domingo, 2 de novembro de 2014

310. A CONTESTAÇÃO da PREVIC à ACP - VI (continuação)


Estabelecida a premissa de que o CONTRATO PREVIDENCIÁRIO É DE DIREITO PRIVADO, a CONTESTAÇÃO prossegue focando o artigo 17 da LC 109/01, esclarecendo que ele rege as modificações contratuais que ocorrerem: “As alterações processadas nos regulamentos dos planos aplicam-se a todos os participantes das entidades fechadas, a partir de sua aprovação pelo órgão regulador e fiscalizador, observado o direito acumulado de cada participante.

        Parágrafo único. Ao participante que tenha cumprido os requisitos para obtenção dos benefícios previstos no plano é assegurada a aplicação das disposições regulamentares vigentes na data em que se tornou elegível a um benefício de aposentadoria.”

 

Minha opinião

Não discutirei o senso de justiça desse artigo nem sua compatibilidade com a Constituição Federal. Suspeito que tal mandamento não será tranquilamente aceito pelos juízes no seu Regime Próprio de Previdência Social...

Creio que tenho razões para assim pensar, já que, quando no Banco do Brasil ingressei em 1955, a Previdência Complementar fazia parte do Contrato de Trabalho. As cláusulas previdenciárias da data do Contrato de Trabalho valiam até a morte do contratante e da pensionista. Agregavam-se ao Contrato todas as cláusulas posteriores aditivas de benefícios. E não se agregavam as cláusulas posteriores subtrativas. Tudo isso foi-nos extorquido mediante a EC-20/98 e esse artigo 17 da LC 109/01. Aceito-o  porque é lei.

É-me, porém, intrigante que de tantos e tão importantes artigos da LC 109/01, a CONTESTAÇÃO foque exatamente nesse artigo 17. Foi essa a estratégia escolhida para a defesa da Reversão de Valores. Aceito, porque é OUTRO MANDAMENTO LEGAL QUE DEVE SER CUMPRIDO. Sinto-me curiosamente instigado para constatar se ele realmente é de tal robustez legal que sustente a legalidade da Reversão de Valores. FAÇO, porém, UMA ADVERTÊNCIA INQUESTIONÁVEL: ALTERAÇÃO ALGUMA DO CONTRATO PREVIDENCIÁRIO PODE MANDAR O QUE A LC 109/01 PROÍBE ou PROIBIR O QUE A LC 109/01 MANDAR!

 

A CONTESTAÇÃO infere desse artigo 17 o seguinte princípio: o Contrato Previdenciário é “suscetível de alterações pela própria autonomia da vontade das partes contratantes... respeitado o direito acumulado de cada participante, isto é, as correspondentes reservas acumuladas em seu favor até a data da alteração e o direito adquirido do participante (que já cumpriu todos condicionamentos exigidos para gozo do benefício previdenciário)”.

 

Minha opinião

Discordo dessa autonomia das partes (Patrocinador e Participante) para as alterações do Contrato Previdenciário, que parece querer insinuar que elas decorrem tão somente do  igualitário e perfeito mútuo consenso entre as partes.

 

O artigo 35 da LC 109/01 exige que a estrutura administrativa da EFPC seja composta de Conselho Deliberativo, Diretoria Executiva e Conselho Fiscal. E exige que APENAS UM TERÇO DE CADA UMA DESSAS INSTÂNCIAS SEJA PREENCHIDO POR PARTICIPANTES!

 

O artigo 41-§2º da LC 109/01 confere ao PATROCINADOR a obrigação de SUPERVISIONAR a EFPC.

 

Se a EFPC é ligada a entidade estatal, os artigos ll e 15 da LC 108/01 determinam que os Conselhos Deliberativo e Fiscal devem ser paritariamente compostos por representantes indicados pelo Patrocinador e eleitos pelos Participantes. A Presidência do Conselho Deliberativo (órgão gestor supremo da EFPC, segundo o artigo 10º), todavia, é ocupado por representante nomeado pelo Patrocinador e detém o voto de Minerva. Mais, o Conselho Deliberativo tem os poderes de nomear e exonerar os membros da Diretoria Executiva, bem como examinar, em grau de recurso, as decisões da diretoria executiva (artigo 13). Alteração, que implique aumento de contribuição, necessita de prévia aprovação do ÓRGÃO ESTATAL ao qual o Patrocinador se subordina (artigo 4º).

