domingo, 24 de dezembro de 2017

402. Economia e Estado


Não sou economista. Sou apenas um curioso, em matéria de Economia. Nada obstante, estudo Economia, desde o ano de 1970, quando Cesar Dantas Bacellar Sobrinho me indicou, com quinze anos de Banco do Brasil, e apenas no meio da carreira de funcionário do Banco, para Gerente da Carteira de Câmbio, e o Presidente Nestor Jost hesitou nomear-me: “Bacelar, há tantos chefes de seção no Banco e você indica para gerente da mais importante Carteira do Banco um funcionário de meio de carreira?!” Bacelar não desistiu: “Meu candidato é esse. Você é o Presidente e nomeia quem achar que é competente para o cargo.” Nestor Jost deixou-me três meses como gerente substituto, para então nomear-me. Levou-me até a um périplo pela África para conhecer-me. Acho que um parecer, contrário à opinião dele mesmo, sobre um empréstimo internacional, foi decisivo!...

Possuo e estudo uns dez livros de curso de Economia de professores norte-americanos, entre eles os de Paul Samuelson, Paul Krugman e N. Gregory Mankiw. Possuo exemplar, e os li, dos 50 mais famosos livros da História da Economia. Entendo que aprendi uma lição: Economia não ensina a escolher a melhor organização de sociedade e de Estado. Economia apenas explica por que a economia de mercado, isto é, a economia que aí existe, subsiste e, apesar das deficiências, é capaz de prover a subsistência da Humanidade e promover a riqueza, isto é, a produção de bens, o progresso.

É isso que entendo Paul Krugman tenta transmitir nestas expressões do capítulo 13 (Eficiência e Equidade) do seu livro de texto escolar: “E se as escolhas reais são limitadas a A (eficiência) ou C (ineficiência)? Você deveria preferir, como eleitor, as eficientes políticas...? Não necessariamente... Como dizem os economistas, muitas vezes vale a pena trocar menos eficiência por mais equidade, mas não é sempre. Portanto, é importante recordar o que a eficiência não é. A eficiência não é um objetivo em si mesmo, para ser perseguido à custa de outros objetivos. Ela é apenas uma maneira de alcançar nossos objetivos mais efetivamente, quaisquer que sejam esses objetivos.”

Assim, outras são as ciências que iluminam a Humanidade nas decisões sobre a escolha de seu destino, sobre a sociedade e o Estado em que deseja viver: Sociologia, História, Antropologia, Biologia, Ciência Política, Ciências da Natureza.

O que diz a História a esse respeito? Que desde os primórdios das sociedades civilizadas o homem pretendeu viver numa sociedade fraterna, onde o forte usasse o seu poder, não para escravizar o fraco, mas para ampará-lo e nivelar o quanto possível as condições de vida de todas as pessoas: civilização  sumeriana e código de Hamurabi.

A civilização grega, cujos princípios embasam a civilização contemporânea ocidental, que hoje exerce influência até sobre as grandiosas civilizações chinesa e indiana, nos seus primórdios, a era homérica, admitia que todos os homens eram de origem divina, filhos da grandiosa cópula dos deuses Urano (o Firmamento) e Geia (a Terra), irmãos, de segunda classe, é verdade, dos próprios deuses do Olimpo! A reforma de Sólon e a de Clístenes criaram uma sociedade de cidadãos que, em conjunto, redigiam as leis que os governavam.

O Cristianismo de Paulo de Tarso conquistou Roma, a mãe do Imperador e o próprio imperador, com a mensagem revolucionária de Jesus Cristo “Amarás o Senhor teu Deus, com todo o coração... e amarás o próximo como a ti mesmo.” (Mateus, 22-37 e 39), replicada noutras expressões instrutivas aos cristãos de todos os tempos: “Ora, vós sois o corpo de Cristo e cada um como parte é membro. (Epístola aos Coríntios, 12-27)...Ainda há mais, os membros do corpo que mais fracos nos parecem, são necessários (Ibidem,12-22)...Ora, Deus dispôs o corpo dando maior decência ao que dela carecia, a fim de que não houvesse divisões no corpo, antes todos os membros se preocupassem por igual uns com os outros.” (Ibidem,12-24e 25)

Santo Agostinho, o maior dos Padres da Igreja Ocidental, cujo pensamento orientou a civilização ocidental ao longo de um milênio, fundava a sua crença na Providência divina nestes pensamentos: “Por este motivo Deus está acima de toda forma, acima de toda ordem. E está acima não pela distância espacial, mas por uma potência inefável e singular da qual deriva toda medida, toda forma e toda ordem.” (Natureza do Bem) E este Deus é Ser, Verdade e Amor, as marcas da Trindade divina impressas na natureza humana. (Natureza do Bem e Tratado das Ideias.) Gregório Magno, o grande difusor do cristianismo romano agostiniano pela Europa, ecoava o pensamento do sábio africano: “A nossa honra é a honra de nossos irmãos; e, então, verdadeiramente somos honrados, quando a nenhum deles se nega a honra que lhe é devida.”(Citado na encíclica de Pio XII, O Corpo Místico de Cristo)

