESTAÇÃO POR VIA DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA, MAJORÁ-LA OU ESTENDÊ-LA A OUTRA PESSOA NÃO BENEFICIÁRIA." (pg.93) E o texto quer estendê-la a PESSOA JURÍDICA, QUE NÃO PODE SER DE FORMA ALGUMA ASSISTIDO, PORQUE NÃO VIVE, NEM SE ALIMENTA, NEM SE INCAPACITA PARA O TRABALHO, NEM MORRE! Sobre a EQUIDADE, adverte que se impõem "cuidados ainda maiores" (pg.96)
"ANALOGIA REPRESENTA SIMILITUDE DE CENÁRIOS... A MESMA ESTRUTURA, PRESSUPOSTOS, OBJETIVOS..."! (pg.95) Ora, no instituto da "Contribuição", Patrocinador e Participantes, são ambos sujeitos passivos da relação jurídica, e a EFPC é sujeito ativo. Já no instituto do "Pagamento de Benefícios", o Patrocinador nem aparece. E A EFPC FOI CRIADA PELO ESTADO, EXATAMENTE PARA ISSO: O PATROCINADOR NÃO FUNCIONAR COMO SUJEITO PASSIVO DESTA RELAÇÃO! E agora uma Resolução quer introduzi-lo, e como BENEFICIÁRIO!
Patrimonialmente, redução de Contribuição e Pagamento de Benefícios são negócios bem diferentes para a EFPC. Naquela, ela apenas não recebe parcelas de Reservas (ela nada gasta das Reservas Previdenciárias, não faz beneficio previdenciário a NINGUÉM). Neste, ela desembolsa RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS (ELA FAZ BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO). São estruturas e cenários muito diversos.

8. Conclusão. Acho que o Deputado está com a razão.

2 comentários:

  1. Caro colega Edgardo,
    muito obrigada pela sua atenção,

    Quisera poder ouvir-lhe sempre, nas suas mais exigentes e abalizadas considerações sobre temas tão relevantes para todos nós. Os seus esforços para o cumprimento dessa árdua tarefa de nos esclarecer e nos trazer conhecimento, sempre o tornaram digno e merecedor dos nossos mais profundos agradecimentos e admiração.

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  2. Prezada colega Tania
    Somente hoe, dia 25.03.13, identifiquei esta mensagem que me enviou há mais de mês! Obrigado pelo incentivo. Daquela data até hoje, você deve ter constatado, já escrevi um punhado de textos e, creio, bem mais claros que este. De fato, venho constatando, o conhecimento é um processo, como nos ensinou Jerome Bruner.
    Edgardo Amorim Rego

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