terça-feira, 31 de março de 2009

78. Taíte


Recentemente, na televisão, renomado comentarista esportivo falou do Taíte, famoso clube infantil boliviano de futebol, que vence todas as competições nacionais, regionais e internacionais de que participa. Nem por isso, continuava ele, a Bolívia consegue sucesso nas participações em competições de futebol adulto, regionais e internacionais. Concluindo, disse ele que em futebol inexiste a preparação de equipes infantis campeãs para se tornarem equipes adultas campeãs. A equipe campeã adulta se arregimenta entre adultos aqui e agora, que se tornam campeões.
Isso lembrou-me extenso artigo em jornal diário do Rio, onde o autor enumerava as alegações feitas pelos chamados pais do Cruzado para justificar o fracasso do plano em razão de interferências indevidas de outras pessoas e grupos.
A meu ver, o insucesso do método é-lhe intrínseco. Democracia liberal alguma tem condições de aplicar em tempo de paz a economia do tempo de guerra. A economia de guerra de Galbraith, que recentemente foi batizada com o nome de choque heterodoxo, tem origens socialistas e teve sua época de sucesso com o nacional-socialismo alemão, como relata Hayek em seu livro “O Caminho para a Servidão”.
A Europa do início do século XIX foi dominada por Napoleão Bonaparte, o general francês proveniente da Revolução Francesa. A Alemanha do final do século XIX foi realização do espírito militarista alemão encarnado em Bismarck. A organização militar empolgou a mente dos pensadores socialistas alemães do início do século XX.
Esses autores preconizavam organizar a sociedade à maneira de um exército. Justificavam esse plano baseando-se na concepção de que o Estado é um ser autônomo e superior aos indivíduos. O Estado não existe para fazer o bem dos indivíduos. Os indivíduos subordinam-se aos interesses do Estado.
Johann Plenge, durante a Primeira Guerra Mundial, escreveu um livro onde encarava aquele conflito como a luta entre a Alemanha e a Inglaterra, entre os ideais socialistas e os ideais da Revolução Francesa, entre as idéias da sociedade militar e as idéias da sociedade comercial, entre a organização e o livre mercado.
Entre 1920 e 1940, o pensamento da organização da economia na forma militar, isto é, a necessidade de que se adote em tempo de paz a economia de tempo de guerra, tomou vulto e pareceu tornar-se vitorioso. Quando o povo na Rússia saiu às ruas gritando “Abaixo Lenin! Abaixo a fome! Queremos o czar e o leitão!”, Lenin tentou explicar que a escassez decorria do comunismo de guerra.
Duas consecutivas vitórias militares das nações aliadas fizeram o pensamento da economia planificada perder algo do vigor antigo. Mas, ele ficou, sobretudo entre nações do Terceiro Mundo. Vamos também encontrar-lhe resquícios nas idéias de Galbraith, como já tivemos oportunidades de expor.
Essas são as raízes ideológicas do Plano Cruzado. Mas, em economia como na produção de futebolistas, a organização consciente não é o melhor método. O livre mercado é mais eficiente. Sociedade militar e sociedade civil são realidades diferentes. A sociedade militar é um acidente. A sociedade civil é essencial. A sociedade militar se forma na desigualdade e na opção consciente. A sociedade civil se forma na igualdade e na tendência espontânea do indivíduo. A sociedade militar é ordem imposta por organização externa ao indivíduo. A sociedade civil é ordem decorrente do organismo que se forma por tendência intrínseca ao indivíduo.
O mercado livre e a economia de guerra radicam-se em ideologias conflitantes. Sociedade civil não é exército nem convento.
Gombrich no seu livro “História da Arte” diz que o século VI a. C. foi o mais assombroso período da história humana. Então, o homem passou a contestar a tradição e a pensar por si próprio. O cidadão ateniense tornou-se livre!

(Escrito e publicado em 1986)

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