quinta-feira, 16 de abril de 2009

93. A Liberdade


O indivíduo humano existe. É um animal. Conhece as coisas. Reflete, isto é, conhece-se, tem consciência, sabe o que é bom e ruim para si próprio. Quer, isto é, sabe e pode dirigir-se para o que é bom, e evitar o que é ruim. O indivíduo humano é senhor de si mesmo. É dono de seu destino. Quer ser feliz e nada tem o direito de impedi-lo.
Há muitos indivíduos humanos. Todos livres e senhores. Todos vivem juntos, porque na sociedade os indivíduos julgam ser mais felizes. Todos são politicamente iguais. A sociedade não é um ser especial. A sociedade, como entidade diversa dos indivíduos, inexiste. Ela é os indivíduos inter-relacionando-se.
A sociedade é um meio. Cada indivíduo é um fim. Cada indivíduo só é meio por livre e soberana vontade de cooperar, por acordo, por negociação, por consenso. A sociedade é um meio, porque é os indivíduos na sua atividade livre e soberana de cooperação mútua. Quando Kant afirmou que o homem não pode ser meio para outro homem, ele pensava na escravização do indivíduo por outro indivíduo. Qualquer dominação do indivíduo por outro, que dele obtenha a cooperação pela violência e pelo terror, é imoral. É degradação.
A sociedade surgiu como um organismo, em virtude das forças espontâneas da convergência de interesses individuais. Mas, as ações soberanas dos indivíduos nem sempre correm paralelas. Podem cruzar-se. Podem entrechocar-se. A violência pode ser preferida à negociação livre, ao consenso. A permanência da sociedade humana exige a criação de um entidade que preserve a paz e coíba a violência. Essa entidade é o Estado. A razão fundamental do Estado é combater a violência e fomentar a paz. A paz é o clima social dos homens livres, que se inter-relacionam pelo consenso, pela coincidência de interesses. Essa é a liberdade política.
Criado o Estado, o único depositário da força numa sociedade de indivíduos livres, ele sofre a tentação de transformar o organismo social numa vasta organização empresarial ou militar. O organismo social é resultado de infinitos pequeninos consensos individuais ou opções livres. É democrático e espontâneo. Ao Estado cumpre restringir-se a opor-se às forças que pretendem prejudicar o organismo social e criar condições para que atuem as forças vivas do organismo. Deve cooperar com as forças organizadoras intrínsecas ao organismo social. Sempre que a organização consciente pretende impor-se à sociedade, ela contraria as opções livres dos indivíduos que constituem as forças organizadoras do organismo social. Ela se torna, então, coatora, despótica e prejudicial. Os poucos indivíduos, que constituem o Estado, impõem a todos os indivíduos o próprio código de valores. Não foi para isso que a sociedade criou o Estado. Criou-o para garantir a cada indivíduo o direito de realizar o próprio código de valores.
A primeira vítima do Estado organizador é a liberdade econômica. A segunda é a liberdade política. Ele pensa que, contrariando os interesses individuais, alcança mais rapidamente o fastígio da riqueza nacional. Benito Mussolini reivindicou esse laurel: “Fomos os primeiros a afirmar que, quanto mais complexa se torna a civilização, mais se deve restringir a liberdade do indivíduo”. Era incapaz de compreender que a riqueza nacional se desenvolve mais eficientemente em clima de liberdade. A doutrina liberal defende a idéia básica de que a liberdade política conduz eficientemente à riqueza, através da liberdade econômica. Poucos são os mestres em economia capitalista que advogam a intervenção direta no mercado, atingindo o livre funcionamento do mecanismo de preços.
Sem liberdade econômica não há liberdade política.
(Artigo publicado no "Jornal da Manhã", Teresina-PI, em 10.02.87)

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