Princípios fundamentais
do Direito do Trabalho
Ressaltei que o dia 5 de outubro de 1955 foi
um dos dias mais venturosos de minha existência, em razão do contrato de
trabalho que assinei com o Banco do Brasil. Em geral, um contrato de trabalho é
um contrato de execução continuada e, frequentemente, por longo prazo. Ele
é feito geralmente por prazo indeterminado
e regido pelo princípio da proteção. E quanta proteção! Afinal, a Constituição
Brasileira consagra todo um artigo, aquele que parece ter sido propositadamente
redigido como sendo a síntese de todo o objetivo de existência desse organismo
social e jurídico, que é o Estado Democrático do Bem-Estar Social Brasileiro, o
artigo 193, o artigo que abre o Título VIII, o da Ordem Social, ele só é um
capítulo!
O contrato de trabalho é entre o empregador e
o empregado. É óbvio que, nesse contrato, de execução continuada, inexiste
entre os sujeitos de direito equilíbrio de forças, de autonomia. O empregado
precisa do emprego para hoje, para sobreviver, para sustentar-se, para chegar
ao fim do dia. O trabalhador sem trabalho nada tem. O capitalista sem trabalho
tem os instrumentos de trabalho, tem a terra, tem a fábrica etc. O empregado
cumpre a sua obrigação agora; o empregador cumpre hoje, ou semanalmente, ou
quinzenalmente, ou mensalmente, ou anualmente, sempre, ou quase sempre, no
futuro e, via de regra, sempre paga o que o empregado já fez e se o fez bem. O
capitalista é sujeito de direito para aumentar a riqueza, enquanto o empregado
é sujeito de direito para sobreviver, isto é, para não perder o único bem que
possui, a Vida. O empregador está numa posição de poder econômico: ele tem o poder de comprar, ele compra até a
Justiça. O empregado está numa posição de impotência econômica: nada pode
comprar, nem mesmo a Justiça. É, por isso, para equilibrar o contrato de
trabalho, isto é, em razão do princípio da justiça, da igualdade humana, da
igual dignidade humana, que o contrato de trabalho precisa reger-se pelo princípio da proteção, o princípio fundamental
do trabalho, para equilibrar o poder jurídico dos dois sujeitos de direitos no
contrato trabalhista: in dubio pro operário, o trabalhador goza da preferência.
Essa proteção jurídica é tão intensa que os
direitos contratuais trabalhistas são irrenunciáveis. A lei não permite a
renúncia ao direito trabalhista, proíbe-a. Estabelecida uma cláusula legal ou
convencionada, ela se torna cláusula mínima do contrato de trabalho, a partir
de então. É simplesmente impossível renunciar a um direito trabalhista, mesmo
que se queira. É o princípio da irrenunciabilidade dos direitos
trabalhistas. Constata-se, pois, que
esse princípio da proteção se expressa em diversas fórmulas, em função da
proteção que objetiva. Assim, consequência
deste princípio da irrenunciabilidade é o princípio da inalterabilidade do
contrato de trabalho, que exclui a possibilidade de alteração das cláusulas do
contrato do trabalho, se a alteração acarretar prejuízo ao trabalhador. Só é
permitida a alteração do contrato trabalhista para melhorar a situação do
trabalhador. Outra fórmula do princípio de proteção é o princípio da
intangibilidade e irredutibilidade salarial que exclui a possibilidade de
redução salarial, salvo por acordo ou convenção coletiva.
O contrato trabalhista obedece ao princípio da
continuidade da relação de emprego, de modo que demissão e readmissão em curto
prazo, transforma o episódio em contrato por prazo indeterminado, salvo quando
se tratar de contrato efetuado para execução de serviços especializados ou em
razão de acontecimentos fortuitos.
Por
fim, o direito do trabalho é regido pelo princípio da realidade, isto é, a intenção
das partes contratantes prevalece sobre o significado literal do texto escrito
do contrato.
