segunda-feira, 6 de abril de 2009

84. A Caça aos Bois


Em artigo anterior, mostramos que o Plano Cruzado se inspirou na doutrina macroeconômica de John Kenneth Galbraith. A contribuição original do autor consiste em afirmar que a espiral inflacionária só é detida pela adoção da economia de guerra em tempo de paz. Noutro artigo, explicamos que um dos pilares da economia de guerra é o congelamento dos preços. O congelamento dos preços significa que o poder coator do Estado impede que os preços atinjam o nível para onde os elevaria a lei da oferta e da procura. O Estado intervém no mercado fixando preços baixos para os produtos.
Preços arbitrariamente baixos sempre originam demanda excessiva e oferta insuficiente de mercadorias. O preço baixo expulsa do mercado o produtor de custos mais elevados ou que antevê preços mais elevados no horizonte do mercado. O congelamento dos preços cria a escassez e a perpetua, porque afugenta do mercado novos produtores.
O Governo enfrenta, então, o descontentamento de dois grupos sociais: o consumidor e o produtor. O produtor não oferece o produto no mercado ou porque o preço congelado não cobre seus custos ou porque aguarda melhores preços. Ou vende o produto a preço superior ao congelado, isto é, com ágio, no mercado negro. O consumidor se desespera na busca dos produtos que desaparecem do mercado, desperdiça tempo em filas ou paga ágio no mercado negro. O mercado livre aparece na forma de mercado negro, até na Rússia. O consumidor passa a olhar o produtor como especulador e explorador. O Governo considera suas medidas boicotadas pelos produtores, que não estariam dispostos a colaborar. Os consumidores se insurgem contra os produtores. O Governo se mobiliza contra os produtores.
Criam-se condições difíceis para a continuidade da ordem social. Certos setores da produção e do consumo são expostos à execração pública como traidores e sabotadores. O congelamento de preços reclama novas intervenções do Governo que tomam as formas de multas, fechamentos temporários ou definitivos de estabelecimentos, prisões, racionamento e desapropriação. Essas medidas são próprias de regimes fortes. Trata-se da economia de guerra, onde o Estado tem poder até sobre a vida dos indivíduos. Transforma-se em Estado policial, ampliando sua atividade repressora sobre toda a sociedade. Curiosamente Galbraith observa que, durante a Segunda Guerra Mundial nos Estados Unidos, o congelamento de preços se apresentou inviável nos ramos da carne e das confecções. A intervenção no mercado arrasta a novas intervenções. As intervenções desorganizam a produção. A longo prazo, as intervenções no mercado produzem pobreza.
O Estado que espiona, prende, desapropria e dispõe sobre a vida dos indivíduos é um Estado policial. O Estado policial não cria riqueza. Nem forma santos. Nem aperfeiçoa a convivência social.
A lei básica da sociedade é o egoísmo. E o egoísmo paradoxalmente conduz ao altruísmo. Eu, procurando o meu bem, e você, promovendo o seu bem, nos unimos numa sociedade onde ambos livremente, mediante o contrato ou negociação, promovemos uma vida melhor para ambos. Isso não significa que os bens sejam igualmente repartidos entre nós dois. Você pode ser muito mais produtivo que eu. E nesse caso igualitária repartição da produção comum seria injusta. Mas, o trabalho conjunto fará você viver melhor e a mim também.

(Publicado no jornal "A Libertação", de Parnaíba-PI, em 13.02.86)

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