sábado, 31 de janeiro de 2009

20. A Igreja Católica


E logo depois Constantino se tornou Imperador do Império Romano. Usou a religião cristã como instrumento de coesão da população do Império. Constantino tornou-se a pessoa muito importante para a definição da ortodoxia cristã. Grande parte dos bispos era agora oriunda da classe rica e já se acusava o clero de viver no fausto. O monasticismo surgiu como protesto contra esse acordo entre o espírito e a matéria.
Constantino manipulava a Igreja para servir aos seus objetivos políticos. Fez dos bispos juízes em suas dioceses. Construiu igrejas e concedeu recursos às associações cristãs. Constantino reuniu um concílio de bispos em Arles, ao qual compareceram os bispos britânicos de York, Londres e Lincoln. Sua mãe, Helena, tornou-se fervorosa cristã. Viajou a Jerusalém. Teria encontrado a cruz de Cristo e erigiu igrejas em Jerusalém e Roma.
Naquela época, em razão da difícil situação política e econômica do Império Romano, considerável parte da população romana transferiu-se para as regiões dos povos bárbaros. Os povos germânicos introduziam-se no Império, pacificamente ou até mesmo a convite do Imperador. Havia estreito relacionamento entre romanos e bárbaros. O Cristianismo já se achava difundido pela Espanha, Ilhas Britânicas e pela Gália: o bispo de Tours discordava da pena de morte de hereges; Prisciliano, o bispo de Ávila, na Espanha, foi julgado em Bordéus e depois submetido ao tribunal imperial de Trier; alguns bispos britânicos compareceram ao concílio de Rimini. No Concílio de Nicéia (uns 300 participantes, dentre uns 1.500 bispos então existentes), 325 EC, convocado por Constantino que não admitia divergência na crença, o Ocidente tinha cinco representantes, entre eles o bispo de Córdoba (presidente do concílio), o bispo de Dijon e um bispo da província do Danúbio.
Nele, a divindade de Cristo, defendida por Atanásio, patriarca de Alexandria, contra a doutrina de Ario, foi proclamada dogma de fé. Por certo tempo, Constâncio, filho e sucessor de Constantino, obrigou os patriarcas (os principais líderes da cristandade, bispos das mais prestigiosas e tradicionais igrejas) a professarem a doutrina ariana. Naquela época, até o papa Libério era ariano. Poucos anos depois, Teodósio convocou o Concílio de Constantinopla em 381 EC, que reafirmou a divindade de Jesus, e, acrescendo a divindade do Espírito Santo, formulou o dogma da Trindade. O dogma da Trindade conferia enorme prestígio intelectual e místico ao Cristianismo. Era politicamente emblemático.
Nesse mesmo século, um godo letrado, de nome Wulfila, freqüentou cidades do Império Romano, tornou-se cristão ariano (o arianismo - Cristo é apenas homem - era o cristianismo mais difundido na época) e bispo. Voltou para a sua terra (noroeste da Bulgária, de hoje), traduziu a Bíblia para o idioma gótico. Ele e seus discípulos evangelizaram os povos germânicos. O cristianismo ariano difundiu-se pelos povos germânicos: os invasores germânicos do Império Romano no século V e VI EC eram cristãos arianos, com poucas exceções como os hunos (que não eram germânicos). Os povos bretões já eram, então, cristãos arianos. No século V EC até as Ilhas Britânicas já tinham o seu herege, Pelágio, cuja doutrina foi combatida por Santo Agostinho.
Ambrósio, homem culto e enérgico, bispo de Milão, tornou-se o principal líder cristão no Ocidente, e o Imperador Teodósio proclamou o Cristianismo a religião oficial do Império Romano. Teodósio respeitava Ambrósio e a ele se submeteu como penitente, quando entraram em confronto. Ambrósio foi decisivo na elaboração da doutrina cristã: "Talvez homem algum tenha desempenhado papel maior, em termos concretos, na construção do aparato de crença prática que circundou o europeu durante o milênio em que o cristianismo foi o ambiente da sociedade."
Ambrósio foi também o primeiro bispo a tratar extensamente da questão do sexo. Sua idéia sobre o sexo: "O casamento é honorável, mas o celibato é mais. O que é bom não precisa ser evitado, mas o que é melhor deveria ser escolhido." Seu contemporâneo Jerônimo já tinha opinião mais negativa sobre o mesmo assunto: "o casamento é apenas um grau menos pecaminoso que a fornicação."