O Iluminismo racionalista, que hoje embasa a civilização ocidental, com espaço econômico regido pela economia de mercado, contagiou de tal forma as portentosas civilizações chinesa e indiana, que se constata a prevalência de seus valores na orientação de toda a Humanidade. E essa civilização ocidental contemporânea não abdicou do valor multimilemar da unidade humana e adotou por lema a famosa tríade: Liberdade, Igualdade e Fraternidade!

Essa é a tríade de valores fundamental da civilização contemporânea, que Herbert Spencer, com a filosofia da seleção natural (os ricos sobreviverão e os pobres extinguir-se-ão), e Nietzsche, com a valorização do Superhomem, tentaram demolir. A Civilização contemporânea é claramente uma civilização epicurista: corpo sem dor e alma sem angústia. A Filosofia e a Psicologia constatam que  homem é um ser que se constrói.  A Psicologia constata que o homem só é feliz quando se realiza num projeto existencial com dimensão social: a sociedade feliz é um arquipélago unido por pontes, por infinitas pontes!

Essas ideias reforçaram a política do bem-estar social, iniciada por Bismarck, que se propagou pela Inglaterra, introduziu-se nos Estados Unidos com o New Deal de Roosevelt e culminou com o Plano Beveridge inglês de exterminar os cinco grandes males da sociedade: a escassez, a doença, a ignorância, a miséria e a ociosidade.

A República Brasileira, liderada por ilustres próceres positivistas, colocou na bandeira nacional parte da famosa síntese comtiana de uma sociedade cientificamente operante: “O amor por princípio. a ordem por base e o progresso por fim.” A sociedade brasileira é uma sociedade fraterna. Dessa fraternidade brota a ordem, sem necessidade de esquemas de policiamento, da ordem, isto é, a fraterna e democrática organização da sociedade, brota o progresso.

É isso que o Povo Brasileiro promulgou como sua norma constitucional, com base no valor supremo da dignidade da pessoa humana (Artigo1º-III): um Estado republicano, democrático do bem-estar social.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: 
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
 “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: 
I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.

 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII - busca do pleno emprego
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. 
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
§ 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.
 TÍTULO VIII
Da Ordem Social
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÃO GERAL
 Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.

Essas são as premissas deste texto. Essas são as orientações fundamentais que devem guiar, na minha opinião, qualquer Governo que se assente em Brasília. Governo que entenda que essas normas constitucionais estão ultrapassadas, não pode alterá-las sem a consulta direta ao Povo, o detentor do poder soberano (artigo 14). Entendo que, não o fazendo, comete um ato inconstitucional, ilegítimo e nulo. Trata-se de um ato ditatorial.

Alega-se que o País está com grave problema financeiro: os recursos não cobrem os compromissos, há anos, e a dívida bancária cresce permanentemente. Mas, o país não tinha uma lei de responsabilidade fiscal? Não havia tribunais de contas? Ninguém percebeu esse grave crime generalizado contra o País, cometido pelos mais altos gestores do Estado? Eles foram responsabilizados? Como chamar o povo para pagar a conta, se os responsáveis não o foram e até continuam a perceber generosas remunerações?!

As contas que estão apresentando ao Povo, consultaram ao Povo, se ele consentia fazê-las? Perguntaram ao Povo se ele queria manter um Presidente com três palácios, um para trabalhar, outro para habitar com a família e outro para relaxar no fim de semana, tudo isso com séquito de servidores civis e militares altamente remunerados, além do sustento normal, frequentes banquetes e cartões de crédito de valor sigiloso?

Consultaram o Povo sobre o custo de trinta e tantos ministérios, um milhar de legisladores e milhares de servidores altamente remunerados? Esses legisladores se transferem para Brasília com séquito de assessores e famílias! Será que nos tempos modernos isso se justifica?! Há uma quantidade grande de Tribunais em Brasília: STF, STJ, TFE,TC, TM etc. Consultaram o Povo sobre a criação desses tribunais, sobre os critérios de remuneração? Não. Como agora querem simplesmente apresentar a conta para o Povo pagar?

Estenda-se isso para os Estados e para os municípios. A conta certamente é altíssima. O conhecimento do Povo é dela ferrenhamente afastado na hora de fazê-la, mas, sem a menor cerimônia, a montanha de dívida é-lhe apresentada na hora de pagar!

Se o Povo é que sustenta o Estado, o Povo tem, sim, todo o direito de fixar a quantia que o Governo pode gastar. É pelo Governo que devem começar as reformas, na minha opinião.







                               

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