quinta-feira, 2 de abril de 2009

80. Ética na Economia


Amigo, compartilho do pensamento que o insigne Leonardo Boff expressa nesse artigo que você me enviou.
De início, quero manifestar minha opinião de que o consagrado pensador brasileiro continua cristão, mas não é mais católico, apostólico e romano. A Igreja cristã de Roma dos tempos modernos decidiu que o Papa não erra. É inspirado pelo Espírito Santo. Quem se insurgir contra esse dogma não é cristão romano.
Além disso, ele parece guardar certo ressentimento do Cardeal Ratzinger, o atual papa Bento XVI. Aliás, na minha opinião, não havia como o papa João Paulo II não acolher o aconselhamento do Cardeal naquela oportunidade, já que a famosa Teologia da Libertação se inspirava mais nas novidades do socialismo marxista do que nos valores da leitura paulina do Novo Testamento. A Teologia da Libertação parece-me terrena, é da vida presente. O dogma cristão romano tradicional é monacal, é celeste, valoriza a vida após a morte.
Você bem sabe que não compartilho da idéia de que o Cristianismo é tradição religiosa retilínea. Se você vem acompanhando o que já escrevi neste blog, está certamente ciente de que para mim, ao longo da História, existiram diversos cristianismos: o da Igreja de Jerusalém, o de Paulo de Tarso, o da inspiração do Espírito Santo, o dos primeiros doutores da Igreja, o da tradição apostólica, o da Bíblia, o do Imperador Constantino, o de Santo Agostinho, o dos bispos de Roma, o de Gregório Magno, o dos Papas do início do segundo milênio da Era de Cristo, o de São Tomás de Aquino, o dos papas da Renascença, o dos líderes protestantes da Reforma, o dos jesuítas da Contra-Reforma e do Concílio de Latrão V, e o do famoso Concílio do Vaticano I.
Mas, numa coisa, e é o pensamento que inspirou Leonardo Boff nesse artigo, concordo com ele: precisamos instilar ética na Economia. Antes de Adam Smith a economia não era uma ciência. A atividade humana em busca da subsistência era objeto de estudo da Ética. O enriquecimento lícito era o resultado do trabalho da terra: o agrícola, o criatório, a mineração bem como os trabalhos do artesão que se relacionavam diretamente com essas atividades principais. O mercado surgiu na primeira metade do segundo milênio da Era de Cristo. E era mal visto, porque envolvia o enriquecimento do negociante mediante o lucro, bem como o do banqueiro mediante os juros.
Adam Smith, professor de Ética na Escócia, enfeitiçou-se pela forma como o mercado enriquecia o povo da Europa de seu tempo, sobretudo o povo da Inglaterra. E descobriu várias leis que regiam o mercado e tornavam o povo e as nações ricos. A principal lei: a liberdade individual. O indivíduo curioso, corajoso, ambicioso, criativo e livre tenta aproveitar as vantagens que encontra na vida. O importante é que ele seja livre, isto é, que não o impeçam de tentar, que o Estado não se intrometa no que ele tenta realizar. A segunda lei que ele descobriu foi a de que o indivíduo livre se dedica àquela atividade onde obtém mais benefícios, mais vantagens, isto é, os indivíduos se especializam. A terceira lei que ele descobriu: os especialistas trocam os seus produtos, formando assim o mercado. Assim, o interesse próprio conduzem o grupo humano a produzir e a consumir mais e melhor. O interesse próprio faz o indivíduo e a nação ricos.
Mas, o próprio Adam Smith alerta para a cobiça: ele afirma que os negociantes, quando se juntam, estão maquinando contra o mercado, contra o bem-comum. Acho que o egoísmo é bom, é motivador, mantém o interesse, o desejo, a criatividade e o progresso. Mas, a cobiça é deletéria. A cobiça queima a floresta amazônica. Movimenta as fábricas na China usando carvão. Planeja a utilização do petróleo do pré-sal no Brasil. Compra mais veículos movidos a gasolina, apesar do congestionamento do tráfico nas cidades e nas estradas. Não quer usar veículos pequenos nem os movidos a energia elétrica ou solar. Não quer usar o transporte coletivo. Eleva artificialmente o preço do petróleo e reduz a quantidade ofertada. Remunera fabulosamente os administradores de empresas e indignamente o trabalhador comum. Constrói os palácios de Dubai e paga salários indignos aos trabalhadores comuns das obras. Dá renda milionária para desportistas e explora o torcedor com preços escorchantes de ingressos. Não aceita o controle da natalidade. Condena a eutanásia. Não admite nenhum tipo de eugenia. Não valoriza a qualidade de vida. Não admite a pesquisa genética. Explora a pirataria de invenções de custo de pesquisa gigantesco. Esconde recursos em paraísos fiscais. Engendra negócios financeiros de alto risco e ludibria os investidores. Estabelece o domínio do mais forte. Promove o furto e o homicídio. Arma o indivíduo e as nações.
Acredito que normas do Direito Positivo consigam algum sucesso. Mas, na minha opinião, muito escasso. Não são os políticos do estofo atual, como existem no Brasil e no Mundo, que têm moral para estabelecer regime de transparência, confiança e respeitabilidade para os negócios do mundo. Nem mesmo a repressão legal seria remédio para tal situação.
Estou com Jesus Cristo, Buda, Paulo de Tarso, Gandhi e Leonardo Boff: é o Homem que deve mudar. Creio em uma Economia completamente diferente, se o indivíduo humano fosse, de fato, educado para a convivência. Se ele entendesse que a Terra é a sua morada, e que ela seria um Éden desde que os homens tudo resolvessem no espírito de compartilhamento igualitário. Só acredito em sociedade, cuja base de coesão seja a igualdade. A sociedade que está aí, na qual estou sendo obrigado a viver, para mim é uma farsa. Farsa de igualdade. Farsa de democracia. Farsa de representação.
Acredito que a Economia, propulsionada pelo egoísmo consciente do Homem Novo, o Homem Animal Social e Urbano, o Homem Animal Cidadão e Civilizado, além de riqueza, proporcionaria bem-estar e felicidade. Creio que, então, a paisagem da Terra e a vida humana seriam completamente diferentes. O indivíduo humano apreciaria, de fato, viver. Seria a Civilização do Conhecimento. Utopia hoje. Realidade no futuro, se os loucos, que habitam hoje a Terra, resolverem conceder oportunidade à Vida. Leonardo Boff citou um exemplo japonês. Nos meus tempos de adolescente no seminário, professores jesuítas citavam o exemplo de um empresário da cidade de São Paulo. Também no mundo perverso dos negócios de hoje essa firma, então famosa, não durou muito tempo. Insisto, porém: nós vivemos hoje as utopias dos tempos passados. É por isso, que eu, velho octogenário, ainda acredito e espero.

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