Essa
união da Igreja Cristã e Estado teve início com o Imperador romano Constantino
no século IV EC. Will Durant diz que para Constantino “o Cristianismo
significava... um meio, não um fim... Constantino aspirava a monarquia
absoluta, forma de governo que se beneficiaria do apoio religioso, a disciplina
hierárquica, e a autoridade ecumênica da Igreja talvez proporcionassem um
correlativo espiritual à monarquia.”
Will
Durant relata que Constantino, já Imperador Romano, promoveu um concílio dos
bispos cristãos num salão do palácio
imperial em Niceia em 325 EC. Abriu os debates em exortação à unidade.
Acompanhou-os. Moderou a violência dos debatedores. Participou dos debates. E
aprovou o Credo de Niceia, aquele em que se consagrou o dogma de fé da
divindade de Jesus Cristo e da Trindade Divina. Agiu como Pontifex Maximus,
título, segundo Geoffrey Barraclough, de que o imperador romano só foi
despojado em 397 EC. Esse historiador esclarece ainda mais: Constantino
“...resolveu, em 325, no famoso Concílio de Niceia, a controvérsia com os
arianos, impondo a sua própria fórmula.”
Will Durant afirma que o Concílio de Niceia
“...assinalou a substituição do paganismo pelo cristianismo como expressão
religiosa do Império, tornando definitiva a aliança do imperador com a fé
triunfante. Uma nova civilização, baseada em uma nova religião, iria agora
erguer-se das ruínas de uma cultura exausta e de um credo moribundo. A Idade
Média começava.” Atribui também à sagacidade de Constantino, que matou irmão,
filho e mulher, o fato de só se haver batizado em idade avançada, próximo a
morte, para garantir-se da pureza da alma, a fim de não ser impedido pelos seus
pecados de ingressar no Reino dos Céus.
Teodósio
I foi o último imperador romano, últimos anos da Idade Antiga. Tão poderoso que
interferia na administração da Igreja e até na definição da doutrina cristã,
conduzindo, como Constantino, os sínodos e concílios para a definição dos
dogmas, segundo o que julgava ser conveniente ao interesse do Império. Fez-se
batizar e agia para que todo o império adotasse a doutrina cristã romana. Foi
saudado pelos bispos no Concílio de Constantinopla (448 EC) como
imperador-pontífice! Ele se achava em Milão, quando os habitantes de
Tessalônica insurretos assassinaram a autoridade local. Em represália, o
imperador ordenou a matança de todos os amotinados. Calcula-se que sete mil
pessoas tenham sido executadas. Quando em Milão, após esse episódio, Teodósio
pretendeu participar dos atos litúrgicos na igreja da cidade, Ambrósio, o bispo
da Igreja local, postou-se à porta do templo, impediu-lhe a entrada, acusou-o
da morte de inocentes, e impôs-lhe humilhantes atos de longa penitência.
Teodósio submeteu-se humildemente ao castigo, permanecendo recluso no seu
castelo, sem vestir os trajes imperiais, segregado da comunidade cristã
milanesa por oito meses, quando, comprovado seu arrependimento e tendo
suplicado publicamente perdão pelo genocídio, foi reintegrado no seio da comunidade
cristã da cidade.
Durante
mais de um milênio, do século V ao século XVIII EC, a sociedade europeia foi
organizada à luz da mentalidade cristã romana agostiniana. Entre os dogmas
indiscutíveis incluía-se o da Providência Divina. F.-J. Thonnard, em seu
Compêndio de História da Filosofia, informa que o dogma da Providência Divina
era fundamental na concepção filosófica de Agostinho, juntamente com o de Deus,
Verdade Subsistente. E explica que Agostinha entendia que eternamente Deus, a
Verdade Subsistente, tem a ideia de tudo que existe e é exatamente isso que faz
que existam as coisas, tudo, inclusive, os atos que nós homens praticamos, até
os nossos pensamentos e desejos. Deus é causa eficiente e estrutural de
absolutamente tudo o que existe.
Assim,
toda aquela concepção cosmológica, filosófica, teológica e social da Idade
Média sofre influência de Agostinho. Thonnard ensina que, segundo Agostinho, “A
Igreja e o Estado são duas sociedades perfeitas e soberanas, a primeira na
ordem sobrenatural da salvação eterna, a segunda na ordem temporal; assim o Estado
fica subordinado à Igreja,...; o Estado deve pois ser, nos seus chefes como nos
seus membros, o filho submisso da Igreja...”
Entre
as suas premissas constava a teoria de que a Terra é o centro do Universo,
criado por Deus, que quer viva o Homem nesse paraíso central, para ser pelo
Homem reconhecido e glorificado! Entre os seus corolários encrustam-se o da
organização social (senhores e servos) e o da origem divina dos reis (certas
famílias nascem para comandar, a realeza é destino divino, o poder político é
herança). A sociedade compõe-se de três classes: o clero (ora, harmoniza a
sociedade com a divindade e, sobretudo, doutrina), a nobreza (manda, garante a
segurança, faz guerras de seu interesse, diverte-se e, com o clero, dispõe de
toda riqueza) e o povo (trabalha, arca com as despesas de toda sociedade,
sobretudo a luxuosa existência da nobreza e do clero, e morre na guerra como
turba de combatentes). O rei é o dono da terra do reino e o senhor das pessoas.
No final do século XVIII, já decorridos três séculos da Idade Moderna, a França
era o maior e mais rico império europeu, com população de 27 milhões de
habitantes, ainda composta do clero (restringia-se a 130 mil pessoas), da
nobreza (cerca de 200 mil) e do povo (os restantes 26,670 milhões de
indivíduos)! O povo era obrigado até a pensar na conformidade da vontade do
rei, que governava o país no seu interesse, apoiado pelo clero e nobreza que
compartilhavam prodigamente dos resultados da administração régia.
A
sujeição do povo era, pois, crucial para a segurança da sociedade medieval.
Essa sujeição era obtida através de cruel repressão às transgressões da lei e
fiel prática da doutrina pregada pelo clero, que ensinava que a vida terrena
seria mero estágio probatório para obtenção do prêmio de uma vida feliz eterna
no Reino dos Céus. Muito embora a Inquisição só haja sido instituída no século
XIII, e como instituição eclesiástica, o Estado medieval entendia a heresia
como grave atentado à ordem pública, de modo que era reprimida com extremo rigor,
cruelmente. Punia-se com confissões e penitências públicas, longas e
vexatórias; com prisões perpétuas em masmorras inabitáveis, com açoites e
mutilações de todos os tipos; com torturas; com trabalhos forçados e degredos
em locais inabitáveis; com a morte na forca, na guilhotina, na fogueira,
decapitado, empalado, esquartejado, etc.
Século
e meio depois de Agostinho, um nobre romano e prefeito de Roma se convence de
que o fim do mundo está próximo. Emprega toda a sua fortuna na fundação de um
mosteiro de que se torna o abade. Em certa ocasião, vago o trono do Papa, o
povo de Roma se levanta e obriga o abade Gregório, que nem sacerdote era, a
aceitar ser Papa. Gregório enviou seus monges para todos os recantos da Europa.
Os monges de Gregório Magno estenderam o domínio da Igreja de Roma a toda a
Península Itálica, à Península Ibérica, à França, às Ilhas Britânicas, aos
países nórdicos, à Alemanha, à Europa Central e até a regiões do Oriente
Europeu, pregando a doutrina agostiniana, ameaçando todos os povos, que não
aderissem ao credo e à moral cristã, com o fogo do Inferno que queima
atrozmente sem consumir, eternamente.
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