domingo, 2 de setembro de 2012

217. Uma Proposta de Estrutura Administrativa

A EFPC tem razão de ser moral, sociológica, econômica, histórica e jurídica. A razão moral é a DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. O cidadão tem o direito de viver com dignidade até o fim da existência, inclusive nos episódios e nas fases de incapacitação laboral. A sociedade tem o interesse de promover a justiça social, mediante a técnica da previdência social, a fim de alcançar a paz social. As empresas, sobretudo as poderosas, têm interesse em recrutar e manter empregados dedicados e competentes, mediante a garantia de condições materiais estáveis por toda a vida. Associações para prestação de benefícios previdenciários, criadas ou pelos trabalhadores ou pelos patrões ou órgãos de classe ou pelo próprio Governo, constituem prática multissecular na história pátria. O Estado brasileiro, desde meados do Segundo Império, e sobretudo na terceira e quarta décadas do século passado, estabeleceu normas legais que criaram direitos a benefícios previdenciários para muitos brasileiros que ainda permanecem vivos. O direito adquirido é princípio constitucional (artigo 5º-XXXVI), desde a Constituição Federal de 1934.

A maior EFPC atual foi, na sua origem, há mais de um século, associação criada e mantida por um grupo de empregados do Banco da República do Brasil. Foi, no início, uma associação privada, somente dos empregados, com recursos provenientes somente da contribuição dos empregados ou de dádivas eventuais da sociedade. Não obstante tudo isso, precisou da aprovação do Banco para ser criada e os Estatutos não podiam ser alterados sem aprovação do Banco.

Atualmente, toda a atividade de natureza previdenciária se acha atrelada pelo artigo 202 da Constituição Federal ao Regime da Previdência Privada, isto é, está submetida a um conjunto de princípios e normas que regem as relações jurídicas nela existentes. Assim, a Previdência Privada Complementar ocupa parte do espaço do Direito Privado, desde que respeite as normas estabelecidas no Regime da Previdência Privada. Respeitados esses limites, valem as cláusulas contratuais.

A Lei Complementar 109/2001 é a lei básica da previdência complementar. Um dos princípios estabelecidos pela LC 109 é que a previdência privada complementar SÓ PODE SER PROPORCIONADA através de uma EPC, isto é, entidade cuja PRINCIPAL FINALIDADE seja INSTITUIR E EXECUTAR PLANOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS (artigo 2º).

A LC 109 reconhece dois tipos de EPC, a saber, a EAPC que acolhe toda a tradição brasileira de previdência social proporcionada por EMPRESAS, como as companhias de seguro, e a EFPC, que acolhe toda a tradição brasileira de previdência social proporcionada por associações de classe, de empregados, de empregados com patrocínio de patrões, ou fundação.

A LC 109 estabelece que EFPC:

- é (artigo 31) aquela EPC que só pode administrar e executar planos de benefícios previdenciários para empregados de determinada empresa ou empresas; ou para servidores de entes do Estado; as supramencionadas empresas e entes do estado são PATROCINADORES;

ou que só pode administrar e executar planos de benefícios previdenciários para associados ou membros de determinadas pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, denominadas Instituidores;

- tem a finalidade EXCLUSIVA de ADMINISTRAR e EXECUTAR PLANOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS (Artigo 32-Parágrafo Único);

- é instituída pela Patrocinadora ou Instituidora; o Patrocinador, porém, é Patrocinador de um Plano de Benefícios Previdenciários e tal se torna mediante um Convênio de Adesão ao Plano assinado com a EFPC (artigo 13);

- é constituída por um Estatuto (artigo 33);´

- é pessoa jurídica, organizada na forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos (artigo 31);

cujas relações com os Participantes são ordenadas pelo Regulamento Básico (artigo 33);

e cuja organização administrativa deve constar, no mínimo, dos Conselhos Deliberativo e Fiscal, e da Diretoria Executiva (artigo 35);

- os Conselhos deverão ter a participação dos Participantes e Assistidos (Participante no gozo dos benefícios) no mínimo em um terço das vagas, obedecendo-se o princípio da proporcionalidade (número de participantes e valor do patrimônio) nessa participação, em se tratando de EFPC multipatrocinada (artigo 35-§2º).

