The
Economist, revista inglesa, londrina, de pensamento marcadamente liberal e da economia
de mercado, a mais famosa revista de assuntos econômicos no Mundo, que marcha
para dois séculos de existência, com tiragem semanal de cerca de milhão e meio
de exemplares, vendidos no Mundo, metade nos Estados Unidos, referiu-se a esse
livro de Thomas Piketty, com a seguinte expressão: “Maior que Marx.”
Paul
Krugman, economista norte-americano, Prêmio Nobel de Economia, professor na
Universidade de Princeton, afirmou sobre o livro e o autor: “Piketty
transformou nosso discurso econômico; jamais voltaremos a falar sobre renda e
desigualdade da mesma maneira.”
Thomas
Piketty é jovem economista francês, com 44 anos de idade. Contratado como
professor pelo MIT, Estados Unidos, aos 22 anos, três anos depois, findo o
contrato, não o renovou. Preferiu retornar à França, onde ensina Economia na
École d’Économie de Paris.
Esclarece,
no livro, a preferência pelo regresso à França. Entende que a Economia é uma
Ciência Social. Assim, ela precisa ter a precisão matemática e a abstração
racional do método dos professores de Economia norte-americanos, aplicados aos
fatos concretos da experimentação do método dos professores de Economia
europeus.
O
livro é um estudo da riqueza nacional, do conjunto de bens possuídos pelos
cidadãos de um País. Mais precisamente, é um estudo da distribuição
(repartição) da riqueza nacional. Estuda, pois, as quantidades relativas da
riqueza nacional possuídas pelo capitalista e pelo trabalhador.
Capital,
com efeito, são os bens, expressos em seu valor monetário, da propriedade dos
cidadãos de um País e empregados na produção do Produto Nacional ou Renda
Nacional, também expresso em seu valor monetário. Produto Nacional ou Renda
Nacional é a produção nacional em um ano, expressa em valor monetário. O autor
adota a Renda Nacional per capita, isto é, a Renda Nacional Média (Renda
Nacional dividida pela população do País, isto é, RN/PP).
Capitalista
é o rentista, isto é, aquele que sobrevive unicamente dos bens (renda do
capital) que lhe são produzidos pelos bens que possui (capital). Não trabalha
para sobreviver. A outra parte dos cidadãos de um País é a do Trabalhador, isto
é, o cidadão que sobrevive unicamente dos bens que lhe são proporcionados pelo
seu trabalho (renda do trabalho). Não possui bens (capital) que lhe proporcionem
outros bens (renda de capital).
Então,
o Trabalhador põe a funcionar o capital do Capitalista e produz-se a Renda
Nacional, que é repartida (distribuída) entre o Capitalista (renda do Capital)
e o Trabalhador (renda do Trabalho).
O
livro é um estudo desse assunto particular da Economia: a distribuição da
riqueza nacional entre Capitalista e Trabalhador.
Existem
dois históricos estudos com conclusões divergentes a respeito desse assunto.
Karl Marx, no século XIX, em “O Capital”, afirmou que o Capitalismo (a economia
de mercado, de negócios sem comando estatal) caracteriza-se pela acumulação
contínua e crescente da renda do capital e redução contínua e crescente da
renda do trabalho. O Capitalismo é intrinsecamente anti-social, inviável. O
final do Capitalismo é paradoxal: só existe o Capital, sem Trabalho! O
Capitalismo é a própria crise no final. É apocalíptico.
Kuznets,
em “Modern Economic Growth”, em 1966, afirmou que o Capitalismo (a economia de
mercado), no seu desenvolvimento nacional inicial remunera preponderantemente o
Capital, mas, alcançado determinado nível de desenvolvimento, a renda do
Capital e a renda do Trabalho passam a elevar-se simultaneamente e
satisfatoriamente, distribuindo a riqueza entre todos os cidadãos (capitalista
e trabalhador) na conformidade dos méritos de cada um, proporcionando a justiça
e o bem estar social. O Capitalismo, portanto, é intrinsecamente social e
contribui para a formação do Estado Democrático, do Estado do Bem Estar Social
e da Justiça Social.
Piketty
adverte que a RIQUEZA NACIONAL é composta da PARCELA CAPITALISTA e da PARCELA
TRABALHISTA. Afirma que existe uma lei econômica (uma função matemática) que
relaciona a PARCELA CAPITALISTA (PC) com a Renda do Capital ( r ), com a
Riqueza Nacional ( Q ) e com a Renda Nacional (RN):
PC
= r (Q/RN)
Ele
denomina essa função matemática, de Primeira Lei Fundamental do Capitalismo.
Por
que admiti-la? Primeiramente, ela é lógica. É evidente que a PC hoje depende de
quanto era o Capital (Q) no passado, de quanto tem sido a taxa de renda do
capital ( r ) e de quanto tem sido a taxa de crescimento da RN. Maiores Q e r
no passado, maior PC no presente. Maior RN no passado, menor a razão ( Q/RN ) e
menor, portanto, PC. O PC, portanto, é diretamente proporcional a r e a Q e
inversamente proporcional a RN.