Como a própria CONTESTAÇÃO esclarece qualquer alteração precisa ser aprovada pela PREVIC.

O Estado (a PREVIC) deve guiar-se nesse mister pelo artigo 3º-VI da LC 109/01: proteger o INTERESSE DOS PARTICIPANTES. Ocorre, todavia, que ele vem alegando o mandamento do artigo 3º-II: “disciplinar, coordenar e supervisionar as atividades reguladas por esta Lei Complementar, compatibilizando-as com as políticas previdenciária e de desenvolvimento social e econômico-financeiro;” para justificar claras agressões aos interesses dos Participantes, como por exemplo, na Reversão de Valores e na Resolução que disciplina a retirada de Patrocínio.

Compatibilizar é HARMONIZAR, isto é, ordenar de tal forma que OS DOIS OBJETIVOS (previdência-desenvolvimento e interesse) SE REALIZEM, SEM QUE NENHUM DELES SEJA SACRIFICADO! É ato de alta sabedoria administrativa!

 

Mais. As mais importantes e profundas alterações do Contrato Previdenciário não têm origem em livre e mútuo consenso entre Patrocinador e Participantes. Elas se originam nos mandamentos e proibições IMPOSTOS pelo CNPC, o órgão estatal ordenador do REGIME da Previdência Privada Complemenar e intérprete das LC 109/01 e 108/01, exatamente aquelas duas características constitucionais, a meu ver, IMPORTANTÍSSIMAS, mas SILENCIADAS pela CONTESTAÇÃO!

Pois bem. O CNPC consta de NOVE membros – sendo SEIS estatais e TRÊS privados (entre estes um representante dos Participantes). Cada membro tem o direito a UM voto, sendo que o Presidente, isto é, o Ministro da Previdência Social, tem também direito ao voto de Minerva. São, portanto, ao todo DEZ votos. O Estado tem direito a SETE votos. ABSOLUTO PREDOMÍNIO DA VONTADE IMPOSITIVA DO ESTADO. Pode-se afirmar, em sã consciência, que AS ALTERAÇÕES CONTRATUAIS AÍ ORIGINADAS (as mais importantes e profundas) SÃO RESULTADO DA AMPLA AUTONOMIA DAS VONTADES DE PATROCINADOR E PARTICIPANTE?! O poder dos membros privados juntos é precisamente de TRÊS votos contra SETE estatais. E o poder dos Participantes reduz-se a apenas UM voto contra NOVE!

 

Há ainda mais. Suspeito que a Consultoria Jurídica da PREVIC esteja impedida até de discutir a ILEGALIDADE da Reversão de Valores, haja vista a seguinte proibição do artigo 28 da LC nº 73/63, a Lei da Advocacia Geral da União: “... aos membros efetivos da Advocacia Geral da União é vedado contrariar súmula, parecer normativo ou orientação técnica adotada pelo Advogado Geral da União.”

 

A CONTESTAÇÃO conclui, então, esse introito, esclarecendo que a missão da PREVIC é aprovar os Estatutos das EPC e os Regulamentos Básicos, bem como suas alterações, desde que estejam conformes com a legislação e seus normativos ancilares.

 

Minha opinião

Concordo. Pode, todavia, ocorrer que esses normativos ancilares possam conter, por lamentável equívoco, alguma ilegalidade. E ilegalidade deve ser inquestionavelmente eliminada, como nos parece ocorrer com limpidíssima evidência, nesse caso da criação da Reversão de Valores. Essa Reversão de Valores necessita ser eliminada, como comprova a ACP.