- no tocante aos membros da diretoria executiva, a LC 109 exige que tenham instrução de nível superior, experiência em diversas áreas de gestão, sejam isentos de condenação criminal e penalidade administrativa na área previdenciária e no serviço público.

- Patrocinador e Instituidor têm o dever de supervisão sistemática das atividades de suas respectivas entidades fechadas.

O que acabamos de descrever constitui tudo o que a LC 109 prescreve com relação à estrutura administrativa da EFPC, que pode ser tanto uma fundação quanto uma sociedade civil, tanto a que tem patrocinador quanto a que tem instituidor. Isto é, trata-se de uma EFPC que pode ser até totalmente mantida pelo Instituidor. Tudo o que vimos até aqui é produto, portanto, daquele princípio que vemos estampado no artigo 3º, inciso VI, da LC 109: “A ação do Estado será exercida com o objetivo de... proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.”

O Projeto de Reformulação das Leis do Regime de Previdência Privada, de autoria do Deputado Ricardo Berzoini, propõe a seguinte organização administrativa das EFPC:

“Art. 19. - Os § § 1º e 5º do art. 35 da Lei Complementar 109, de 29 de maio de 2001, passam a vigorar com as seguintes redações:

"Art. 35 ......

§ 1º. A composição dos conselhos deliberativo e fiscal e da diretoria-executiva será paritária entre representantes dos patrocinadores e dos participantes e assistidos.

§ 5º. Serão informados ao órgão regulador e fiscalizador os responsáveis pelas aplicações dos recursos da entidade e pela administração dos planos de benefícios, escolhidos dentre os membros da diretoria-executiva."(NR)

Art. 20. - Incluem-se os art. 35-A e incisos I a VII, art. 35-B e parágrafo único à Lei Complementar 109, de maio de 2001 com as seguintes redações:

"Art. 35-A. Ao conselho deliberativo compete a definição das seguintes matérias:

I - política geral de administração da entidade e de seus planos de benefícios;

II - alteração de estatuto e regulamentos dos planos de benefícios, bem como a implantação e a extinção deles e a retirada de patrocinador;

III - gestão de investimentos e plano de aplicação de recursos;

IV - autorizar investimentos que envolvam valores iguais ou superiores a cinco por cento dos recursos garantidores;

V - contratação de auditor independente atuário e avaliador de gestão, observadas as disposições regulamentares aplicáveis;

VI - nomeação e exoneração dos membros da diretoria-executiva;

VII - exame, em grau de recurso, das decisões da diretoria-executiva."

"Art. 35-B. O conselho fiscal é o órgão de fiscalização e controle interno da entidade.

Parágrafo Único - O conselho fiscal deverá apresentar relatório de controles internos, com periodicidade mínima semestral."

Antes de examinar essa proposta, entendo importante se ressalte um aspecto da EFPC que se acha implícito no que acima se expôs. A EFPC é pessoa jurídica autônoma, diferente da patrocinadora, capaz de assumir obrigações e adquirir direitos até com relação à patrocinadora. É capaz de ter patrimônio e propriedade próprios. Seu patrimônio não é capital da empresa ou entidade estatal patrocinadora. Não é capital investido pela patrocinadora. É reserva previdenciária, reserva de um Plano de Benefícios Previdenciários, reserva para pagamentos das obrigações contratuais do Plano de Benefícios Previdenciário da EFPC. Alguns autores o classificam como um patrimônio de uma seguradora, outros o entendem como um fideicomisso confiado à EFPC para futura transferência aos Participantes. A EFPC é pessoa de direito privado. Não é subsidiária da empresa instituidora e patrocinadora do Plano de Benefícios Previdenciários, nem lhe pertence ao grupo econômico. Tem organização própria, órgãos de administração próprios e escrituração própria e independente. É altamente especializada e especificada na sua destinação.

Wladimir Novaes Fernandez, ressaltando esse aspecto da instituição EFPC, acrescenta (página 1263 do Curso de Direito Previdenciário, 4ª edição): “Não vige solidariedade de qualquer espécie, civil ou fiscal entre a mantenedora e a mantida. APENAS A OBRIGAÇÃO DE SUPERVISIONÁ-LA. A individualidade das duas pessoas jurídicas autoriza débitos e créditos de ambas as partes e ATÉ A POSSIBILIDADE DE COBRANÇA EXECUTIVA.”

