Creio
que a PREVIC tenha, de fato, ideias muito claras sobre tudo o que diga respeito
ao Regime da Previdência Complementar, porque esse é o dever dela e porque ela
existe e é paga exatamente para isso, a fim de que possa cumprir eficiente e
satisfatoriamente sua obrigação de fiscalizar as EPC e mantê-las no cumprimento
de sua finalidade: o correto pagamento dos benefícios previdenciários
contratados.
Acontece,
porém, que fiquei chocado com aquela frase exordial, porque ela me pareceu
patentemente confusa. Espere!, contrato previdenciário? Elo entre três partes?
Façamos
esta análise lendo detidamente o texto da LC 109/01, ajudados pelo Capítulo
CXCI do Curso de Direito Previdenciário, de Wladimir Novaes Martinez, único autor
citado pelo MPS naquela sua Informação ao Senado, de final de dezembro de 2008,
onde se alongou em argumentações favoráveis ao instituto da Reversão de
Valores, inovação promovida pela Resolução CGPC 26.
O
artigo 2º da LC 109 diz que só existe um contratante ofertante (vendedor do
serviço previdenciário) de benefício previdenciário complementar, a EPC, isto
é, a EPC é o INSS da Previdência Privada Complementar. E o artigo 8º diz que só
existe um contratante recebedor de benefício previdenciário, o Participante (ou
Assistido ou Beneficiário). Logo, é claríssimo que o Contrato Previdenciário é o
acordo firmado entre Participante e EPC tendo como objeto o benefício
previdenciário. O Participante é o sujeito de direito (ativo) ao benefício
previdenciário e a EPC é o sujeito de obrigação (passivo) do benefício
previdenciário. Esse é o contrato previdenciário – o contrato de adesão do Participante
ao Plano de Benefício (artigos 8º, 9º e 16). E a relação jurídica
previdenciária é esta entre a EPC e o Participante, oriunda do Contrato de
Participação assinado pelo Participante com a EPC.
Essa
leitura confirma-se pelo que se acha dito nos tópicos 1911 e 1912 do citado
capítulo do Curso de Wladimir Novaes Martinez e, ainda no tópico 1772 do
Capítulo CLXXVII onde ele afirma a existência de Plano de Benefícios “sem
contribuição pessoal ou não contributivo”.
A
análise de Martinez continua, no tópico seguinte daquele capítulo primeiro
citado, com relação ao contrato previdenciário das EFPC, precisamente o que foi
objeto das considerações da PREVIC na Audiência Pública:
“De
igual forma, suscita DOIS polos emergentes: a) de um lado, entidade civil...;
e, de outro, b) o participante, pessoa física,...”.
E
adiante cita Arnaldo Sussekind: “A inscrição como participante da entidade...
configura uma relação contratual... típico contrato de adesão, em que uma das
partes manifesta sua vontade de aderir às condições uniformes previamente
estabelecidas pela outra parte, tornando-a relação BILATERAL.” E também apela
para a autoridade de Manuel Sebastião Soares Póvoas: “...estado jurídico de
contrato de Direito Previdenciário, isto é, tipo específico de contrato de
seguro, jacente na relação entre a ENTIDADE PREVIDENCIÁRIA PRIVADA FECHADA E O
PARTICIPANTE... Seria ato jurídico BILATERAL pelo qual uma pessoa – o
participante... acorda com uma pessoa legalmente autorizada a efetuar... o
pagamento de uma importância – a contribuição – (e) receber... benefícios
previdenciários.”
Isso
é o que diz claramente a LC 109/01 e isso é o que diz claramente a doutrina
jurídica:
- O
Contrato Previdenciário é o Contrato de Participação;
- O
Contrato Previdenciário origina, portanto, a relação previdenciária entre
Participante e EPC, seja ela EAPC ou EFPC;
- O
Contrato Previdenciário é, portanto, bilateral, isto é, entre Participante
(sujeito de direito ao recebimento do benefício previdenciário) e EPC (sujeito
da obrigação de pagar o benefício previdenciário).
-a
relação previdenciária é gerada pelo Contrato de Participação;
-a
relação previdenciária é BILATERAL, a saber, entre EFPC e PARTICIPANTE (ativo,
assistido ou beneficiário).
E
por que a PREVIC insiste tanto que esse contrato previdenciário é tripartite?
