sexta-feira, 24 de abril de 2009

101. A Pobreza Absoluta


O Senhor Ministro da Fazenda, pondo em execução a política econômica do feijão com arroz que se propôs, acaba de revelar as novas linhas de ação econômica do Governo. Vai reaproximar o País à poupança externa governamental e privada, mediante acordos com os bancos credores e o FMI. Vai orientar a produção para o consumidor, deixando produzir mais e melhor o que o povo quer, mediante a desestatização. Vai procurar recuperar o mecanismo de preços, combatendo a inflação.
Ao tratar deste último assunto, fez a assustadora revelação de que sessenta por cento dos recursos arrecadados pelo Governo são consumidos em salários do servidor público, podendo a curto prazo atingir a noventa por cento, caso não se ponha cobro a tais despesas.
Tudo isso precisa ser feito. Aplaudo todas essas medidas. A mais importante de todas as providências é a tentativa de religar o sistema econômico nacional à poupança externa, que deveria afluir para o Brasil na forma de investimento em vez de empréstimos, vindo auferir lucros, mas retribuindo com aumento de empregos, avanço tecnológico, desenvolvimento produtivo e melhoria das condições de vida do povo. É dessa forma que se combate adequadamente a pobreza absoluta, isto é, a pobreza daquele país que não produz o suficiente para satisfazer as necessidades da população. É preciso ampliar o sistema de produção cuja oferta de empregos vai atrair o funcionalismo público excedente e a parte populacional marginalizada.
Aqui se centra minha preocupação maior. Para os economistas clássicos, em geral, a dívida pública sempre era um mal. Malthus contestava, porque admitia a possibilidade da depressão econômica ou superprodução, que deve ser combatida com o aumento das despesas públicas, quando os gastos dos particulares se mostram retraídos, provocando as falências e o desemprego. Neste caso, como diz Paul Samuelson, existe a pobreza relativa. O povo não consome e sofre privações em meio à superprodução. O sistema produtivo é satisfatório, mas o povo não tem capacidade de adquirir os bens produzidos de que tanto necessita. A pobreza relativa é a pobreza em meio à abundância. É o suplício de Tântalo. O déficit público é instrumento de política de estabilidade econômica. Corrige os desvios deflacionários do ciclo econômico. Não é política de desenvolvimento.
Penso que o problema econômico do Brasil consiste na pobreza absoluta e só se resolve com aumento de investimento (construção de fábricas, casas comerciais, meios de transporte etc.) e controle da natalidade. A população brasileira é excessiva para os investimentos realizados. A população brasileira é também excessiva para os investimentos que podem ser razoavelmente esperados. Leontief recentemente disse que o Brasil devia contentar-se com taxa anual de desenvolvimento moderada. Se a população continua a crescer de forma descontrolada, jamais se atingirá a necessária e desejada proporção entre investimento e população. Jamais se acabará com a pobreza absoluta no Brasil. O Governo precisa urgentemente iniciar também clara e decidida política de controle da natalidade, promovendo a paternidade responsável.
Aplaudo entusiasticamente o Sr. Ministro da Fazenda quando toma a decisão de restringir os gastos públicos excessivos. Essa medida é imperiosa. Ela já devia ter sido tomada há muito tempo. A política do dispêndio público e sobretudo do emprego público foi erroneamente usada no Brasil como remédio para erradicar a pobreza absoluta. Esta se cura com investimento. John Maynard Keynes receitou o déficit público para corrigir a pobreza relativa, a depressão ou superprodução.
São moléstias diferentes. Curam-se com remédios diferentes. Quando se trocam os remédios, a doença se agrava e o paciente morre. Agora, é o caso de desintoxicação medicamentosa. Trata-se de terapia necessária e dolorosa, mas auxiliar. A cura definitiva exige investimento, que passa indubitavelmente por política econômica criadora de permanente clima atrativo da poupança interna e externa. Investimento e produção só vingam em condições favoráveis e duráveis. Não nos esqueçamos do outro remédio: controle da natalidade.
(Publicado no ano de 1987)

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