segunda-feira, 23 de março de 2009

70. Â Âncora da Fé e a Educação


Curioso esse deus da segunda versão da origem do Universo. Ele tem muita preocupação com a conduta do Homem. Ele exige que o Homem reconheça sua dependência dele. Ele exige a submissão do Homem a sua vontade divina. Ele exige que o Homem reconheça o seu poder de comandar.
Os escritores da segunda versão revelam que a sociedade em que viviam já estava preocupada com a organização da sociedade. Aquela sociedade já havia forjado a ideia de organizar-se em torno de um poder político. E a âncora dessa organização e desse poder político era a crença, a crença em Deus, a crença na Lei divina, a lei instituída por Deus, o artífice do Universo.
A Lei divina era valor tão sublime na mente daqueles escritores que a desobediência à Lei divina dava origem a todas as desgraças próprias da vida humana, como castigo infligido pelo legislador divino: o sofrimento, a dor, as intempéries, as catástrofes meteorológicas, a escassez de alimentos, a fadiga do trabalho, a doença e a própria morte. A ilegalidade, o crime, é a origem do mal, do infortúnio humano, da infelicidade. Esse pensamento vai ser o vínculo de coesão que Moisés, o fundador da nação israelita, segundo a Bíblia, vai conseguir instilar nas mentes dos liderados. Essa ideia acompanha as diversas religiões na caminhada histórica da Humanidade.
A Lei divina significava que o poder político fora empolgado pela classe sacerdotal. Os sacerdotes detinham o poder de conduzir o aglomerado humano a seu bel prazer, segundo os seus interesses.
E, assim, me explico outra passagem intrigante da narrativa dessa versão do mito: a preocupação do Deus com a ameaçadora competição humana: "Eis que o homem se tornou como um de nós, capaz de conhecer o bem e o mal. Não vá agora estender a mão também à árvore da vida para comer dela e viver para sempre." (Gen. 3, 22). Incrível! O Homem pode tornar-se Deus! O Homem já é também Deus!...
À classe sacerdotal não interessava que a população progredisse em conhecimento, pois percebia que se esta fosse capaz de discernir autonomamente o que lhe interessava, o bem, e o que não lhe interessava, o mal, ela, a classe sacerdotal, perderia a sua razão de ser e os seus privilégios. Por isso, a proibição divina se concentrou na interdição ao uso do fruto da árvore do conhecimento.
Acho essa lição extraordinariamente moderna. É a educação, é o conhecimento que faz o indivíduo humano livre. Quanto mais esclarecido o indivíduo humano, mais social, mais civilizado, mais urbano, mais sabe entender as diferenças, mais sabe conviver, menos guerra, menos desentendimentos, menos animosidade, de menos lei precisa. A necessidade de comando, de poder político se atenua consequentemente.

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