sexta-feira, 21 de outubro de 2016

361.Reformulação da Súmula 288 do TST - Análise (continuação)

Cláusulas Pétreas

Entendo que esta matéria das Cláusulas Pétreas seja muito importante para decidir sobre a correta formulação da Súmula 288 do TST. Por isso, estou dedicando mais este texto a esse debate.

Já detemos razoável noção do que seja uma cláusula pétrea. É uma norma constitucional que não pode ser retirada da Constituição nem modificada por Emenda Constitucional. Muito menos pelo Presidente da República, ou lei, ou instrução. Muito menos por um juiz, mesmo que seja um colegiado deles, o maior deles, como é o STF, tão importante ela é. E tanta é essa importância que a cláusula pétrea é na prática o exercício da soberania popular. A cláusula pétrea coloca o indivíduo humano, o cidadão, acima de todos os Poderes do Estado e de todas as Autoridades do Estado. O indivíduo humano é inatingível nesses seus direitos. O cidadão brasileiro é soberano.

Já estamos familiarizados com esta cláusula pétrea: Art 5º.II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

Ora, a PREVI (Carta-Circular nº 351, em 1966) diz que o Banco decidiu, daquela época em diante, continuar pagando aposentadoria, exatamente como vinha pagando (Circular-Funci-390/55), não mais diretamente, e, sim, através da PREVI.

Eu fizera um contrato de trabalho com o Banco, 11 anos antes, contrato a termo, de que ele me pagaria o complemento da aposentadoria, completados os trinta anos de serviços, e que essa aposentadoria seria, até meu último dia de vida, igual ao valor do meu salário do último dia de trabalho.

De acordo com essa cláusula pétrea, o Banco unilateralmente, como fez, poderia alterar as condições de meu contrato de trabalho, doze anos decorridos, desde meu ingresso no Banco? Penso que não. E ele, de fato, não modificou o valor do complemento de minha aposentadoria. Modificou, porém, a pensão e introduziu a contribuição dos funcionários, além, é claro, do mais importante: transferiu para a PREVI a responsabilidade pelo pagamento do complemento desses dois benefícios, embora se mantivesse comprometido com o seu valor integral, em virtude das normas internas do funcionalismo do Banco.

Por que assim penso? Porque a irretroatividade da lei já existia naqueles tempos, como vimos, na Constituição de 1934. Eu já possuía um direito individual, a termo, é verdade, do complemento de aposentadoria e pensão, de 100%, sem ônus algum para mim, em virtude de meu contrato de trabalho. E pacta sunt servanda, os contratos devem ser honrados. Juiz nenhum, lei nenhuma, Emenda Constitucional nenhuma, autoridade nenhuma podia naqueles tempos de 1966, nem agora pode extinguir esse meu direito individual, porque é uma lei POSTERIOR A 1955! Quem o diz? Aquele inciso II do artigo 5º da Constituição, reforçado por estas outras cláusulas pétreas desse mesmo artigo 5º, todas elas tratando claramente da irretroatividade da lei:
“XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;
XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;”

ESSAS LEIS AÍ EXISTEM EXATAMENTE PARA ISSO, isto é, PARA EVITAR QUE ATOS COMO ESSES EM CONTRATOS COM PRESTAÇÕES A TERMO DESFIGUREM, DESQUALIFIQUEM, ANULEM OS COMPROMISSOS CONTRATUAIS ASSUMIDOS ANTERIORMENTE! Ou não é?!

No decurso da segunda metade do século passado, várias modificações ocorreram nesse contrato, promovidas unilateralmente pelo Banco e até por intervenção do Governo, como exigência de prazo superior a trinta anos de trabalho para aposentadoria integral, que prejudicaram tanto os pré-67 quanto os pós-67. Em razão do compromisso do Banco (acho que até expresso nas instruções internas do funcionalismo do Banco), essas alterações são também afrontas à cláusula pétrea da irretroatividade da lei, para estes últimos igualmente.

Acredito que a aposentadoria integral foi inegavelmente cláusula do meu contrato de trabalho e, portanto, está protegida pelas cláusulas pétreas  da Constituição, e nominalmente, consoante reza o Art.7º da Constituição: ”São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXIV – aposentadoria”


Ora, o direito ao trabalho é claramente um direito individual, e ligadíssimo aos valores, princípios e direitos à Vida e à Dignidade Humana.  Na minha opinião, a aposentadoria é matéria intimamente ligada ao trabalho e também um direito individual, não apenas nas engrenagens naturais da vida e da sociedade, como igualmente nas ilações da jurisprudência e da nossa  Constituição.

Até me parece que a Constituição também assim o entende em muitos dos seus preceitos:” Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
IV - salário mínimo...
VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;
V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;
VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;
VII - garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável;
VIII - décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria;
IX – remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;
X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;
XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; (vide Decreto-Lei nº 5.452, de 1943)
XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo neociação coletiva;
XV - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;
XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal; (Vide Del 5.452, art. 59 § 1º)
XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;
XXIV – aposentadoria”

Se salário mínimo e horas de trabalho são cláusulas contratuais do trabalho, por que aposentadoria não é?

Aliás, se minha memória de 90 anos não me está traindo, parece-me que, em anos recentes, o STF teve de ocupar-se com esse assunto, no seu próprio interesse, quando o Governopretendeu estender a idade da aposentadoria compulsória dos juízes, de 70 para 75 anos. Não sei se  isso foi de fato modificado. Apenas me resta a lembrança, não sei se correta, de que alguns juízes, já na iminência de aposentar-se, sugeriram que a lei viesse com a excepcionalidade para aqueles já juízes que preferissem aposentar-se aos 70 anos.”

Essa íntima ligação entre trabalho e aposentadoria merece ser examinada, já que a Constituição dela trata, podendo ser que aí encontremos a explicação para a orientação adotada pelo STF.

(continua)





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