sexta-feira, 17 de abril de 2009

94. Pressuposto Ético


Venho publicando neste blog trabalhos antigos, que compus vinte anos atrás, a pretexto de medidas tomadas pelo Governo sob a ótica do plano Cruzado, sobre a economia de mercado, que a grande maioria de economistas afirmam constituir a forma mais misteriosa e mais perfeita de se organizar a economia.
Eles afirmam que o mercado marcha sempre para o equilíbrio e que, num mercado de consumidores e produtores sem influência preponderante, o equilíbrio se dá naquela situação em que se obtém a maior eficiência de produção e de consumo. E em que consiste essa situação de maior eficiência de produção e de consumo? É aquela situação em que são satisfeitos os consumidores que maior valor dão ao bem e os produtores que menor valor atribuem ao bem.
E afirmam uma coisa interessante: dessa situação de equilíbrio e de eficiência máxima, só se sai prejudicando o interesse de outros. Sempre que alguém contribui para que a economia marche em direção do equilíbrio, esse agente, consumidor ou produtor, melhora de situação juntamente com os demais atores do mercado. Mas, na situação de equilíbrio do mercado, na situação de eficiência máxima da economia, qualquer mudança para melhoria de alguém só se dá piorando a situação de outros. A direção para o equilíbrio é social. A direção contrária ao equilíbrio é egoísta e anti-social.
E o leitor então me faz a pergunta óbvia: como então existem tantos pobres? Não deveriam existir pobres, na situação de equilíbrio de mercado. E a resposta também é óbvia. O mercado sempre privilegiará alguns mais do que outros, ou até alguns mais do que outros. Na economia de mercado só é consumidor quem tem renda. E será mais consumidor quem tiver mais renda. Quem não tem renda, nada consome. É pobre. Vive na miséria.
Aí, então, se enxerta a minha afirmação de que o mundo precisa mudar e que ele só mudará através da Educação, Educação no sentido socrático, Conhecimento e Sabedoria, Competência (habilidade técnica) e Esclarecimento Ético (ciência da boa conduta, da convivência humana, urbanidade, cidadania, sociabilidade). A nova Ciência Econômica, a Nova Economia, a Nova Ordem Econômica, que tanto se alardeia deve surgir da atual crise financeira e econômica mundial, não será outra forma de organizar a economia, como pensam alguns, diferente da economia de mercado.
Não. O que pretendem afirmar os mais lúcidos mestres da Economia é que essa Nova Ordem Econômica deve continuar organizada pelo mercado. Mas, essa ciência possui um pressuposto fundamental: ela é um conhecimento do Homem. Ela deve, portanto, e mais que qualquer outra ciência, tanto quanto a Medicina, subordinar-se ao interesse fundamental do indivíduo humano e da espécie humana: a sobrevivência.
E este é o princípio fundamental da existência do indivíduo humano e da espécie humana: todos, mas todos os indivíduos humanos, temos o direito a uma vida de qualidade. E insisto: a uma vida de qualidade. É este, e não deixo por menos, o direito e o preceito básico de toda vida humana e da sociedade humana. E essa igualdade não pode ser mero princípio teórico. Ela é princípio prático de existência dos indivíduos humanos e de qualquer associação que eles formem, principalmente a sociedade civil.
Ninguém tem o direito de colocar no mundo outro indivíduo humano que não tenha condições de conquistar uma existência de qualidade. Ninguém tem o direito de colocar no mundo um indivíduo sem que tenha condições de lhe dar educação para que seja capaz de produzir de forma a ter condições de consumir em nível tal que tenha uma existência de qualidade.
E vou começar por mim. Eu não deveria ter nascido. Fui o décimo primeiro filho de uma mulher maravilhosa. Ninguém teve um colo mais carinhoso do que tive. Ninguém bebeu no leite materno princípios mais puros de conduta do que eu. Mas, eu não devia ter nascido. Nenhuma mulher tem o direito de ter doze crias. É a superpopulação do globo terrestre, podem julgar estultice, um dos fatores da degradação humana e da destruição do planeta. A crise econômica atual também tem a ver com a superpolução do planeta. E tem muito a ver com a destruição das matas. E tem muito a ver com o problema da convivência de índios e não índios. E todos esses assuntos são éticos e econômicos também.
Ninguém tem o direito de procriar e, por isso, queimar um palmo a mais de mata no planeta Terra. Todas as crianças, todos os adolescentes e todos os jovens têm o direito de passar o dia na Escola, o dia inteiro, sob os cuidados de professor tutor, que acompanhe individualmente a formação científica, tecnológica e ética. Todos os professores têm o direito de receberem as melhores remunerações da sociedade e a obrigação de prestar desvelada e abnegada dedicação à formação das crianças, jovens e adolescentes. Ninguém tem o direito de procriar crianças esquálidas e ignorantes como se vêem nos noticiários da África. Ninguém tem o direito de procriar jovens e pessoas, que vivem amontoadas em barcaças errantes pelos mares da morte. Ninguém tem o direito de procriar piratas, que sobrevivem em países sem Direito, sem Ética, sem Civilização, atacando a sociedade humana. Ninguém tem o direito de procriar indivíduos humanos para vagarem pela existência como ratos falantes e morrerem amontoados em hospitais infectos. Ninguém.
E se, contra a vontade dos pais, nascerem indivíduos incapacitados para conquistar a sobrevivência com qualidade, ou, por acidentes da vida, alguém se torne incapacitado? Nesses casos fortuitos e imprevistos, a sociedade tem obrigação, é claro, na falta de condições familiares, de prover que tais indivíduos sobrevivam com qualidade de vida.
Mas, por isso mesmo, para que uma excessiva multidão de pessoas não se torne ônus insuportável à sociedade, é importante que a sociedade imponha limites à procriação. Não estou falando de coisas inexistentes no dia de hoje. Todos sabemos que na China há limite de nascimento por paternidade e maternidade. Há anos, um colega de profissão que morou em Cingapura me disse que lá o Estado garante a gratuidade da educação e da assistência médica e hospitalar a todo primogênito. Para o segundo filho, o Estado não tem obrigação de criar vagas nas escolas nem dar assistência médica e hospitalar. Todavia, em havendo vagas nas escolas, nos hospitais e nos consultórios médicos, o segundo filho será atendido pelo Estado. O Estado, todavia, não tem nenhuma obrigação de assistência a partir do terceiro filho.
Já no que respeita aos idosos, entendo que o período de vida ativa deveria ser mais extenso. Penso que a Educação deveria ser de tal forma excelente que tornasse a atividade profissional, fosse ela qual fosse, o principal divertimento de uma pessoa. Todos deveríamos ser workholic. E a sociedade, quando os idosos já não mais tivessem condições para a prática satisfatória de sua profissão, assumiria a obrigação de proporcionar-lhes a qualidade de vida, enquanto ela fosse exeqüível. Isso já é assim em alguns poucos países.
Direito Positivo e Ética são convenções. São convenções criadas pela Cultura para manter uma sociedade civilizada, isto é, urbana, de excelente convivência, gerada por uma Educação de excelência. Por isso, devem ser convenções justas. Eles são inspirados pelo espírito da época. O importante é que contribuam para a qualidade da existência do indivíduo e da sociedade humana. Liberdade, Igualdade, Direito e Responsabilidade.

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