Porque em alguns casos a ele se agrega outro contrato, por exemplo, nos casos
de Plano de Benefícios Previdenciários patrocinados:
“A
formalização da condição de patrocinador ou instituidor de um plano de
benefício dar-se-á mediante convênio de adesão a ser celebrado entre o
patrocinador ou instituidor e a entidade fechada, em relação a cada plano de
benefícios por esta administrado e executado, mediante prévia autorização do
órgão regulador e fiscalizador, conforme regulamentação do Poder Executivo.”
(Artigo 13 da LC 109/01)
Atente
para isso, prezado leitor. A LC 109/01 aí diz que, quando a EFPC oferece a um
Participante um Plano de Benefícios patrocinado, ela lhe está apresentando DOIS
contratados: um para ele assinar, o Contrato de Participação (o contrato
previdenciário), o qual foi previamente acrescido de outro contrato, o Contrato
de Patrocínio, é claro.
Assim,
quando o Participante assina a inscrição, ele está assinando o Contrato de
Participação, ele está assinando o Contrato Previdenciário, do qual brota a
relação jurídica previdenciária entre ele Participante e a EFPC. Como se vê,
esse contrato previdenciário continua sendo BILATERAL (isto é, entre
Participante e EFPC) e a relação previdenciária continua BILATERAL (isto é, entre Participante e EFPC). Como vimos, a
LC 109/01diz que só a EPC pode vender serviços previdenciários, proíbe portanto
que Patrocinador os venda. O Participante, pois, não firmou contrato algum com
o Patrocinador e, portanto, não tem relação alguma jurídica com o Patrocinador.
O Participante se relaciona com a EFPC, somente com a EFPC, que tem, esta sim,
relação jurídica com o Patrocinador. O Participante somente integra a relação
previdenciária (o Contrato Previdenciário). O Patrocinador não integra o
Contrato Previdenciário (a relação previdenciária).
É
que, neste caso do Plano de Benefícios Patrocinado, a EFPC está informando ao
Participante, que ela EFPC está oferecendo ao Participante um CONTRATO
PREVIDENCIÁRIO PATROCINADO, isto é, em que ela PREVIAMENTE, por deliberação
dela, adicionou uma garantia de uma fonte de recursos para a formação das
reservas previdenciárias, a garantia constitucional do pagamento dos benefícios
previdenciários contratados (artigo 202 da Constituição Federal), o
Patrocinador, o Empregador. Está informando que ela assinou um Contrato de
Patrocínio, mas é patente que ele também é BILATERAL entre EFPC e Patrocinador,
e dele brota uma relação jurídica de patrocínio BILATERAL entre EFPC e
Patrocinador. O Participante, pois, não se relaciona juridicamente com o
Patrocinador. Ele se relaciona juridicamente com a EFPC.
Os
dois se relacionam, portanto, indiretamente, através da EFPC, simplesmente pelo
fato de que a EFPC aparece como CONTRATANTE EM AMBOS OS CONTRATOS, a saber, o
CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO (o Contrato Previdenciário) e no CONTRATO DE
PATROCÍNIO (o contrato de reforço de contribuição, de garantia).
Tudo
isso que eu e o leitor inferimos da correta leitura da LC109/01 ensina também o
Curso de Direito Previdenciário de Wladimir Novaes Martinez.
No
início do capítulo CXCIII ele esclarece: “...enfim, o ato solene de adesão (do
Participante) ao plano chama-se inscrição”. Ressalta que se trata de um ato
complexo, que tem princípio como ato de iniciativa do empregado, futuro
Participante, e se conclui com o ato de aprovação, de aceitação pela EFPC.
Inscrito,
o Participante assinou o Contrato de Participação, o Contrato Previdenciário,
que, segundo o autor (Capítulo CLXXXVIII, tópico 1888), consta do Estatuto
Social, Regulamento Básico e Convênio de Adesão, sendo que o Regulamento Básico
“é a norma previdenciária”. Entenda-se o que aí ensina Martinez: o Contrato
Previdenciário, de fato, assinado pelo Participante é o Regulamento Básico, ao
qual se acha agregado dois outros documentos, o da identidade da pessoa
jurídica ofertante (vendedora do serviço previdenciário), acrescido de mais
outro documento, o Convênio de Adesão do Patrocinador ao Plano de Benefícios
Previdenciários (Regimento Básico), que ela EFPC firmou com o Patrocinador
(Empregador).