Tudo isso em razão dos DOIS MOTIVOS por que foi ela assim concebida, a saber, RETIRAR O PATROCINADOR E O INSTITUIDOR DA RELAÇÃO JURÍDICA DO PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS, bem como PROTEGER OS RECURSOS PREVIDENCIÁRIOS DA CUPIDEZ DA EMPRESA CAPITALISTA E DO ESTADO TRIBUTARISTA LEVIATÂNICO.

Extraímos, portanto, dois princípios: O PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA OU AUTONOMIA ADMINISTRATIVA E O PRINCÍPIO DA SUBMISSÃO FISCALIZADORA, no que tange às relações administrativas entre Patrocinador ou Instituidor e EFPC.

Convém atentar também para a atual preocupação, existente na área governamental, com relação ao provável desinteresse que possa existir em nossa sociedade capitalista pela criação e manutenção desse tipo de previdência complementar, haja vista a alegação para se discutir o Projeto de Retirada de Patrocínio, nos termos propostos. Também, na minha opinião, o Estado jamais aceitará criar EFPC, em que não possa atuar PREVENTIVAMENTE contra os desmandos administrativos dos gestores e dos interessados diretos e únicos pelas reservas previdenciárias, os Participantes.

Isso posto, proponho:

"Conselho Deliberativo e Diretoria Executiva sejam constituídos de elementos eleitos pelos Participantes e Assistidos, exceto UM conselheiro e UM diretor, que será indicado pelo Patrocinador ou Instituidor. O diretor indicado pelo Patrocinador ou Instituidor seria o diretor financeiro. O Conselho Fiscal seja constituído de elementos indicados pelo Patrocinador ou Instituidor, exceto UM que será eleito pelos Participantes e Assistidos.

O Conselho Fiscal terá poderes para promover a suspensão de qualquer decisão do Conselho Deliberativo e da Diretoria Executiva, que entenda atentar contra a integridade garantidora das Reservas do Plano de Benefícios. Não se resolvendo a controvérsia no âmbito da própria administração da EFPC, ela seria submetida ao arbítrio da PREVIC."

A participação do Patrocinador ou Instituidor no Conselho Deliberativo e na Diretoria Executiva pretende promover o perfeito e continuado conhecimento de tudo o que ocorre na EFPC.

Entendo que dessa forma os Participantes e Assistidos passarão a ser encarados como cidadãos dignos, responsáveis e competentes, administrando reservas que, se de fato ainda não lhes pertencem, só pertencem à EFPC em fideicomisso, para futura transferência aos Participantes Assistidos. Evitar-se-á a administração com a finalidade de dar lucro para o Patrocinador ou Instituidor privado, ou renda para o GOVERNO do Estado. Promover-se-á administração focada no INTERESSE PREVIDENCIÁRIO DA EFPC, como deve ser e como o Estado quer (artigo 3º-VI da LC 109). Ao mesmo tempo, Patrocinador ou Instituidor terão PLENA CONDIÇÃO de SUPERVISIONAR a EFPC, sem risco maior de ver-se envolvido em aumento da Contribuição ou liquidação da EFPC por motivo de má gestão. Através dos representantes no Conselho Deliberativo e na Diretoria Executiva, a entidade mantenedora, além de SUPERVISIONAR e conhecer toda a urdidura do processo de gestão, terá oportunidade de aconselhar, de manifestar-se e de posicionar-se sobre todos os atos de administração.

Nem se pretenda contestar, sob a alegação de que a PREVIC estaria sendo introduzida indevidamente na própria gestão da EFPC, porque, como aqui está bem claro, se trata de medida de supervisão, adotada pelo próprio Conselho Fiscal, isto é, trata-se de um ato de fiscalização, e da melhor espécie porque um ato de proteção prévia da integridade patrimonial da EFPC.

Creio que essa sugerida organização da gestão da EFPC está em acordo com a realidade da Previdência Social, a legislação previdenciária e os interesses dos Mantenedores e do Estado

 

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