 

Da leitura destes seis últimos textos, aqui expostos no meu blog, entendo que a premissa que esse introito da CONSTESTAÇÃO pretendeu estabelecer, a saber, O CONTRATO PREVIDENCIÁRIO COMPLEMENTAR É ALTERÁVEL PELA LIBÉRRIMA AUTONOMIA DAS VONTADES DO PATROCINADOR E DOS PARTICIPANTES, SOFRE DO VIÉS DA PARCIALIDADE DO ADVOGADO DE DEFESA. Ela, na minha opinião, foi propositadamente elucubrada segundo as conveniências  do advogado para conduzir à conclusão que lhe interessa. Ela não foi elucubrada com a imparcialidade que cabe manter o jurista para obter a correta formulação da premissa que produz a correta conclusão.

ESSA PREMISSA É, portanto, FALSA.

Premissa falsa conduz a conclusões falsas, como já vimos em texto anterior.

Logo, a conclusão a que ela pretende chegar, a saber, a REVERSÃO DE VALORES É LEGAL É FALSA.

 

E a PREMISSA que a CONTESTAÇÃO estabeleceu é falsa pelos quatro motivos expostos nestes meus seis últimos textos do blog, a saber:

- omitiu duas características CONSTITUCIONAIS importantíssimas, a saber, a PREVIDÊNCIA PRIVADA COMPLEMENTAR É REGIME E DEVE OBSERVAR FIELMENTE OS MANDAMENTOS E PROIBIÇÕES DA LC 109/01 e, em situações específicas, também os da LC 108/01;

- o PATROCÍNIO é um CONTRATO DE ADESÃO, assim como a FILIAÇÃO DO PARTICIPANTE SE FAZ MEDIANTE ADESÃO AO CONTRATO PREVIDENCIÁRIO, e CONTRATO DE ADESÃO, é óbvio, LIMITA FORTEMENTE A AUTOMIA DA VONTADE DOS CONTRATANTES;

- a ATIVIDADE ESTATAL INTERFERE INTENSAMENTE NO CONTROLE DA AUTONOMIA DOS DOIS CONTRATANTES, PATROCINADOR e PARTICIPANTE, E MUITO MAIS AINDA NA AUTONOMIA DESTE ÚLTIMO;

- por fim, ATÉ AO PATROCINADOR É CONFERIDO PELA LEI O PODER DE LIMITAR A AUTONOMIA DO PARTICIPANTE!

 

Na minha opinião, pois, essa premissa, O CONTRATO PREVIDENCIÁRIO É DIREITO PRIVADO, tal como essa expressão é entendida pela CONTESTAÇÃO, se me apresenta irretorquivelmente FALSA!

(continua)

4 comentários:

  1. Amigo Edgardo,

    Então a Resolução CGPC nº 26/2008 representa o produto da desinteligência, ou até lapso, é, é isso mesmo, talvez não soubessem de fato que não detinham o poder de criar leis ou resoluções com poderes de lei, mesmo seu presidente o senhor José Barroso Pimentel sendo então senador pelo estado do CE, que nomeado ministro no MPAS era também o presidente do CGPC, à época desta tamanha traquinagem sórdida?

    Cláudio Augusto Falco

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  2. Meu amigo Cláudio
    Acho, na minha ignorância, que os grandes juristas do Governo não intenderam nadinha da LC 109/01... e agora estariam numa enrascada que precisam evitar... É coesão de alto a baixo...
    Edgardo

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  3. Caríssimo amigo,

    A coesão de alto a baixo tentando esconder, camuflar, acredito que devam existir, mais com o intuito de dissimular a coerência que é a relação lógica entre as ideias, legalidade, pois essas devem se complementar, e, não resultando na contradição entre as partes dos textos da Constituição Federativa do Brasil e as LC's nº 109/2001 e 108/2001 com a vulgaridade que é a Resolução CGPC 26/2008.

    Cláudio Augusto Falco

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  4. Cláudio amigo
    Suspeitas várias povoam minha mente...
    Edgardo

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