Aliás,
essa é, sem dúvida, a concepção que encontramos na Resolução CGPC nº 8/2004!
Não pode ser outra!
E
algo MUITO INTERESSANTE surge dessa análise:
-dois
sujeitos de duas relações jurídicas diferentes (Patrocinador e Participante) se
relacionam com a mesma pessoa jurídica, a EFPC, sujeito do direito a receber a
Contribuição, na relação previdenciária, do Participante e, na relação de
patrocínio, do Patrocinador;
-a
única relação jurídica que existe entre essas duas pessoas jurídicas
(Patrocinador e Participante) é INDIRETA, em razão de DOIS CONTRATOS DISTINTOS,
E NA OBRIGAÇÃO DE PAGAR CONTRIBUIÇÃO AO MESMO SUJEITO DE DIREITO (a EFPC)!
Afigura-se verdadeira contorção da lógica o querer
inferir daí que um SUJEITO DE OBRIGAÇÃO DE UMA RELAÇÃO JURÍDICA DE GARANTIA,
GERADA NOUTRO CONTRATO, SE ARVORE EM SUJEITO DE DIREITO DE BENEFÍCIO EM OUTRA
RELAÇÃO JURÍDICA PREVIDENCIÁRIA GERADA POR OUTRO CONTRATO. E mais, ele está
ausente dessa relação jurídica previdenciária porque QUER (por interesse
próprio, vulgarmente poder-se-ia humoristicamente dizer que ele arranjou um
testa-de-ferro) e a LC 109/01 aquiesceu nesse ponto de tal forma que tornou a
VONTADE DO PATROCINADOR UMA DAS VIGAS MESTRAS DO REGIME DA PREVIDÊNCIA
COMPLEMENTAR!
E
chegando a essa conclusão, confesso que fico pasmo! Não entendo realmente como
a PREVIC que realmente TEM QUE POSSUIR IDEIAS CLARÍSSIMAS sobre o Contrato
Previdenciário e a Relação Previdenciária, não percebe que ESTA NÃO É
TRILATERAL, mas SIM BILATERAL! Não entendo como insiste em difundir que
Participante e Patrocinador integram UMA RELAÇÃO JURÍDICA PREVIDENCIÁRIA! Não
entendo como não entende que Participante e Patrocinador se unem através de
DOIS CONTRATOS DISTINTOS E DE SUAS RELAÇÕES JURÍDICAS DISTINTAS SIMPLESMENTE
PORQUE ESSES DOIS CONTRATOS E ESSAS DUAS RELAÇÕES JURÍDICAS POSSUEM UM E MESMO SUJEITO
DE DIREITO AO RECEBIMENTO DA CONTRIBUIÇÃO! Nada mais. Por que será?
E
essa minha incompreensão chega até a doer na alma, porque ela me apresenta toda
essa argumentação como pretexto e não como justificação lógica! Será? Não, deve
haver algo mais sábio que não alcanço, já que creio nas ideias claríssimas da
PREVIC sobre Direito Previdenciário.
Muito boa sua tese. É muito estranho e tendencioso a Abrapp vir a todo instante defender o Contrato Previdenciário sem considerá-lo como criado pela LC 109. Espero que a nova direção da Previc mostre-se independente e não embarque nessa também.
ResponderExcluirEm suas última decisões, durante a gestão passada da Previc, aquela autarquia vinha interpretando o contrato previdenciário e respectivos direitos dele adquiridos, como a adesão ao regulamento do plano válido na data da elegibilidade à aposentadoria e não à data de adesão. Já por sua vez a Abrapp interpreta mais erroneamente ainda, e sempre tendenciosamente e favoravelmente às patrocinadoras, como a data de início da concessão do benefício.
Enquanto não tivermos uma legislação clara a este respeito, os participantes serão sempre os únicos prejudicados.
Repliquei seu post no Blog Aposentelecom, com os devidos créditos, para que mais participantes conheçam sua lúcida visão, da qual compartilho. Parabéns!
Prezado Joseph Haim
ResponderExcluirObrigado pelo estímulo. Assombra-me o que li, no texto publicado pelo Senado, sobre o que falaram os representantes da PREVIC, da SPPC e da ABRAPP! Será que essas pessoas estão mesmo convictas da correção do que proferem?
Edgardo