sexta-feira, 27 de março de 2009

74. Preconceitos


A sociedade é uma instituição natural, isto é, a espécie humana precisa viver em sociedade. Um indivíduo humano adulto totalmente isolado sobreviveria, é claro, por algum tempo, mas a espécie humana não sobreviveria. A vida do indivíduo humano em sociedade pode ter melhor ou pior qualidade do que a do indivíduo humano isolado. Depende do tipo de sociedade e da posição que o indivíduo ocupa em determinadas sociedades. Isso nos ensina a Filosofia, a História, a Psicologia, a Economia e a Sociologia.
Mas, viver em sociedade é uma convenção, até viver em família é convenção a partir da idade adulta. O indivíduo humano só permanece na família dos pais, porque quer. O indivíduo humano só constitui família, porque quer. Também é convenção o tipo de sociedade que um grupo de pessoas decide formar.
Já se disse que a família é a célula do organismo social. É claro, todavia, que a História e o espírito da época atual nos esclarecem que, por convenção, se podem formar muitos tipos de convivência procriativa e de relacionamento sexual. Também sabemos que, por convenção, se podem formar vários tipos de sociedade civil.
Penso que a igualdade, os cientistas sociais preferem a equidade, é a condição básica para que se forme uma sociedade civil. A igualdade é a condição básica e o bem comum, o bem-estar de todos os indivíduos, constitui o objetivo da sociedade civil. Todos os sócios têm os mesmos direitos, porque têm também os mesmos deveres.
Diferença de raça, portanto, não pode ser levada em consideração na sociedade civil. Todas as crianças, todas, devem ser preparadas para desempenharem o papel que escolherem na sociedade. Todas as crianças, portanto, têm o direito de ter uma educação de excelência. A sociedade tem o dever de dar a todas, sem exceção, brancas ou negras, organicamente normais ou excepcionais, educação de excelência.
Recordo-me de minha experiência londrina em 1971. Cheguei a Londres numa sexta-feira, à noite, para um estágio de seis meses num banco inglês. Na segunda-feira, de manhã cedo, fui ao colégio público do bairro para matricular meus dois filhos. Não houve dificuldade alguma. E ouvi do diretor da escola algumas instruções: as crianças passam o dia na escola, entram às nove horas e saem às quatro e meia (dia solar no inverno inglês), têm que aprender tudo na escola, não há dever para ser feito em casa, e na escola elas almoçam.
Na sociedade democrática, todos são iguais. Portanto, não deveria existir diferença tão grande de renda entre as pessoas. Não estou defendendo nenhuma tese comunista. Estou afirmando o que diz o mais respeitado mestre da economia de mercado dos dias de hoje, Paul Krugman: não se pode permitir que alguém abocanhe parte desmedida da renda nacional. Paul Krugman tem olhos azuis.
Assim, se os que auferem maior renda podem proporcionar aos filhos educação de excelência, o Estado deveria também manter escolas que ministrassem educação de igual qualidade, educação de excelência, às camadas da população de menor renda, preta ou branca, indistintamente. Sei que será empreendimento hercúleo. Mas, é isso que tem que ser feito. A concessão de vagas por critério racial parece-me discriminatório, injusto, preconceituoso, antidemocrático e anti-social. Não gosto dessa ideia de reparação dos males perpetrados no passado. O passado governava-se pelo espírito da época. Isso era a Humanidade naquela época. O que os brancos fizeram com os negros no passado, os árabes fizeram com os brancos na Europa ibérica e no Leste europeu. E só não existe hoje uma civilização árabe na Europa, porque a casa franca derrotou os invasores árabes no coração da Europa e os príncipes germânicos impediram, no Leste, que os árabes atravessassem o Danúbio.
Ainda hoje no continente africano etnias negras se digladiam impiedosamente, como no passado negros cooperavam com os brancos no tráfico de escravos.
O mercado financeiro, como o mercado de bens e serviço, precisa ser livre para ser eficiente. Mas, como toda a conduta humana, o banqueiro e o negociante devem agir como ser humano social, isto é, ele deve agir guiado pelo interesse próprio e os objetivos da sociedade. Isso quem o diz é o mais prestigiado economista dos dias de hoje, Paul Krugman. Quem diz isso tem olhos azuis como milhares dos mais brilhantes professores de Economia. Por isso, devem-se estabelecer limites para os negócios e, em especial, para os negócios financeiros. Já que a Ética não consegue conduzir os negociantes e banqueiros, que se use a muleta do Direito. Isso todos os homens doutos de olhos azuis afirmam. E essas normas devem, sobretudo, conferir muita transparência, para que o povo, esse o grande interessado, possa fiscalizar os negociantes, os banqueiros e os políticos.
Aliás, não foi por falta de admoestações que a crise aconteceu. Todos os estudiosos de Economia sabiam que o dia da recessão havia de chegar. E muitos, já desde 1996, e até antes, já sabiam que poderia acontecer essa catástrofe e alertaram. Não interessava aos banqueiros, não interessava aos negociantes, não interessava aos políticos dos países desenvolvidos, dos países em desenvolvimento, dos países subdesenvolvidos que se reduzisse cirurgicamente a bolha de expansão econômica. Agora, todos querem achar o culpado... assim caminha a Humanidade!
Lembrete: nenhum economista (inclusive os de olhos azuis) afirma que, estabelecidas normas de atuação dos agentes financeiros, a Humanidade nunca mais entrará em recessão! Característica do comportamento da Economia Mundial até hoje tem sido a flutuação do nível de negócios, sucessão de expansão e contração! E, ensina David Hume, a mente humana funciona esperando que aconteça no futuro o que percebe que aconteceu habitualmente no passado!... É assim que age o homem prudente, o homem inteligente. É isso que diz o melhor tipo de conhecimento que a Humanidade possui, o conhecimento científico.

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