No
meu modesto entender, todos esses princípios fundamentais do direito do
trabalho, que se resumem no direito da proteção do mais fraco, princípio que,
vimos, constituiu todo aquele código da cidade sumeriana de Lagash, editado há mais de cinco mil anos,
que Will Durant afirmou ter sido o mais antigo e o mais breve código que já
existiu, conduzem logicamente a acatar a fórmula tradicional da Súmula 288 do
TST, que consubstancia tanto o princípioi fundamental do contrato,
pacta sunt servanda, quamto o princípio da irrennciabilidade dos direitos
trabalhistas, “A cláusula contratual do trabalho deve ser
cumprida, jamais poderá ser abolida, nem por mútuo consentimento, antes deve
ser melhorada, se a lei a incrementar.” Até o princípio da realidade conduz
logicamente a esse entendimento.
Naquele dia 5 de outubro de l955, eu não tinha
apenas uma expectativa de que, passados trinta anos no serviço do Banco, eu, já
então, com 59 anos de idade, passaria a receber, se o requeresse, complemento
de aposentadoria tal que continuaria a perceber, daí em diante, como
aposentadoria, a mesma renda que percebia na ativa. Não, o que eu tinha naquele
dia era certeza de que o Banco cumpriria esse compromisso que estava assumindo
comigo, porque o Banco também entendia que assumia esse compromisso com todos
os que ingressavam no seu serviço e esse compromisso ele cumpria com todos os
que, trabalhados 30 anos no seu serviço, requeriam a aposentadoria. Isso é
exatamente o que afirma o opúsculo “Da Caixa Montepio à PREVI”(pg.77: o Banco,
sob ordem do Estado, criou um fundo, alimentado por recursos do Banco e dos
empregados para responsabilizar-se daí em diante pela complementação da
aposentadoria e pensão, bem como firmara contrato com a PREVI para, abastecida
por esse fundo, responsabilizar-se por essa complementação. Tudo fora aprovado
em assembleia geral dos acionistas do Banco.
Entendo, pois, que o compromisso trabalhista de
integralidade da aposentadoria c pensão continuou para os que ingressassem no
Banco, daí em diante, os pós-67, apenas transferida a responsabilidade pela sua
execução para a PREVI. Assim, entendo que esse continuou sendo o compromisso do
Banco para com aqueles que nele ingressaram
após o ano de 1966, ainda nos anos de 1977, quando promulgada a Lei 6435, e
l988, quando promulgada a atual Constituição Brasileira. Infelizmente não
possuo documentos do Patrocinador nem da PREVI, dessas épocas, que possam
subsidiar esta dissertação.
O que me fica evidente é que, estabelecidos os
princípios do contrato e os princípios do contrato de trabalho, todos esses
princípios, ATÉ MESMO EM CASOS DE CLAMOROSA NECESSIDADE SOCIAL, exatamente por
isso, porque o bem-estar social consiste na expansão do bem-estar, isto é, na
crescente elevação do nível do bem-estar e na crescente aproximação dos níveis
mais alto e mais baixo do bem-estar de uma sociedade TRABALHADORA, nem mesmo nessa situação de desespero, o
Estado PODERÁ PREJUDICAR O DIREITO ASSUMIDO PELO TRABALHADOR NA CONTRATAÇÃO
TRABALHISTA.
Sim, na minha opinião, é aqui neste debate que se
esclarece toda a base da paulatina desconstrução do direito trabalhista dos que
ingressaram no Banco e se tornaram Participantes do Plano de Benefícios 1 da
PREVI: O PARADOXO ENTRE O DIREITO OBJETIVO ASSUMIDO E A EXPECTATIVA DO DIREITO
SUBJETIVO ADQUIRIDO.
A partir de 1967, o Banco continuava a afirmar que
os funcionários, aos 30 anos de serviço, entrariam no direito subjetivo ao
complemento da integralidade da aposentadoria e da pensão, mas que esse
complemento, por decisão própria e sob comando do Estado, passaria a ser
compromisso assumido pelo funcionário junto à PREVI, nos termos de Estatuto e
Regulamento confeccionados pelo próprio Banco. (Ibidem, pg. 77 e 78)
(continua).
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