Os sermões de Ambrósio converteram ao Cristianismo um jovem africano, natural de Tagaste, que professava a filosofia de Mani de Ctesifonte, profeta da Mesopotâmia, que vivera no século III EC. Segundo essa doutrina, o mundo tem origem em dois princípios: o Bem (Ormuz, deus, a Luz, é a origem de todo bem) e o Mal (Arimã, o demônio, as Trevas, é a origem de todo mal). O espírito procede de Ormuz e a matéria procede de Arimã. O Bem e o Mal estão em contínua luta. Essa luta entre deus e o demônio se dá por todas as regiões do Universo, inclusive no interior do homem, entre a alma e o corpo. O espírito é cativo do corpo, da matéria. É preciso, portanto, libertar o espírito mediante a prática do ascetismo. O espírito se reencarna seguidamente, até que essa luz, que é o espírito, consiga libertar-se da matéria. Para o maniqueísmo, tudo o que é matéria, corpo, vida terrena, sexo é mau e produzido pelo demônio. A mulher é a obra-prima do demônio, se bem que possua alguns poucos raios da luz do Bem.
Agostinho, o mais importante dos Padres da Igreja, imbuído dos ensinamentos de Paulo de Tarso, foi com ele o responsável pela doutrina cristã que predominou durante toda a Idade Média, até Tomás de Aquino, no século XIII EC. Agostinho, o que não é de estranhar-se em virtude de seu maniqueísmo anterior, também comungava das idéias negativas de Ambrósio a respeito do sexo. A idéia do pecado original e da necessidade do batismo ao nascer para purificar a pessoa humana firmou-se nas suas condenações ao Pelagianismo, a doutrina de Pelágio, bispo bretão, que não aceitava a herança do pecado de Adão: "Na infinita sabedoria de Deus, os genitais foram, apropriadamente, feitos instrumentos para a transmissão do pecado original: ecce unde! É esse o lugar! É esse o lugar por onde o pecado primordial é transmitido!"
O historiador Paul Johnson explana: "Adão desafiara Deus - e, para cada homem que nascesse, a vergonha pela incontrolável agitação dos genitais era um lembrete do crime original de desobediência - e uma punição adequada para tal. Todo homem, indagou ele à sua aduladora congregação, não sentia vergonha ao ter uma poluição noturna? Claro que sim.' Juliano, um opositor pelagiano de Agostinho, discordava dele nestes termos: "e, o que é repugnante tanto quanto blasfemo, esse ponto de vista agarra-se, como sua prova mais conclusiva, à decência comum com que cobrimos nossos genitais."
Agostinho, convertido ao Cristianismo, voltou para Tagaste, e ali viveu uma vida monacal de cenobita até ser feito bispo de Hipona. Ele redigiu regras de vida cenobítica que governam ainda hoje a vida dos monges Agostinianos. São Jerônimo, contemporâneo de Santo Agostinho e autor da Vulgata (tradução latina da Bíblia), edificou em Belém (Palestina) um mosteiro para homens e dois para mulheres. Outro contemporâneo de Agostinho, São Paulino de Nola, gaulês de Bordéus, fundou um mosteiro em Nola, sul da Itália, onde vivia com sua mulher e outros companheiros vida monacal.
Os godos, vândalos, borgúndios e lombardos, que se trasladaram nos séculos V e VI EC para o Império Romano, eram cristãos arianos, evangelizados por Wulfila e seus discípulos.
Em toda a extensão do Império Romano, proprietários de terra, pessoas da nobreza e da administração das cidades, se tornavam bispos, isto é, chefes da igreja local. O Cristianismo se difundia sob o influxo político do Imperador e como religião do Império, e apoiado nos recursos em propriedades agrárias das classes abastadas e na herança das viúvas ricas. A riqueza dos bispados e dos mosteiros embasava o trabalho evangelizador de personalidades cultas ou politicamente influentes, e também de incontáveis anônimos pregadores. A atividade agrícola era a única atividade econômica considerada honesta pelo cristianismo àquela época.
Contemporâneo de Agostinho, São Martinho de Tours, nascido na Hungria, conhecido como o apóstolo da Gália, discípulo de Santo Hilário de Poitiers, voltou à sua pátria para evangelizar os compatriotas arianos, que o repeliram. Retornou a Poitiers, onde fundou o mosteiro de Ligugé (considerado o primeiro mosteiro do Ocidente). Feito bispo de Tours, aí instalou o mosteiro de Marmoutier. Algumas décadas depois de São Martinho, São João Cassiano ergueu em Marselha dois mosteiros, um masculino e feminino o outro, para converter e educar.
O monasticismo ocidental logo assumiu aspecto diferente do oriental: o monasticismo ocidental integrou-se à sociedade e até exerceu o papel de promotor do progresso. Essa importância espelha-se no fato de que várias cidades francesas herdaram de São Martinho de Tours o próprio o nome.

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