Em
segundo lugar, essa fórmula está conforme com os dados estatísticos existentes,
em todos os países, desenvolvidos e subdesenvolvidos, isto é, ao longo de toda
a história da Estatística e da Ciência Econômica. Ela, é de fato, uma lei
científica, pois faz previsões com precisão matemática e é formulada com base
na experiência, isto é, em dados concretos.
Então,
o que nos diz essa lei? Ela diz que nem Karl Marx nem Kuznets estão corretos.
Por que? Porque tanto a renda do capital ( r ), quanto a RN (Renda Nacional)
são voláteis, variáveis, incertas. Há três possibilidades para essa razão r/RN:
ela pode ser igual, maior ou menor que 1 (um). Igual a 1 (um), a PC não se
altera (não cresce nem decresce). Maior que 1 (um), a PC aumenta. Menor que 1
(um), a PC diminui. E é exatamente isso que verificamos nos dados experimentais
exibidos pela história da Estatística e da Ciência Econômica nos seus quatro
séculos de existência.
De
fato, do final do século XIX até a Primeira Guerra Mundial e nas três
décadas do pós II Guerra Mundial, houve extraordinário aumento da RN, baixa razão
r/RN e baixa PC. Ao longo dos demais períodos, nestes quatro séculos de
Capitalismo (economia de mercado, sem comando estatal) constata-se taxa de RN
baixa, alta razão r/RN, elevação da PC.
Karl
Marx, pois, não está certo, porque a PC não cresce sempre. Embora a História
relate mais longo período de crescimento, a acumulação não é infinita,
contínua, intrínseca ao mecanismo de funcionamento da economia de mercado, do Capitalismo.
Kuznets
também não está certo, porque depois de alcançar elevado nível de riqueza, a
PC, a PT ( Parcela do Trabalho) e Q podem decrescer, e até a PC crescer com
relação à PT.
A
Ciência Econômica tradicionalmente explica a distribuição da riqueza nacional
entre Capitalista e Trabalhador, através de função matemática que relaciona a
Parcela do Capital com a Poupança (Investimento) e a Renda Nacional. Piketty
invoca-a dizendo que se trata da Segunda Lei Fundamental do Capitalismo:
PC
= P/RN
PC
(Parcela do Capital), P (Poupança) e RN (Renda Nacional)
Esta
lei explica, igualmente, e de forma também direta, mais baixa a taxa de
crescimento da RN, mais alta é a razão P/RN e mais alta é Participação
Capitalista na Riqueza Nacional (Q)
Estes
quatro séculos da História da Estatística e da Economia insinuam que,
habitualmente, no longo prazo, a taxa de crescimento da RN é baixa e, portanto,
a razão P/RN é alta. A PC, pois, de fato, em geral, no longo prazo, se acumula
continuamente, se nada interferir no funcionamento da economia de mercado.
A
intuição de Karl Marx, pois, aproximou-se da verdade, quando percebeu que, nas
circunstâncias habituais, o Capitalismo, a economia de mercado, proporciona
aumento da Participação do Capital (PC) na Riqueza Nacional (Q). A Economia de
Mercado não é apocalíptica, mas pode desembocar em situações econômicas tais de
desigualdade social que provoque injustiça social e graves perturbações
sociais! Não avaliou, todavia, suficientemente que outros fatores naturais,
sociais, culturais e políticos influenciam também a Renda Nacional (RN),
flexibilizando-a e, assim, podendo elevar-lhe a taxa, abatendo a razão P/RN e reduzindo a Parcela do
Capital (PC).
Kuznets,
por seu turno, não está certo quando afirma que o Capitalismo, a economia de
mercado, contém em seu mecanismo de funcionamento as forças para o equilíbrio
econômico e a produção de uma sociedade do bem estar, baseada na justiça e no
mérito.
Este
fator econômico – aumento da qualificação (eficiência) do Capital – não é
habitualmente capaz de aumentar permanentemente de tal forma a Renda Nacional (RN) que consiga manter
a razão P/RN abaixo de 1.
Estas
reflexões restringem-se às duas primeiras das quatro partes, que compõem o livro
de Thomas Piketty.
A
propósito, quero encerrar estas considerações fazendo uma homenagem a Karlos
Rischbieter, de quem guardo um cartão de agradecimento, de quando era
Presidente da Caixa Econômica Federal e, sobretudo, profundo sentimento de
admiração pela personalidade, caráter e humanidade, demonstrados no exercício
da Presidência do Banco do Brasil, na década de 70 do século passado. É que
Karlos Rieschbieter produziu excelente estudo de apresentação da versão para o
Português, de Modern Economic Growth, de Kuznets, na série Os Economistas,
publicada pela Abril Cultural.
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