quarta-feira, 1 de abril de 2009

79. Organismo e Organização


O homem se caracteriza pela Ratio, a faculdade da ordem. A Ratio percebe a ordem onde ela existe, e tende a pôr ordem em sua volta. O homem é um ser organizador. A organização é um produto consciente do homem.
Os cientistas naturais e os técnicos levam a utilização da Ratio a sua máxima sofisticação. Investigam a ordem da natureza e se esforçam por orientar as forças da natureza para benefício da humanidade, segundo o moderno conceito da ciência formulado por Francis Bacon.
Mas, o homem não é só consciência e Ratio, como demonstrou Freud. Há nele forças poderosas subconscientes e inconscientes. O artista sente, cria e se expressa sem subordinação à Ratio. Milton Friedman observa que coisas importantíssimas, como o idioma, a ciência, a cultura e a civilização, o homem as produz, sem a elaboração prévia e consciente de um plano central de desenvolvimento. Muitos instrumentos que o homem inventa têm como objetivo produzir automaticamente o que ele de forma consciente é incapaz de realizar, por exemplo, o computador.
A Ratio é muito importante, mas não é tudo. Ela é suplantada pela realidade que é mais rica que os esquemas organizacionais concebidos pela Ratio. Mas, mesmo assim, o homem, e sobretudo o cientista natural e o técnico, é propenso a pensar que a ordem é sempre um produto consciente, que cabe ao homem implantar no meio onde vive para obter benefícios e segurança.
O homem implanta a organização na sociedade em que vive. Leva-a até à atividade econômica e ousa interferir no mercado segundo seus planos científicos, alterando o mecanismo dos preços e o funcionamento da lei da oferta e da procura.
O que são mercado, mecanismo de preços e lei da oferta e da procura? Não são apenas realidades físicas quaisquer. Hayek e Ludwig von Mises explicam que são todos os indivíduos de uma comunidade humana na sua mais integral riqueza pessoal, inter-relacionando-se para satisfação de todas as suas necessidades materiais, segundo o código de valores próprio de cada um onde se acham classificados hierarquicamente. Cada consumidor tem o seu valor para cada produto disponível, segundo os próprios planos de vida. A resultante faz aparecer maior quantidade do produto no mercado, porque lá está presente no mercado o produtor que dessa forma realiza os seus projetos pessoais de vida. Baixa valorização resultante faz reduzir a quantidade do produto no mercado.
Esse ajustamento é automático, espontâneo, livre e abrange todos os produtos presentes no mercado, proporcionando a satisfação das necessidades dos consumidores segundo a resultante hierarquia dos valores atribuídos pelos consumidores aos diversos produtos. Nada há de mais pessoal, vital, próprio e complexo.
O mercado é sobretudo maravilhoso instrumento de organização espontânea e inconsciente. A organização espontânea é o organismo. Ela é tão perfeita, ou mais, que a organização imposta pela Ratio. A organização da Ratio vem de fora. É coercitiva. O organismo é a ordem que brota espontaneamente fabricada pela vida. Ninguém poderá negar a ordem existente nos organismos. Assim é a perfeição da ordem econômica gerada pelo mercado. Cada consumidor expressando efetiva e conscientemente a sua vontade contribui inconscientemente para construir a ordem econômica. O mercado é o mais adequado instrumento da ordem econômica. É a famosa mão invisível de Adam Smith.
O planejamento estatal para substituir o mercado ou para inibi-lo, além de ser um substituto inadequado e, portanto, de qualidade inferior, é atitude arbitrária e antidemocrática. É que o Estado impõe pela força um código obviamente falho, porque parcial, sem possibilidade de total abrangência, a todos os consumidores, que são compelidos a abdicar dos seus planos mais pessoais, vitais e próprios. O homem se despoja da sua opinião, da sua valorização, da sua vontade, da sua personalidade, da sua individualidade, da sua liberdade e da sua dignidade. Nesta área, é impossível o consenso nem é âmbito de atuação do Estado democrático. A organização estatal não possui a flexibilidade sutil e instantânea que a economia exige.
A destruição do mecanismo de preços, da lei da oferta e da procura, do mercado, é um ato de violência. O papel do governo democrático na economia é proteger e aperfeiçoar o mercado.
(Escrito e publicado em 1986)

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